terça-feira, 11 de novembro de 2008


Jaime Cimenti

A crítica da crítica de arte

O enigma vazio - impasses da arte e da crítica, de Affonso Romano de Sant´Anna, mostra, inicialmente, que refletir sobre a arte, em especial sobre a contemporânea dos séculos XX e XXI, pode se tornar um exercício tão complexo quanto os próprios objetos da análise, no caso, os artistas e suas obras.

Affonso, experiente poeta, professor, jornalista e administrador cultural, já tinha publicado anteriormente Desconstruir Duchamp e A cegueira e saber e agora, com a publicação de novos ensaios,

aprofunda as questões que já examinou, aproveitando a oportunidade para passar um pente-fino nas análises de quadros feitas por Octavio Paz, Jacques Derrida, Michel Foucault, Roland Barthes, Jean Clair, Heidegger, Mayer Saphiro e Frederic Jameson.

Através da lingüística e da teoria do discurso, Romano de Sant´Anna analisa os principais sofismas em que se baseia a arte conceitual e propõe uma nova episteme para a reavaliação da arte do século XX.

O autor questiona os limites da arte contemporânea, uma arte conceitual, que, dando primazia ao pensamento, à idéia e à linguagem, deslocou o enfoque da obra para a proposta. Daí a importância do trabalho de Affonso, que acaba por fazer uma inteligente e instigante crítica da crítica.

O autor destaca que, se na arte conceitual o discurso e a palavra tomaram na tela o lugar da tinta, a crítica de arte fez algo semelhante e inverso: transformou seu texto em um quase-gênero artístico, numa espécie de reflexo distorcido da obra analisada, no que foi batizado de action writing, uma forma de pintar com palavras seus devaneios conceituais.

Em tal tipo de crítica, a obra de arte que iniciou a escrita é logo abandonada, num olhar narcisista e deslumbrado com as próprias idéias e construções.

O texto criou uma deformação, uma alucinação, uma especulação, fascinante em si, mas muito distante da obra original. Affonso fala do superdimensionamento da obra de Marcel Duchamp por nomes como Octavio Paz e Jean Clair, que teriam deixado a objetividade e a isenção de lado e levado a obra dele para um patamar que nem o próprio artista imaginara.

O enigma vazio aprofunda o discurso produzido pela arte e pela crítica de nosso tempo recorrendo à lingüística, à filosofia e à análise literária. O autor vai desmontando os famosos silogismos e sofismas repetidos durante anos por artistas e críticos.

Por fim, Affonso defende a leitura interdisciplinar - antropologia, sociologia, política, marketing, filosofia, lingüística - como a única capaz de enfrentar este enigma vazio que provocou tantas obras insignificantes e tantas alucinações críticas. 336 páginas, R$ 49,00. Editora Rocco, telefone 21-3525-2000.

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