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terça-feira, 18 de novembro de 2008
BENJAMIN STEINBRUCH
Olhar longe
Dispensar mão-de-obra talentosa é decisão que não pode ser impulsiva, tomada sob o alarido da crise global
A CHIADEIRA dos articulistas de economia, inclusive a minha, deve aborrecer o leitor nestes tempos de crise. Não se fala em outra coisa desde o fatídico 15 de setembro.
E há uma incrível convergência de opiniões sobre os remédios a serem receitados. Dos mais ortodoxos até os mais heterodoxos analistas, todos aprovam a aplicação maciça de recursos públicos para sanear o setor financeiro, para fornecer crédito ao consumo e até para socorrer empresas industriais.
Keynes está em alta, e as garras do Estado substituem por toda a parte a mão invisível do mercado, num tácito reconhecimento de que a crise é gravíssima, a pior desde os anos 30.
Apesar disso, recuso-me a cerrar fileiras na ala dos conformados.
Alguns países já entraram em recessão e muitos outros deverão entrar em 2009 -a queda de produção no bloco dos ricos é estimada em 0,3% pela OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Mas, por enquanto, vale lembrar que, embora as previsões venham sendo revisadas sempre para pior, nenhum analista projeta recessão para a economia brasileira no próximo ano ou em 2010.
Salvo acidentes de percurso, portanto, seria prudente que as empresas brasileiras deixassem de lado as lamentações monótonas dos analistas para olhar as atuais projeções de que o PIB poderá crescer ainda 2% a 3% em 2009. Isso significa que, a despeito da crise, haverá mercado interno em expansão moderada e campo para trabalhar.
Nesse cenário, decisões precipitadas, tomadas no embalo do noticiário assustador sobre a recessão em outros países, podem custar caro a empreendedores brasileiros. A dispensa de pessoal, por exemplo, exige obediência a critérios técnicos, nunca a impulsos. Dispensar talentos é a última coisa a fazer, dada a dificuldade que haverá para recrutá-los e treiná-los novamente depois, quando a economia retomar seu vigor.
Olhar longe é uma receita básica.
Exemplo nítido dessa atitude é dado pelas companhias petrolíferas multinacionais. Muitas empresas estão cortando custos e demitindo funcionários pelo mundo. Mas as de petróleo, como mostrou reportagem do "Wall Street Journal" na semana passada, continuam a recrutar pessoal especializado de forma agressiva, mesmo tendo o preço do petróleo caído abaixo de US$ 60 o barril.
Essas empresas cometeriam um erro estratégico grosseiro se, por medo da recessão, deixassem de lado projetos cuja maturidade virá em até dez anos, quando a realidade da economia mundial será completamente diferente.
Como as companhias petrolíferas, muitas outras, de vários setores, aproveitarão o momento para pescar no mercado mão-de-obra talentosa e treinada que até há pouco era escassa. É bom lembrar que, em momentos como este, os concorrentes que olham longe estarão à espreita para resgatar os talentos à deriva.
Cada empresa, seja ela pequena, média ou grande, tem a obrigação de analisar cuidadosamente os efeitos da crise em sua atividade. É bom levar em conta, porém, que o abandono de projetos em andamento e mesmo de alguns em planejamento pode ser um erro de conseqüências desastrosas no futuro imediato.
Abandonar projetos e dispensar mão-de-obra são decisões que não podem ser impulsivas, tomadas sob o alarido estridente da crise internacional.
Elas devem decorrer de dados técnicos que levem também em conta dois aspectos fundamentais: 1) o Brasil tem um mercado interno gigante; 2) esse mercado vai continuar em crescimento, ainda que mais modesto.
BENJAMIN STEINBRUCH, 55, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp.
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