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terça-feira, 11 de novembro de 2008
11 de novembro de 2008
N° 15786 - PAULO SANT’ANA
Sinaleiras e cancelas
Nunca pensei que um dia poderia pedir a volta das crianças para pedir esmolas nas sinaleiras.
Mas é a intenção que me move neste instante.
Alguém um dia percebeu que o melhor lugar para pedir esmolas era a sinaleira. Decidiu e o exemplo foi copiado por toda parte.
Nas ruas de pedestres, as pessoas não param para dar esmolas. Seguem adiante.
Na sinaleira, no entanto, os motoristas são obrigados a parar. E como teoricamente são os motoristas pessoas de recursos, tanto que possuem carro, o lugar é fértil para a caridade.
Ali é o lugar para dar a bocada.
Depressa as mães pobres ou miseráveis designaram suas crianças para pedir esmolas nas sinaleiras.
Foi assim que se iniciou esse processo de abordagem que já dura muitos anos e parece que nunca vai acabar.
No entanto, com a evolução do expediente, houve um processo de seleção entre os solicitantes. Não aparecem mais as crianças pedintes nas sinaleiras.
Deram lugar a fornidos adultos, possantes adultos, que não raro pretendem tirar donativos dos motoristas tanto pela chateação insistente dos seus apelos quanto pela ameaça de ataques físicos que carregam conteúdo nitidamente intimidatório.
Estamos vivendo em Porto Alegre, no momento, a seguinte situação: tomaram conta de todos os pontos das sinaleiras rapazes fortes, de boa compleição, que absolutamente não inspiram piedade dos motoristas.
Imagino que eles se firmaram no ponto na marra, afugentando as crianças, as mães e os velhos que antes estabeleciam ali o lugar de seu peditório. Ganharam os pontos na marra.
Calculo que se trata de uma rapina bastante lucrativa. Se 10 mil motoristas por dia cedem à chantagem na Capital, cada um colaborando com R$ 1 a cada mordida, temos aí cerca de R$ 300 mil por mês.
Visivelmente, quase todos os motoristas, principalmente mulheres, que atendem à extorsão não o fazem por caridade, mas sim por medo.
Os motoristas homens resistem, baseados na sua teórica força física, a menos que cedam à insolência.
Mas o que se nota é as mulheres, submetidas à espera demorada das sinaleiras, cederem invariavelmente à pressão.
Então, calculo que era muito mais honesta a investida das crianças sobre os motoristas, desaparecida completamente das sinaleiras, em favor dos que impuseram sua força sobre as crianças e os velhos.
Cheguei a pensar em sugerir uma providência ao poder público municipal: que fossem cadastrados crianças e velhos realmente necessitados para atuar como pedintes nas sinaleiras.
Depois pensei melhor e fui ver que era uma loucura minha, até mesmo porque não deve haver na história brasileira qualquer episódio em que o governo credencie mendigos.
Mas comigo está acontecendo um fato inédito: estou com saudade das crianças pedintes nas sinaleiras.
Pelo menos não causavam a impressão de agora: a de que é uma espécie de assalto.
De assalto ou de pedágio, o que no nosso caso vem a ser a mesma coisa.
Embora no caso do pedágio, como se está vendo, o governo fixe em 15 anos o prazo da concessão para as paradas obrigatórias dos motoristas nas cancelas da rapinagem.
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