quarta-feira, 19 de novembro de 2008



19 de novembro de 2008
N° 15794 - SERGIO FARACO


Autógrafos

Estou combinadíssimo com o editor: minha sessão de autógrafos na Feira do Livro foi a última. Mas olhem só: ao lhe comunicar minha decisão, fiquei sabendo que ele não tem tanta simpatia por sessões de autógrafos e só as organiza por considerar que é um desejo dos autores.

Como? Ouvi bem? Eu, que sempre admiti autografar meus livros em dadas ocasiões por pensar que assim o desejava o editor?

Cáspite, como dizia o outro.

O sobredito Ivan Pinheiro Machado e eu nos vemos assiduamente há 21 anos, estamos na antevéspera das Bodas de Prata, e nesses anos todos temos discutido muitas coisas, menos esta. Um silêncio obsequioso? É isso? Então nota 3 para os dois. Não aprendemos com Heráclito que a luz crua sempre é a melhor.

Minha resistência se justifica: constrangem-me essas liturgias mercadológicas. Não desgosto de autografar quando um leitor, ocasionalmente, sobretudo espontaneamente, vem ao meu encontro. Promoções para tal fim são outros quinhentos. A maioria das pessoas comparece porque, dir-se-ia, foi intimada.

E se a fila é lumbrical, lá está a vítima, ou o réu, a cumprir a pena que a editora e o autor lhe dão: duas horas de espera. Isso sem falar no que desembolsou, nem sempre de boa hora.

O editor, não sei, mas suspeito de que ele poderia lamentar, como Schopenhauer sobre a vida, que sessão de autógrafos é um negócio que não vale o investimento. Tem um lado bom e um lado ruim. O bom: dá no jornal que a obra já freqüenta as prateleiras comerciais.

O ruim: a casa gasta coxudos pilas na impressão de convites, gasta com envelopes, postagem, vinho, petiscos, sem contar as horas de trabalho de seus funcionários e a inquietude: será que vai dar certo?

O investimento dificilmente é compensado pelo número de exemplares vendidos, exceto nos casos em que a fila dobra a esquina.

E nem estou considerando que autografar livros em livrarias ou feiras é algo que se vulgarizou e perdeu o encanto. Em nossa feira, pasmem, tivemos 800 sessões de autógrafos, mais de 50 por dia.

Uma alternativa é o costume em voga no Uruguai. No lançamento do livro, o editor oferece um coquetel a jornalistas, críticos literários, livreiros, distribuidores. Alguém apresenta a obra, o autor responde às eventuais perguntas e... fim!

Se algum dos presentes quiser um autógrafo, que o peça. Assim não se constrange o autor, tampouco o convidado, e o editor, gastando menos, herda o único benefício do que hoje se faz de modo tão incivil: a atenção de quem conduz o livro até o leitor.

Nenhum comentário: