sábado, 22 de novembro de 2008



PAPATA DOS PEDÁGIOS

Eu acredito no que leio nos jornais. Sou ingênuo? Não sei. Acredito e fico perplexo. Chego a passar horas refletindo sobre as notícias do dia. Tenho muito tempo livre. Ontem, por exemplo, fiquei ensimesmado com o que li neste nosso intrépido Correio do Povo: 'Yeda vai a Brasília apelar ao ministro pelos pedágios'.

Não me espantei, como faria certamente um francês, com o tratamento informal dado à governadora do Estado, chamada pelo nome, como uma velha amiga, mas com o conteúdo mesmo da informação.

Não li em lugar algum uma manchete assim: 'Yeda apela ao ministro pelos professores'. Fiquei sabendo, ao contrário, que a governadora insiste em não abonar as faltas dos grevistas do magistério estadual.

O Brasil é um país clonado. Tudo possui um duplo. Pagamos previdência pública e privada, segurança pública e privada, educação pública e privada. Os impostos funcionam como pedágios pagos ao Estado.

Visto que não funcionam corretamente, metemos novamente a mão no bolso para resolver nossos problemas com serviços privados. O Estado vende dificuldades. A iniciativa privada cobra pelas facilidades. Um não vive sem o outro. Tem pedágio para tudo.

Conheço um sujeito que paga pedágio para visitar a amante. Ela mora no fundo de um pátio. Para atravessar o corredor que leva ao local do 'crime', sem provocar escândalo, o cara paga sem reclamar. A estradinha não é grande coisa, mas dá para o gasto.

Outra notícia que me chamou a atenção foi esta: 'Pont diz que proposta é negociata'. O deputado Raul Pont foi, referindo-se à prorrogação dos pedágios, ainda mais longe: 'Se mantido este processo, estaremos diante de uma das maiores negociatas que já se viu neste Estado. A CPI do Detran vai ser bobagem perto disso.

Esse vai ser o maior escândalo que este Estado já viveu, com esta negociata para beneficiar cinco ou seis concessionárias'. Fiquei atônito. Não sou amigo de Raul Pont. Sempre o considerei um homem sério.

Acredito no que ele diz. Procurei no Aurelião o termo negociata: 'Negócio em que há logro ou trapaça. Negócio irregular, suspeito. Mamata, papata'.

Será que vão processar o deputado Raul Pont? Ele está dizendo que tem mutreta no caminho dos gaúchos? Eu ando muito por essas estradas pedagiadas. São boazinhas. Nenhuma parece um tapete mágico. Funcionam. Ao menos.

Pensei em ligar para Raul Pont. Não tenho o seu número de telefone. Consultei novamente o dicionário. Cheguei à conclusão de que ele só podia estar falando em 'papata'. Não devia estar pensando em trapaça. Eu sou muito lógico.

Só pode ser 'papata'. Estou convencido de que Raul Pont quis dizer que 'estamos diante de uma das maiores papatas que já se viu neste Estado'.

Eu nunca tinha ouvido falar em papata. Achei que era batata. Imaginei batata como uma metáfora para pepino ou abacaxi. Seria, digamos, uma influência de Luiz Inácio no terreno das imagens inusitadas. Continuei a pesquisar. Papata é papata.

Folheei assustado o amansa-burro. Cheguei, enfim, ao vocábulo papata. Ele é definido economicamente: negociata. É um círculo vicioso. Como os pedágios.

Paga-se para entrar e sair. Tenho certeza de que, em juízo, Raul Pont não hesitaria. Estava falando em papata, cujo sentido original foi desvirtuado com o tempo. É batata!

juremir@correiodopovo.com.br

Ótimo sábado e um excelente fim de semana

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