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segunda-feira, 3 de dezembro de 2007
03 de dezembro de 2007
N° 15437 - Luis Fernando Verissimo
Do baú
O futebol é, basicamente, o mesmo desde que foi inventado. Não há muito o que fazer para mudá-lo, fora detalhes.
Com a lâmina de barbear acontece a mesma coisa. O modo de jogar futebol pode ser completamente diferente hoje do que era há anos, como a aparência dos aparelhos de barbear de hoje pouco tem a ver com a da época em que o Mr. Gillette inventou sua prática lâmina, mas a idéia fundamental permanece inalterada, e inalterável.
E, no entanto, todos os anos os fabricantes de aparelho de barbear precisam apresentar um produto novo. Todos os anos os departamentos de marquetchim pedem aos departamentos de pesquisa que reinventem o aparelho de barbear, para terem o que anunciar.
Duas lâminas, três lâminas, cinco lâminas, lâminas flutuantes, lâminas convergentes, lâminas divergentes, lâminas musicais - qualquer coisa para que o aparelho do ano passado fique obsoleto e a novidade fique irresistível. Da mesma forma, todo técnico, quando assume um novo time, deve trazer a sugestão implícita de que vai reinventar o futebol.
As razões dadas para trocar de técnico são muitas. O técnico que sai perdeu o ambiente, perdeu a confiança, perdeu a razão - e é sempre mais fácil trocar um técnico perdedor do que um time inteiro.
Mas a razão verdadeira é o desejo secreto de que o novo técnico reúna os jogadores no meio do campo, abra sua sacola e tire lá de dentro - tará! - um outro jogo. Um futebol inédito. Um futebol que ninguém mais tem, e, portanto, invencível. O milagre ainda não aconteceu, mas todo técnico de futebol é uma promessa do futebol reinventado.
Por isso eles levam vidas de homens santos, perambulando pelo país entre guaridas temporárias, sabendo que é pouco o tempo entre a adoração e o desmascaramento, a adulação e o apedrejamento. Ou ele é um salvador ou é um charlatão. Não tem o recurso do meio-termo.
Nem o recurso do bom senso. O novo técnico não pode dizer para o time e a torcida que o futebol é um aborrecido jogo de repetição e paciência, decidido, muitas vezes, por um ponta-esquerda que nem foi escalado, o Fortuito.
Não pode enfatizar que o futebol precisa ser jogado com o pé, sabidamente um órgão tão dispersivo e difícil de controlar que poderia ser do governo.
Nem lembrar o fato que o adversário colocará em campo, perversamente, um time com o mesmo número de jogadores que também querem a bola, só para os atrapalhar. Seria a mesma coisa que um fabricante de aparelhos de barbear fazer uma cara campanha publicitária para anunciar nada de novo.
Dizer que não há mais o que fazer, que o aparelho de barbear chegou ao limite das suas possibilidades de mudança, que o deste ano será sensacionalmente igual ao do ano passado.
Impensável.
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