sábado, 22 de dezembro de 2007



22 de dezembro de 2007
N° 15456 - Paulo Sant'ana


Ih, aí vem o Natal!

Está chegando o Natal. Está se aproximando a mais bela de todas as datas, mas também, paradoxalmente, a mais triste de todas as datas.

O Natal triste? Estarei dizendo um tremendo absurdo? Mas duvido que haja uma só pessoa que me leia e for atenta que discorde de mim: o Natal carrega em seu seio uma alta carga de sublimidade, mas também, por outro lado, demole com o coração da gente.

Eu gostaria neste Natal - e quanta gente igual a mim! - de ter a meu lado na noite de 24 de dezembro todas as pessoas de quem eu gosto, além das pessoas que amo. E não vou tê-las. Porque a vida insiste na distância. A vida insiste ou em separar as pessoas que se amam, ou em caprichosamente mantê-las à distância.

Nem vou falar nos mortos queridos que eu queria ter a meu lado no Natal. Nem vou falar dos mortos amados, porque se for falar, as lágrimas que borrifariam dos meus olhos serviriam para recompor a vazante do Rio Amazonas.

Quero falar dos vivos que deploravelmente não vão estar ao meu lado no Natal. Como eu desejaria que eles rezassem comigo a prece que antecede a ceia de Natal e depois brindassem junto de mim mais um ano que se avizinha e mais uma porção da vida que saboreamos ou tragamos amargamente de janeiro até dezembro - e caíssemos depois todos unidos, como um bando de aves, sobre as fatias de peru e de panetone.

Como eu gostaria de ter junto de mim neste Natal todas as pessoas a quem já fiz gargalhar e também todas as pessoas que me fizerem chorar de emoção.

Como eu gostaria!

Está chegando mais um embaraçoso Natal. Porque sempre o Natal me enche de dúvida se eu o mereça feliz. Eu sempre no Natal fico cismando que nada fiz para me tornar digno desta estupenda data.

Terei amado o suficiente para ser digno de mais este Natal? Terei socorrido os que se me mostraram aflitos e terei tentado consolar os que vieram me dizer que estavam desesperados?

Terei sido solidário com o sofrimento dos outros? Não terei tido inveja dos que vieram me dar a notícia de que tiveram um grandioso triunfo? Não terei tido inveja dos que enriqueceram ou dos que mantêm um casamento feliz?

Serei digno de mais este alegre e embaraçoso Natal?

É lindo o Natal em família. Mas isso para quem tem família. Ou para quem não tem duas famílias.

Para quem tem duas famílias, o Natal é massacrante. Tanto o é para quem não tem família.

Não ter família é pouco, ter uma família é bom, ter duas famílias é demais. Devo ter escrito nesta última frase uma das maiores sacadas que já tive, recortem-na e preguem-na na parede da cozinha.

Como não nos embaraçarmos neste Natal, se hoje poderíamos comprar 40 bicicletas mas nos martelará no espírito na noite de Natal a recordação de que passamos a infância e a adolescência inteira sem termos uma só bicicleta, nem patinete tivemos, o que se repete em milhões de lares pelo mundo?

Respondam: como não sentir vontade de chorar neste Natal que se aproxima ameaçadoramente?

Então, para os que nada têm ou para os que muito possuem é também torturante o Natal.

Meus amados, boa viagem!

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