quinta-feira, 27 de dezembro de 2007



27 de dezembro de 2007
N° 15461 - Luis Fernando Verissimo


Há micróbios

2007 vai ficar como o ano em que, entre outras coisas, descobriram que há vida em Marte. Um ambiente propício para micróbios, qualquer coisa assim. Você eu não sei, mas eu me decepcionei muito com Marte.

Fomos preparados pela ficção científica a esperar muito mais dele, a começar por uma invasão. Mas descobriram que não havia ninguém em Marte.

Os tais canais vistos pelas lunetas antigas, provas da existência de alguma forma de vida inteligente, mesmo que fosse só de engenheiros, não eram canais. Nenhum vestígio de qualquer tipo de vida aparecera em Marte, muito menos de uma civilização capaz de nos atacar.

Marte, como o Iraque, também não tinha armas de destruição em massa. Era um imenso parque de estacionamento vazio, sem nem um atendente. Um blefe. Agora descobriram que há micróbios em Marte.

Ou uma civilização de micróbios, quem sabe? Anos e anos de literatura premonitória e previsões terríveis talvez não tenham sido, afinal, desperdiçados.

De acordo com a ficção científica, extraterrenos fatalmente viriam à Terra para nos atacar e subjugar. Nenhum viria fazer turismo ou participar de congressos. Viriam para nos aniquilar ou nos escravizar, ou roubar nossos fígados para fazer pomadas para suas princesas. E a presunção se justifica.

Só uma civilização muito mais avançada do que a nossa dominaria viagens interplanetárias em grande escala, e nos acostumamos a pensar que só o desenvolvimento tecnológico para fins bélicos traz civilizações avançadas. Na Terra tem sido assim, desde o primeiro estilingue até a internet.

É a pesquisa para a guerra que traz o progresso. Razoável supor, portanto, que os visitantes do espaço serão sempre guerreiros e não filósofos, ou missionários pacíficos, ou comerciantes. Estes viriam depois.

Não quero assustar ninguém, mas vou contar. Já tive contato com um extraterrestre. Desconfiei quando ele disse "Vocês são engraçados..." e eu perguntei:

- "Vocês" quem? "Vocês" brasileiros? "Vocês" carecas? "Vocês" míopes? Destros? Cardiopatas? Torcedores do Internacional?

E ele respondeu: - Vocês gente.

E me confessou (já tinha bebido um pouco) que não era deste mundo, era de outro, e estava prospectando o universo inteiro atrás de um planeta para ser colonizado pelo seu.

Achava que tinha, finalmente, encontrado esse planeta. Era a Terra. No seu relatório, recomendaria que a Terra fosse ocupada e sua principal riqueza natural explorada, pois era o que faltava no planeta do qual viera.

Diria no relatório que não seria problema invadir a Terra, pois estávamos recém começando a usar o laser como arma e ainda não descobríramos o poder destrutivo do kiwi, e seríamos facilmente dominados.

Perguntei qual era a riqueza natural que nós tínhamos e eles não, e o extraterrestre respondeu: "A poesia". E perguntou:

- Você sabe que a Terra é o único planeta do universo conhecido em que as pessoas dão nome aos ventos?

Fiquei lisonjeado com aquilo, pensando: "Taí, somos todos poetas e não sabíamos". E perguntei se não havia poetas no planeta dele. Claro que não, disse ele. Ou como eu imaginava que eles tinham se tornado uma civilização tão avançada?

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