terça-feira, 18 de dezembro de 2007



O TALENTO DA PIMENTINHA

Fomos ver o show de Maria Rita, a nova Pimentinha. Ela é adoravelmente piradinha, quase esquisita, cheia de estilo, de gestos e de trejeitos. O Brasil sempre teve boas cantoras. Gal Costa é a melhor ainda em atividade. Maria Bethânia tem seu charme muito especial.

Marisa Monte e Adriana Calcanhoto são boas, mas um degrau abaixo, prejudicadas por vozes menos potentes e letras nem sempre convincentes. São moderninhas de segundo caderno demais para encantar todo mundo. A música é o que temos de melhor. Nem no futebol somos tão criativos.

Para cada Robinho ou Kaká, temos dois ou três Chico Buarque, sendo que a maioria não joga pelada nem escreve romance, mas também não compõe como o mestre. O melhor de tudo é que eles não vão embora. Ficam por aqui mesmo, cantam em nossos palcos, ganham grana, vivem felizes e nós também.

Confesso que eu não estava convencido do talento da filha de Elis Regina. Tenho bronca com filhos que usam a sombra dos pais famosos para tentar decolar em carreiras em geral destinadas à mediocridade. O problema é que ela me parecia muito filha e pouco ela mesma. Fiquei satisfeito com o que vi.

Em primeiro lugar, a moça está muito gostosa. Saradíssima. Deve ter malhado muito, pois já não é a gordinha do começo da sua carreira. Nada contra as gordinhas. Se falo disso é por ela ter provocado um pouco, no melhor sentido da provocação.

Apresentou-se de barriguinha de fora, explorando intencionalmente o seu 'corpicho bacana' para seduzir a platéia. Mostrou uma forma invejável. Além disso, sabe sambar. Mexeu o delicioso esqueleto durante uma hora e meia sem revelar o menor sinal de cansaço ou de desafinação. Deixou os marmanjos de língua de fora.

O essencial é que parou de tentar imitar mãe. O seu registro de voz é diferente, mais até para essas cantoras de gospel. Quando soltou o vozeirão, em tom mais grave, arrasou. Ela é cheia de malandragem. Fala assim: 'Aí nego não respondia...'. Que loucura!

É claro que, em determinados momentos, não resistiu a copiar a mãe naquilo que era uma das suas marcas registradas, aqueles grunhidos que a faziam parecer uma criança imitando uma rã.

O repertório, repleto de carioquices descoladas, soube incorporar as melhores gírias do momento. Não é fácil gostar de um show em que não há o melhor de um passado distante do intérprete para ser ouvido.

O sujeito que vai ao show de Roberto Carlos quer mais é escutar 'Detalhes', 'Outra Vez' ou algo assim. Nada pior num show do que música nova. Como eu praticamente desconhecia as canções de Maria Rita, só tinha mú sica nova para ouvir. Superei. Um pouco mais, e eu começava a sambar. Já me via fazendo um breque e retomando o ritmo como um craque.

Felizmente para a humanidade, não cheguei a tanto. Por muito pouco. Seria lamentável para as pessoas em torno. Elas pagaram caro por um lugar num camarote para ver coisas belas.

Não o fiz, contudo, por senso crítico, mas somente por falta de apoio ou de incentivo direto. Faltou alguém para me contagiar. Sou muito influenciável. Na minha frente estavam dois publicitários importantes e elegantes, o Fedrizzi e o Luiz Coronel.

O primeiro até que se balançou discretamente. Coronel manteve-se firme, mesmo quando em pé. Resolvi seguir a tendência dominante e creio que me dei bem. Voltei para casa feliz e com a minha dignidade intacta. Até quando resistirei?

juremir@correiodopovo.com.br

Ótima terça-feira e de tempo bom por aqui

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