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quinta-feira, 27 de dezembro de 2007
AS GRANDES DECEPÇÕES
Na vida, infelizmente, cada um tem grandes decepções. Algumas, de modo curioso, marcam mais do que outras. Sem maiores explicações ou motivos. Colam na pele da gente.
A primeira grande frustração da minha vida foi, quando eu tinha 6 anos de idade, descobrir que eu não podia namorar a minha professora, dona Eulália, a primeira mulher a usar minissaia em Palomas.
Não me lembro de revolução mais arrasadora nem de fato social mais comentado. Nem os suicídios e assassinatos da época receberam tanta atenção, críticas e entusiasmo. Posso garantir que maio de 1968 em Palomas foi ela.
Vai fazer 40 anos. De fato, o piegas Zuenir Ventura tem razão: foi um ano que não acabou. Creio que nunca me recuperei inteiramente dessa interdição etária. Acho que é por isso que sempre me oponho a qualquer divisão por idade.
Outra grande decepção na minha vida aconteceu quando da morte de Paulo VI. Saber que o Papa não era indicado diretamente por Deus, mas eleito pelos homens, me abalou profundamente.
Eu confiava em Deus. Mas, precocemente, muito pouco na humanidade. Fui acumulando frustrações. Nada que me impedisse de levar uma vida normal. Mesmo assim, golpes terríveis. Lembro-me de duas mágoas que quase me destruíram.
Descobrir que Brigitte Bardot não estava a salvo da velhice e que Che Guevara podia ser considerado um stalinista, um autoritário e um candidato a ditador.
Foi quase tão horrível quanto aprender que o amor podia não durar para sempre e que a frase, nos casamentos, 'até que a morte os separe' era somente uma promessa ou, enfim, uma maneira de falar. A vida é dura.
Fiquei revoltado. Escrevi e encenei uma peça, 'Os Rebeldes'. Depois, tratei de me conformar e ir em frente. O teatro não perdeu grande coisa. Eu perdi as minhas ilusões. Não sabia que algo muito pior aconteceria. A religião me causou choques profundos.
Quando soube que cada cultura podia ter um deus ou mesmo deuses diferentes, entrei em crise. Tremia de medo de não crer. Que falta de comunicação e de entendimento! Voltei para a catequese em busca de respostas. Tive outras decepções inesquecíveis:
a Eliane e a Meire, que não me quiseram, embora eu tenha dedicado a elas os meus piores poemas, a Fátima, que me quis, mas eu não tive coragem de pegar a mão dela na matinê do cinema Internacional, o Inter nunca ter chegado a dez% títulos gaúchos consecutivos e, acima de tudo, a descoberta, aos 9 anos de idade, de que Papai Noel não existia. Foi um baque. Eu sempre fui bobo.
Na seqüência, em tempos que agora se embaralham, descobri coisas inacreditáveis: que vivíamos numa ditadura militar, que Lídia Brondi não era virgem, que o homem de fato estivera na Lua, que eu havia apertado a mão de um ditador, Ernesto Geisel, na parada estudantil de Santana do Livramento, que não havia certeza da vida eterna e que muita gente passava fome. Tudo me abalou.
Mas nada me sacudiu tanto quanto tomar conhecimento, já adolescente, de que Papai Noel, esse velhinho de vermelho, é uma invenção da Coca-Cola. Se não uma invenção, uma adaptação. É o caso mais importante e globalizado de propaganda enganosa.
Não consigo aceitar. De tudo eu já me recuperei. Menos disso. Papai Noel, Brigitte Bardot e Che Guevara eram intocáveis para mim.
Não restou ninguém. As noites de Natal agora são com a Xuxa e o Roberto Carlos. Ainda não me sinto preparado.
juremir@correiodopovo.com.br
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