04 DE FEVEREIRO DE 2022
EDUARDO BUENO
A morte das casuarinas
Há mais de 40 anos veraneio na praia da.... bom, há mais de 40 anos que não digo o nome dela, embora já faça uns maus 20 anos que a coitada foi "descoberta" por outros gaúchos, por paulistas e até pelos catarinenses - pois cabe lembrar que, com exceção dos pescadores locais, os moradores de Santa Catarina desconheciam as próprias praias, embora agora ajudem a destruí-las com tanta inépcia e rapidez quanto os supostos "pioneiros".
De todo modo, lá estava eu perambulando pelo último recôndito intocado da velha praia quando, para meu espanto, deparei com a derrubada maciça de árvores numa zona de preservação. Eram centenas de troncos tombados e galhos retorcidos. Contemplei o cenário e quase tive um surto... de felicidade. Antes que você ache que faço parte da turma do "quanto pior, melhor" (embora de certa forma eu faça), explico: as espécies abatidas eram as invasoras exóticas e nocivas que atendem pelo nome "casuarina", plantadas por incautos, boa parte deles "desbravadores" daquelas plagas e introdutores daquela praga.
Seguia eu a contemplar os cadáveres lenhosos, desfrutando de uma das raras sensações de contentamento nessa minha saga de derrotas na luta preservacionista, quando um bípede (momentaneamente transformado em quadrúpede) apareceu montado num desses diabólicos quadriciclos que agora zumbem feito varejeiras por entre as dunas outrora tão lisas e silenciosas. Aproximou-se, parou seu maldito veículo ruidoso e fumarento ao meu lado, contemplou o cemitério arbóreo e vaticinou: "Isso é um crime ecológico".
O cara se locomove sobre quatro rodas de borracha impulsionadas por combustível fóssil não renovável, soltando fumo, fazendo barulho e deixando sulcos nas dunas de um parque estadual, vê um monte de casuarinas tombadas sob o amparo da lei e diagnostica um "crime ecológico". Não posso dizer que respirei fundo, até porque não curto CO2, nem tenho muita paciência com a ignorância. Mas soltei um suspiro de tédio, temperado por certa dose de desdém. O sujeito deve ter achado que eu era um ser insensível, ou quiçá um boiadeiro disposto a expandir sua fazenda. Então, partiu zunindo areal afora.
Na volta para casa, pude ver umas 20 novas construções brotando feito cogumelos pelos outrora verdes morros, o que aliás me lembrou dos bons chás que tomava na época em que aquelas praias eram só dos que conseguiam chegar até elas a pé. Por pura nostalgia, cheguei a aventar a possibilidade de ingerir uma microdose de Psilocybe cubensis e refazer as viagens de outros tempos. Mas conclui que nem o mais fantástico dos fungos evitaria a bad trip, pois o mar não está para peixe. Está mais para jet ski, cujos impostos para importação, aliás, certa criatura ignóbil quer agora reduzir, pois "o Brasil tem muita água".
Nenhum comentário:
Postar um comentário