sábado, 26 de fevereiro de 2022


26 DE FEVEREIRO DE 2022
OPINIÃO DA RBS

ESTILHAÇOS ECONÔMICOS

A perda de vidas e outros dramas humanitários são sempre os aspectos que mais devem ser lamentados em uma guerra. Mas o conflito na Ucrânia, a partir da condenável invasão russa, traz preocupações adicionais em relação à economia. Principalmente devido ao perfil dos países diretamente envolvidos na contenda. A Rússia é um dos principais produtores do mundo de petróleo, gás, fertilizantes e tem grande peso em alguns grãos. A Ucrânia, conhecida pela fecundidade ímpar de seu solo, também é relevante exportadora de trigo e milho. Estas particularidades são motivo de sobra para o Brasil e o Rio Grande do Sul temerem especialmente os reflexos da conflagração armada.

As incertezas em relação à continuidade das hostilidades, além das sanções impostas à Rússia, trazem insegurança sobre o fluxo de fornecimento dessas matérias-primas. O resultado óbvio, como já se viu, é a disparada dos preços pela imprevisibilidade em relação à normalização da corrente de comércio. É inevitável um impacto inflacionário global e também no crescimento do mundo, que recém tenta se reerguer dos prejuízos causados pela pandemia.

A disparada do petróleo e do gás, em alta mesmo antes do início do conflito, tende a pressionar ainda mais os preços no Brasil e disseminar malefícios. Combustíveis possivelmente ficarão mais caros nas bombas. O gás, da mesma forma, é um importante insumo industrial, utilizado em diversos outros fins, como a geração de energia elétrica. O impacto da guerra pode ser ainda mais nefasto se forem considerados os reflexos no câmbio.

A agricultura brasileira e gaúcha, é necessário ressaltar, depende basicamente de fertilizantes importados, e a Rússia é a grande fornecedora. A escalada das cotações, que já ocorria, acelerou. Péssimo especialmente para os produtores gaúchos, que verão o custo de produção ter alta significativa, ao mesmo tempo em que colhem uma safra frustrada devido à estiagem. O milho inflacionado reverbera na cadeia de carnes, uma vez que o grão é o principal ingrediente das rações. Trigo valorizado significa massas e pães mais caros.

É imprudente prever os próximos dias pela alta volatilidade dos acontecimentos. Os desdobramentos do conflito são imponderáveis. Mas o cenário que se desenha, por enquanto, traz justificada apreensão. Os preços mais altos de combustíveis, de grãos e derivados e de carnes vão afetar todo o mundo. O Brasil, no entanto, enfrenta dias de economia desaquecida, mercado de trabalho fraco e renda em queda. Isso significa que, na média, cada brasileiro está ganhando menos, enquanto o custo de vida sobe. A inflação persistente, fatalmente, levará o Banco Central a pelo menos manter o juro em níveis mais altos por um período maior do que projetava há poucas semanas. Encarece o crédito e afeta a economia.

Todo este horizonte desafiador torna ainda mais improrrogável a busca do país por atacar as suas fragilidades internas para se defender dos estilhaços econômicos da guerra. Sinalizar responsabilidade fiscal e comprometimento com reformas - mesmo difíceis de andar em ano eleitoral - e evitar turbulências institucionais e políticas são um bom começo para ajudar a estabilizar indicadores macroeconômicos. A sensatez se torna um imperativo, enquanto se aguarda que as tensões no Leste Europeu possam refluir.

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