08 DE FEVEREIRO DE 2022
ALMANAQUE GAÚCHO
Brizola e Varig, fiel do começo ao fim
Segunda-feira, 8 de fevereiro de 1982
O texto a seguir foi enviado pelo jornalista Mario de Albuquerque. Ele trabalhou na empresa aérea gaúcha de 1954 até 1993, é autor do livro Berta - Os anos dourados da Varig e mantêm o blog agrandefamiliavarig.com.br
Na passagem do centenário de nascimento de Leonel Brizola, vale rememorar a grande parceria que o político gaúcho manteve com a Varig, numa lealdade mútua do começo ao fim. São fatos históricos mantidos, na época, em segredo, pois uma das personagens encontrava-se sob suspeita, exilado, sem credenciais para falar em nome do país.
Quando a Varig ainda engatinhava e tinha ânsias de crescimento, Ruben Berta (o presidente da instituição), sonhava alto, mas muitas barreiras precisavam ser vencidas. Na fundação do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), Brizola, então com 25 anos, era um líder universitário, estudante de Engenharia, em Porto Alegre. João Goulart (Jango), com 30 anos, era advogado e fazendeiro em São Borja. Ambos eleitos deputados estaduais, com apoio velado de Berta, selaram amizade na instalação da Assembleia Constituinte de 1946. Em 1947, Berta enfrentava um dilema que se tornaria fundamental resolver para o desenvolvimento e vida da Varig. Era preciso ampliar suas rotas para o Exterior como possibilidade única para uma empresa que se encontrava pronta para novas conquistas.
Levado pelas circunstâncias, Berta não teve escrúpulos para contatar Brizola e Jango, solicitando ajuda em termos imediatos. A Varig precisava voar até Buenos Aires, na Argentina. O governo não concordava e criava dificuldades pelas vias burocráticas. A solução era conseguir uma aproximação com o então presidente argentino, Juan Domingo Perón, o que foi considerado uma proeza. Berta, de imediato, lembrou-se do nome de Getúlio Vargas - que mantinha com o líder do país vizinho laços de amizade. Brizola e Jango foram até Getúlio, que tinha se auto-exilado em sua fazenda do Itu, em São Borja. O ex-presidente brasileiro deposto não se fez de rogado e, mais uma vez, veio em apoio da empresa gaúcha.
Recomendados por Getúlio Vargas, os dois deputados seguiram para Buenos Aires, sendo logo recebidos por Perón. Falando da amizade que os aproximava, o argentino entrou logo no assunto perguntando:
"Deputados esse senhor Berta é de confiança?", perguntou o presidente argentino. Brizola respondeu, sem pestanejar: "É homem sério, construindo uma empresa aérea no Rio Grande do Sul". E, assim, trouxeram a liberação da linha de Buenos Aires para a Varig.
Essa ajuda rendeu uma série de encontros de Berta com Getúlio, apadrinhados por Brizola e Jango, nascendo daí uma sólida amizade que se consolidou, ainda mais, com a volta de Getúlio ao poder. Berta começou, então, a luta para conquistar a linha para Nova York. Ligou para Brizola, na época líder do PTB na Assembleia, e pediu sua intercessão junto ao presidente. Brizola foi ao Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, com ofício da Varig em mãos e voltou com a autorização, depois confirmada pelo ministro Nero Moura. Com a conquista da linha para os Estados Unidos, a Varig precisava, urgentemente, modernizar a frota.
Novamente Berta recorreu ao prestígio de Brizola e foi à Capital Federal, onde conseguiu o aval de Getúlio para aquisição de três aeronaves, os modernos Super Constellation, com a parceria do Banco da Província do RGS.
Em 1961, no episódio da Legalidade, a Varig, por meio de Berta, soube retribuir de forma fiel a todo o apoio recebido no passado, colocando à disposição do governo do Estado suas dependências e a frota da companhia em defesa da democracia. Foi num avião Caravelle, da Varig, que Jango voltou ao Brasil. Com a posse de Goulart como presidente, a Varig teve motivos para se sentir ameaçada.
Havia, na época, o projeto de criação da Aerobras - uma estatal que incorporaria todas as empresas aéreas, além de se propor também a construir aeronaves. Até mesmo uma data teria sido marcada para a extinção das companhias aéreas privadas, seria um 19 de abril - ironicamente, data de nascimento de Getúlio, que havia se suicidado em 1954. Isso, que acabou nunca acontecendo, representaria o fim da Varig. Mesmo assim Berta manteve-se sempre fiel a Brizola, apesar do seu sonho estar correndo risco e condenado a um possível extermínio. A Varig foi peça chave no retorno daquele antigo companheiro de históricas jornadas, que quase se tornou seu algoz.
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