sábado, 19 de fevereiro de 2022


19 DE FEVEREIRO DE 2022
ECONOMIA

FUGA DE CÉREBROS

Desde que os mesopotâmios criaram o primeiro calendário, por volta de 2.700 a.C., criamos também o hábito de, a cada virada de ano, renovarmos metas, planos e objetivos. Nesse espírito, ainda em janeiro, a Federasul reuniu dirigentes de suas mais de 170 entidades filiadas para ouvir as realidades regionais e projetar o ano. O que vimos foi uma reprise de demandas fundamentais para o aprimoramento da nossa competitividade: melhorias na infraestrutura, qualificação de mão de obra, redução de carga tributária, diminuição da burocracia.

Contudo, desta vez elas estão combinadas com um ar renovado de otimismo. Os altos índices de vacinação contra a covid-19 têm feito com que a variante Ômicron se alastre sem sobrecarga da rede hospitalar, deixando distantes as chances de novo fechamento de empresas. Além disso, por se tratar de ano eleitoral, são esperadas entregas e, quando menos, renovação de compromissos por parte da classe política com as pautas de quem produz.

O otimismo ampara-se, ainda, no fato de que, depois de muitos anos sem dinheiro, sequer para pagar salários, o governo gaúcho consegue não apenas retomar pagamentos em dia como também fechar 2021 com superávit, projetando investimentos.

Apesar do otimismo, sabemos que o Rio Grande do Sul ainda luta contra problemas históricos. Mesmo quando as diferentes etapas do Programa Avançar forem cumpridas - e acompanharemos para que isso ocorra -, teremos avançado somente uma parcela inicial. É a massa do bolo, quando falamos em competitividade e desenvolvimento. O recheio e a cereja dependem de outros fatores, como a evolução dos ecossistemas de inovação e a abertura para a Nova Economia.

É um desafio do Estado, mas também da nação. A retomada do desenvolvimento, necessariamente, passa por ciência, tecnologia e inovação. Países mais desenvolvidos já perceberam isso: dados do Índice Global de Inovação mostram que a Suíça investe 3,2% do seu PIB em CT&I. Lidera um ranking no qual o Brasil ocupa o modesto 57º lugar, com 1,15% do PIB aplicado na área.

Ocorre que, além de investir, performar bem em inovação também exige capital humano, algo que infelizmente estamos perdendo. Os salários em moedas mais valorizadas, como dólar e euro, atraem as mentes mais brilhantes. Enquanto isso, as escolas públicas não conseguem formar profissionais com o perfil exigido pelo mercado.

O modelo pedagógico meramente expositivo, utilizado em nossas salas de aula, está ultrapassado. As disciplinas não se conectam à vida real dos alunos e tornam-se desinteressantes. Falta instar os estudantes ao trabalho em grupo e à resolução de problemas reais. Não se trata de acabar com a aula expositiva, mas complementar o modelo atual com novas práticas, em que os alunos apliquem o conteúdo ao lado dos colegas. Essa escola do futuro também é digital e incorpora ao currículo temas caros à sociedade atual, como diversidade, sustentabilidade e empreendedorismo. O problema é que ela não sai do papel.

Ao contrário: impactada pela pandemia, a educação pública regrediu. A desigualdade social ficou escancarada durante as aulas online. Os filhos de famílias de baixa renda não tinham estímulo, tampouco acesso à internet. O resultado? Aumento de 171% na evasão escolar em todo o país, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua.

Uma nota técnica divulgada recentemente pelo Todos Pela Educação, com base nessa mesma pesquisa, ressalta que, entre 2019 e 2021, o número de crianças com seis e sete anos que ainda não sabem ler e escrever saltou de 1,43 milhão para 2,39 milhões - aumento de 66%. São dados que reforçam a necessidade de uma ampla reforma educacional.

Para um Estado e um país crescerem nos novos tempos, é preciso seguir um método. Requer investimento na educação das novas gerações e um enorme esforço para resolver grandes gargalos logísticos e de infraestrutura. Há de ter reformas que otimizem a máquina e evitem o desperdício de recursos, como a administrativa e a tributária, no campo federal. E focar na solução das demandas das pessoas, não em polarização política.

Temos o diagnóstico do problema e alternativas para a solução. Temos a disposição para enfrentar e a resiliência para não desistir. Temos força e otimismo. E o melhor: temos um ano inteiro pela frente para trabalhar para que essas mudanças se concretizem. Mas não haverá mudança sem a dedicação e o envolvimento de cada um de nós. Não percamos essa oportunidade!

Presidente da Federasul - ANDERSON TRAUTMAN CARDOSO

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