07 DE FEVEREIRO DE 2022
OPINIÃO DA RBS
SAIA JUSTA DIPLOMÁTICA
A carência de habilidade diplomática é um traço da gestão Jair Bolsonaro. Essa marca volta ser reforçada agora, com a visita programada do presidente ao colega russo, Vladimir Putin, nos próximos dias. A passagem por Moscou é, no mínimo, inoportuna, tendo em vista a tensão internacional criada com as ameaças da Rússia de invadir a Ucrânia. É uma crise que também mobiliza Estados Unidos e Europa na tentativa de dissuadir Putin de um ato de agressão potencialmente gerador de um conflito armado e geopolítico com consequências imprevisíveis envolvendo diversos países.
A presença de Jair Bolsonaro neste momento no Kremlin, com um provável aperto de mãos sorridente com o autocrata russo fotografado e correndo o mundo, pode ser interpretada como um apoio tácito do presidente brasileiro à Rússia e às rusgas com o Ocidente. Por essa mesma possível compreensão, Putin ganha com o encontro, por receber o líder de uma nação importante em uma área considerada de influência dos EUA. A viagem pode ter significado pessoal para Bolsonaro, por sinalizar que não está internacionalmente isolado e tem a simpatia de outro presidente de perfil conservador, mas é uma saia justa diplomática sob a perspectiva dos interesses de longo prazo do Brasil.
Sempre que possível, o país deve ter prudente equidistância de litígios que não lhe dizem respeito, protegendo os próprios interesses. Essa foi a postura aconselhada, por exemplo, no período de maiores tensões econômicas entre os Estados Unidos sob Donald Trump e a China, enquanto Bolsonaro, aliado do ex-presidente republicano, reiteradamente distribuía caneladas na China, maior parceira comercial do Brasil.
A visita a Moscou, já se sabe, desagrada à Casa Branca. Provavelmente não será bem vista na Europa, onde o presidente encontra algumas antipatias pessoais. Se já existia certa resistência do governo Joe Biden e de lideranças europeias a Bolsonaro, por uma série de razões, como a ambiental, as objeções tendem a ganhar um novo componente. É preciso atenção redobrada do Itamaraty para evitar constrangimentos que possam trazer prejuízos ao país. O presidente argentino Alberto Fernández, por exemplo, visitou Putin na semana passada e pisou em uma casca de banana com o vazamento de um áudio da conversa, no momento em que falava mal dos EUA.
Espera-se, portanto, que Jair Bolsonaro se esquive do tema da crise na Ucrânia e trate apenas das questões comerciais e de cooperação bilateral que, diz o Planalto, estão na pauta do encontro com Putin. Ao Brasil cabe evitar qualquer tipo de alinhamento automático e cultivar relações internacionais construtivas, embora nos foros adequados deva defender princípios universais como a autodeterminação dos povos.
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