07 DE FEVEREIRO DE 2022
DAVID COIMBRA
O trabalho embagulha
As pessoas acham que beleza e inteligência são dons de nascença. O sujeito é bonito ou é inteligente, não se transforma em uma coisa ou outra. Um erro. Ou, pelo menos, um erro pela metade. Aquele nenê rechonchudo pode vir ao mundo com extraordinárias qualidades físicas ou intelectuais, mas, se não souber desenvolvê-las, de nada adiantará o bom começo.
Funciona assim para o indivíduo ou para a coletividade. Se o cérebro de um povo não é minimamente exigido, ele vai atrofiando. É óbvio que estou fazendo uma generalização, mas essa é a única maneira que tenho de falar do geral. E o geral, neste caso, é o povo brasileiro.
Tome duas gerações, dos anos 60 para cá. Arrisco a afirmar que o povo brasileiro era mais inteligente e menos bonito. As academias de ginástica, os cuidados com a alimentação e a saúde e até os avanços trabalhistas melhoraram a aparência da população.
Quando falo em avanços trabalhistas, entenda uma verdade dura: o trabalho enobrece, mas embagulha. Um ser humano que acorda às cinco da manhã, passa uma hora e meia dentro de um ônibus, trabalha oito horas, com pausa para o almoço, e depois enfrenta mais hora e meia no ônibus da volta, chega em casa e vai fazer comida para os filhos, esse ser humano não tem tempo de passar creme nos cotovelos.
Há muita gente ainda que vive nessas condições, mas uma grande parcela conseguiu melhorar sua qualidade de vida e agora trabalha menos e se cuida mais.
Porém, ah, porém, intelectualmente o Brasil empobreceu. Isso fica visível se pegarmos a maior expressão cultural do brasileiro, que é a música popular. Cada geração tem a sua estética. Até os anos 40 e 50, impunham-se os vozeirões. Os temas eram dramáticos ou brejeiros. Para os sambas ou marchas de Carnaval, valia a malícia infantil; para o resto do ano, as dores de paixões estraçalhadas.
Nos anos 60 e 70, a sofisticação da Bossa Nova elevou os parâmetros. Primeiro, as melodias se tornaram mais complexas; depois, as letras. Os anos 80 e até parte dos 90 foram o tempo do agradável rock brasileiro. E, no século 21, o que se têm são músicas sertanejas feitas em série nas fabriquetas de Goiânia, ou funks que se dizem transgressores, mas são apenas grosseiros, mais ou menos como os tuítes do finado Olavo.
Quer outra prova da gradual mudança de comportamento do povo brasileiro? O Big Brother. Você não precisa assistir para constatar, basta passar diante da TV algumas vezes e você verá os participantes gritando ou chorando. Cérebro nenhum, eles são só coração.
Ao escrever essas coisas você dirá que estou desprezando o povo brasileiro. Só que... descobri que não é bem assim. Existe algo que grita em defesa do brasileiro. Direi o que é amanhã.
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