terça-feira, 22 de fevereiro de 2022


22 DE FEVEREIRO DE 2022
OPINIÃO DA RBS

LIÇÃO DE DESCASO COM A EDUCAÇÃO

É desalentador constatar que, em um país onde a educação pública tem uma série de deficiências e faltam verbas para inúmeras prioridades, existam quase 10 mil escolas que não saíram do papel ou começaram a ser construídas mas seguem sem receber alunos por obras inacabadas ou paralisadas. Desses projetos, mostrou reportagem de Humberto Trezzi publicada ontem em Zero Hora, mais de 600 estão no Rio Grande do Sul, onde recuperar a qualidade do ensino, o que também demanda infraestrutura adequada, deve ser uma preocupação central de governantes e da sociedade.

As situações mais graves, sem dúvida, referem-se aos casos em que os colégios restam inconclusos, seja por interrupção nos repasses de recursos ou pelo fato de os contratos com as construtoras vencedoras das licitações terem o prazo expirado sem os prédios estarem prontos. São cerca de 3,7 mil escolas nesta situação em todo o país. Muitas, como mostram as imagens desoladoras da reportagem, acabam se deteriorando, tanto pela ação do tempo quanto por furtos e vandalismo. Obras paralisadas e abandonadas, sabe-se, costumam acabar saindo ainda mais caro pela necessidade de ter de refazer uma série de serviços.

Trata-se, em primeiríssimo lugar, de um desperdício inaceitável de dinheiro público. São recursos, nunca é demais ressaltar, que saem dos altos impostos cobrados de cidadãos e empresas. Comprova-se mais uma vez que, no país, o poder público peca nas contrapartidas do recolhimento de tributos - algumas vezes por escolhas de alocações ruins, outras pela incapacidade de empregar bem os recursos, mesmo quando se destinam a objetivos nobres e de interesse da coletividade, como a educação. Por todos os ângulos, o que se vê é uma lição de descaso.

A maior parte do dinheiro para financiar as obras saiu do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), ligado ao Ministério da Educação, com complemento por parte dos municípios. Mas as prefeituras que recebem verbas têm de devolver os recursos à União se a construção ficar pelo caminho. Mesmo que cada projeto tenha a sua particularidade, inclusive a partir de uma reanálise da real demanda da localidade por vagas, muitas terão de ser concluídas para cumprir o seu papel. E os custos adicionais outra vez recairão, ao fim, sobre a sociedade.

A maior parte dos problemas é observada em contratos firmados entre 2011 e 2017, durante os governos Dilma Rousseff e Michel Temer. As interrupções passaram a ser mais frequentes a partir de 2015. A partir de 2020, o governo federal determinou que as obras não iniciadas tivessem contratos cancelados. Neste caso, apesar da justificativa razoável de impedir novos desperdícios, possivelmente crianças seguem sem ter respeitado o seu direito a uma educação satisfatória. Mas a fulanização, neste caso, é o menos importante e serve apenas para alimentar o jogo de empurra. Há situações em que a responsabilidade é atribuída à União, pela interrupção do fluxo de recursos. Em outras, seria do município, que não soube trilhar corretamente os caminhos da burocracia na requisição das verbas. Construtoras com condição financeira frágil são outra fonte de contratempos.

A solução pode estar no Congresso. A Câmara aprovou em outubro projeto de lei sobre repactuação de contratos de obras de escolas e creches paralisadas entre 2009 e o final de 2020. Aguarda-se agora a análise do tema no Senado. A educação tem pressa. 

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