terça-feira, 7 de maio de 2013



07 de maio de 2013 | N° 17425
LUÍS AUGUSTO FISCHER

Por que ruiu o cânone

Voltando ao tema, aponto outras razões para o desabamento do chamado cânone literário, aquele restrito (e na real não muito nítido) repertório de leituras, perpetuado na escola. Duas semanas atrás havia mencionado três motivos: a profissionalização do campo literário, com a pós-graduação; a chegada dos computadores pessoais e da internet, que tornaram muito mais acessível a tarefa de ler e escrever, e ser divulgado; e a megaexpansão do ensino superior no Brasil. Agora vamos a outros três fatores.

1. A fraca formação teórica dos alunos de Letras, que os tornam presas de modas intelectuais, no grande mercado acadêmico, é outro motivo para a pulverização de um cânone restrito: sem sólido debate conceitual, estudantes e professores de Literatura vivem um tanto à mercê das novidades, como área de conhecimento sem espinha dorsal sólida.

Tal situação é desejável, de um lado, porque os livros de ficção e poesia devem mesmo ser lidos por todos e nessa medida devem receber abordagens variadas; por outro, profissionais do estudo de literatura deveriam conhecer mais teoria, de teoria da literatura e das tradições de áreas exigentes conceitualmente (sociologia, história, filosofia, psicanálise, uma ou mais delas).

2. A profissionalização do campo literário universitário desobrigou os cursos de Letras das tarefas de ensino no mundo escolar. Até há pouco, era comum a militância do professor de Língua ou de Literatura no nível médio e no superior, concomitante ou sucessivamente; era comum o mesmo profissional estar na universidade e em instituições fora dela.

Agora, nem mesmo às políticas de ingresso na universidade (o vestibular, agora o Enem) os professores universitários do campo literário dedicam sua atenção. Mais uma força centrífuga, ou uma simples fuga, mesmo.

3. A liberalização dos costumes, nos anos 1970 em diante, ajudou a empurrar o cânone escolar para o abismo. Seu paradigma era ainda parnasiano, nos manuais correntes; sua estrutura era cronológica, trivial e pedante. A ela se soma a força da globalização, concretamente a superdifusão de informações antes restritas a poucos: nunca como agora a literatura em si e os estudos literários no Brasil estiveram tão abertos ao mundo.

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