18 de julho de 2016 | N° 18584
L.F. VERISSIMO
Desperdício
Há uma certa faceirice na convicção de que somos os mais corruptos do mundo. É esta nossa vocação para o amazônico. Queremos ser os maiores até na falta de caráter. Mas toda a história deste lado do mundo, a começar por Colombo, foi feita, de uma maneira ou de outra, por patifes. Os americanos do Norte, por exemplo, têm um jeito de absorver seus patifes sem danos à autoestima nacional. Esperam passar uma geração e os transformam em heróis do empreendimento.
O fdp de hoje é o desbravador de amanhã e a fundação benemérita de depois de amanhã. Nomes como Rockefeller, Morgan, Ford, Vanderbilt, Kennedy etc. conquistaram a respeitabilidade pelo proveito social das fortunas que fizeram ou herdaram, não importa como. Em vez de se entregarem à angústia moral, os americanos apenas se certificam de que a patifaria tenha proveito.
Não existe exemplo maior da relação entre amoralidade empresarial e esperteza de Estado do que o famoso complexo militar-industrial, denunciado por ninguém menos esquerdista do que o presidente Eisenhower no fim do seu governo.
Não deram muita bola para o velho general e o complexo sobreviveu como instituição, garantindo os lucros dos fornecedores do Pentágono e dirigindo a política externa americana. Claro que existem regras de conduta e um mínimo de recato nessa promiscuidade consentida, e frequentemente prendem um fdp mais evidente. Mas a regra universalmente aceita é de que o que é bom para os negócios é bom para os Estados Unidos e para todo o mundo.
O maior escândalo da promiscuidade revelada pela Operação Lava-Jato, no Brasil, além de expor a extensão do capitalismo de compadres praticado por aqui há anos sem que ninguém se importasse muito, é o proveito restrito das nossas negociatas. A velha máxima de que é só deixar os ricos se lambuzarem, que alguma coisa sobrará para os outros, não funciona. Aqui funciona um complexo no modelo americano, com a diferença de que não escorre nada desse pote de melado.
No Brasil modificou-se a frase do Balzac. Por trás de toda grande fortuna, pior do que um crime, existe um desperdício.
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