06 de julho de 2016 | N° 18574
ENTREVISTA
“João me ajudou a buscar o verdadeiro sentido do amor” amor”
ENTREVISTA | OLIVIA BYINGTON - Cantora e autora do livro “O que é que ele tem?”
A cantora Olivia Byington estará na 32ª Feira do Livro de Canoas hoje para falar do amor mais difícil e gratificante de sua vida: seu primeiro filho, João, nascido em 1981. João tem Síndrome de Apert, condição rara gerada por mutação genética que provoca comprometimento intelectual e dificuldades de fala, visão e audição. No livro O que é que ele tem (Objetiva, 184 páginas, R$ 34,90), Olivia detalha a experiência de lidar com os desafios cotidianos da doença. Ela conversa com o público às 19h, no auditório da Praça da Bandeira. Depois, às 20h, seu outro filho, o ator e escritor Gregório Duvivier, também marcará presença no mesmo local. Por e-mail, Olivia concedeu a seguinte entrevista.
Como surgiu a ideia de escrever o livro sobre seu filho?
Sempre que eu contava histórias do João, meu marido (o diretor Daniel Filho) me dizia que deveria compartilhá-las para ajudar outras pessoas. Quando comecei a escrever, tudo veio desordenadamente. Fui fazendo o roteiro do livro como num filme. Tive que pesquisar nos meus arquivos para achar datas, duração das cirurgias, intervalo entre elas. Acabei tendo que lidar com um material que nunca mais tinha tido coragem de mexer. Foi muito tocante. Hoje estou orgulhosa.
O que ser mãe do João lhe ensinou?
A lutar junto com ele pela vida. Foi uma batalha que começou desde o seu nascimento. Eu era muito jovem, tinha 22 anos e não estava preparada para o que vinha pela frente. Precisei de ajuda dos médicos, da família, da análise, das minhas três irmãs. Cresci como uma moça privilegiada da zona sul do Rio de Janeiro e antes não sabia o que era lidar com discriminação e desigualdade de direitos. O João me aproximou de outras lutas. Uma pessoa com deficiência sofre com a sociedade injusta, fútil, que não valoriza as pessoas, e sim o que elas possuem e como são esteticamente. João me ajudou a buscar o verdadeiro sentido do amor.
A senhora conta no livro episódios em que teve dificuldade para encontrar uma escola que aceitasse João como aluno. Dos anos 1980 para cá, crê que algo tenha mudado nesse sentido?
Quando tive dificuldade de arrumar uma escola que o aceitasse não era só por não conhecerem a Síndrome de Apert, mas por não se disporem a ter alguém imperfeito na escola. A maioria dos diretores não queria saber do assunto. Pais não queriam que seus filhos tivessem contato com pessoas com deficiência intelectual, como se isso fosse contagioso. Hoje há a lei da inclusão da pessoa com deficiência assinada por Dilma Rousseff no ano passado. Essa lei beneficia mais de 40 milhões de brasileiros. Ainda estamos longe do ideal, mas muita coisa melhorou: hoje eu não teria a tristeza de sair com o João pela mão de escola em escola levando a porta na cara, como aconteceu no passado. Hoje a lei estaria nos garantindo essa vaga.
O futuro de João a preocupa? Ou melhor, a preocupa mais do que o de seus outros filhos?
Não. Porque temos uma família maravilhosa e ele tem irmãos que o amam. Tenho certeza de que João será cada vez mais independente e quem sabe um dia possa até morar sozinho. Ele sempre nos surpreendeu. O conselho que dou para os pais de crianças com deficiência é que preparem seus filhos para o mundo. Estimulem o convívio social e procurem tratamento especializado. Vivemos hoje um quadro grave com as milhares de crianças com microcefalia. Essas crianças precisam ser cuidadas por todos. Todos têm que ajudar. Começando pelos pais: homens têm mais dificuldade de lidar com o assunto.
carlos.moreira@zerohora.com.br
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