sexta-feira, 1 de julho de 2016


01 de julho de 2016 | N° 18570 
CLÁUDIA LAITANO

Phynos


Com um misto de indignação cívica, voyeurismo e alguma inveja, uma multidão de penetras invadiu nesta semana o casamento dos jovens e belos Felipe e Caroline Amorim, realizado no 300 Cosmo Beach Club, em Jurerê Internacional, em um simbólico 22 de abril – irônica homenagem involuntária à generosa pátria aniversariante que, soube-se depois, estava pagando a festa.

Fotografias e vídeos postados pelos amigos nas redes sociais, durante e depois da festa, revelaram detalhes do vestido da noiva, do buquê, do bolo, da decoração e até do cardápio. Graças aos comentários dos especialistas consultados, descobrimos que a festa se enquadra na categoria “destination wedding”, estilo de celebração muito em voga atualmente, que consiste em levar os convidados para um hotel, de preferência de luxo e localizado em cenário paradisíaco, de modo a reforçar o caráter genuinamente exclusivo da comemoração. 

A providência torna-se necessária em tempos em que qualquer par de remediados é capaz de promover casamento com pista de dança, ilhas de iguarias e cascatas de astromélias – mesmo que isso implique ficar enforcado no crediário até depois do divórcio.

Não foi esse, obviamente, o caso de Felipe e Caroline – ainda casados até o fechamento desta edição. Serviços como bufê, iluminação e a decoração da festa foram faturados em nome de projetos culturais fictícios, parte do esquema criminoso revelado pela Operação Boca-Livre, que colocou atrás das grades, entre outros bandidos de muita lábia e pouca alma, o empresário Antonio Carlos Bellini – não por acaso, pai de Felipe.

Somos obrigados a admitir que Caroline e Felipe tiveram bom gosto em quase todos os itens selecionados para ornar a balada de luxo patrocinada por dinheiro público desviado. O único (e revelador) deslize de vulgaridade (além, claro, do sempre deselegante gesto de meter a mão no bolso alheio) reside justamente no item da festa que tem alguma relação com produção cultural: a atração musical.

O sertanejo Leo Rodriguez, conhecido por sucessos como Bará bará, berê berê (“Foi lá na balada / Que eu conheci você / Depois bará bará berê / berê berê berê”) e Gordinho da Saveiro, foi o escolhido para receber os cerca de R$ 50 mil de cachê pagos com recursos da Lei Rouanet originalmente captados para o projeto Caminhos sinfônicos, que promoveria concertos gratuitos que nunca aconteceram.

Verdade seja dita: os nubentes não se preocuparam em ostentar uma cultura que não têm. Para animar a festa, optaram por um típico produto da fábrica de hits anódinos e previsíveis que nos últimos anos tem abastecido rádios, TVs, casas noturnas e o imaginário de um público, de todas as classes sociais, tão subnutrido de repertório cultural, que consome apenas o que é mais fácil e não entende para que servem as leis de incentivo – mecanismo que, entre outras coisas, torna possível que o trabalho de artistas que fogem ao gosto dominante do mercado sobreviva em um cenário tão adverso. 

Com dinheiro roubado para gastar no que o coração mandasse, Felipe e Caroline preferiram servir no seu “destination wedding” uma sobremesa musical tão sofisticada quanto flan de caramelo de caixinha. Significa.

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