sábado, 1 de março de 2014


01 de março de 2014 | N° 17719
NÍLSON SOUZA

O repórter na arca

Li que Russel Crowe, o ator oscarizado de Gladiador, está fazendo campanha nas redes sociais para convencer o papa Francisco a assistir ao seu próximo filme, Noé – longa-metragem sobre um dos mais instigantes episódios bíblicos, o relato da arca de Noé.

A história do único homem justo num mundo convulsionado pela perversidade, escolhido por Deus para perpetuar a espécie depois da destruição da humanidade pelas águas, impressiona tanto, que foi contada e recontada nos registros fundamentais de várias religiões. Claro que cada narrador acrescentou o seu ponto: em alguns casos Noé leva só a sua família com a bicharada, em outros leva vários discípulos; uns dizem que choveu durante 40 dias e 40 noites, outros que o dilúvio universal durou meses. Também os bichos ganham as mais diversas simbologias, terminando com o corvo velhaco e a pomba fiel nas suas missões em busca de terra firme.

À luz da razão, é um relato inverossímil. Como acreditar que com a tecnologia da época alguém fosse capaz de construir um cargueiro capaz de flutuar vários dias com um zoológico inteiro a bordo? Ainda assim, cientistas procuram até hoje os restos do barco nas montanhas da Turquia. Para os crentes, porém, tudo faz sentido. Há explicações até para coisas aparentemente absurdas e para questionamentos éticos, como o fato de Noé, sendo tão virtuoso, não ter alertado a vizinhança sobre o aguaceiro iminente.

Respeito todas as visões. Mas, na condição de enviado especial para a cobertura da inusitada viagem, que acabo de assumir nesta crônica, prefiro acreditar que se trata de um mito cheio de ensinamentos reais para todos nós, mesmo nestes tempos em que navegamos apenas em águas virtuais. A propósito, não estamos vivendo um dilúvio universal de tecnologia? Será o Zuckerberg o novo Noé?

Desculpem a digressão. Volto ao filme.

Está programado para estrear em março nos Estados Unidos e em abril por aqui, mas já tive a curiosidade de olhar o trailer e me chamou a atenção uma pergunta da mulher de Noé, ao ver o bicharedo embarcando:

– As cobras também?

Gosto de uma interpretação que diz que os animais embarcados representam as paixões e os sentimentos humanos. As escrituras também contam que a mulher foi enganada pela serpente no paraíso e ambas foram condenadas a se odiar pela maldição divina. É tema para outro debate, mas a verdade é que as mulheres, sempre considerando a maioria, detestam cobras. Não sei se a recíproca é verdadeira. De qualquer maneira, a cena retrata bem esta situação. Noé, porém, autoriza o embarque.


Estou louco para ver no que deu. Será que o Papa também não está?

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