18
de março de 2014 | N° 17736
LUIZ
PAULO VASCONCELLOS
90 anos de surrealismo
Em 1924,
há 90 anos, portanto, André Breton lançou em Paris o primeiro Manifesto
Surrealista, dando cara ao movimento que alicerçou definitivamente o papel do
inconsciente no processo de criação artística. Influenciado principalmente
pelas descobertas Freudianas, os surrealistas procuravam entender, entre outras
coisas, por que todo o racionalismo do século 19 tinha resultado numa Guerra
Mundial.
As
características do surrealismo são uma combinação do mundo real com o irreal,
do consciente com o inconsciente, quando valores como pátria, família, política
e religião são desprezados e substituídos por humor, sonho, imaginação e
alucinação.
Uma
das principais bandeiras do movimento foi uma frase atribuída a Tristan Tzara,
um dos líderes do dadaísmo, o movimento que antecedeu e de certa forma gerou o
surrealismo. A frase é: “O pensamento nasce na boca”. Ou seja, raciocinar para
quê? Ser lógico, coerente, dialético, favorecer as leis do intelecto como princípios
do pensamento? Para quê? Para ter que se alistar para lutar na I Guerra
Mundial? Ou ter que se preparar para enfrentar o nazismo e o fascismo, o
comunismo e o capitalismo? Afinal, essas foram as mais profundas consequências
do racionalismo como fonte de todo o conhecimento.
O
surrealismo, nesse sentido, é mais que um movimento estético, é uma maneira de
ver o mundo. Uma vanguarda que vai muito além da arte, valorizando a imaginação
e reduzindo os opostos “sonho” e “realidade” a “uma espécie de realidade
absoluta, de sobre-realidade”, no dizer de Breton.
Essa
crítica à racionalidade burguesa em favor do sonho e do fantástico reuniu
grandes artistas tanto das artes plásticas (René Magritte, Joan Miró, Max
Ernst, Salvador Dalí, Pablo Picasso) como da literatura (Georges Bataille,
Louis Aragon, Max Jacob), do teatro (Guillaume Apollinaire, Antonin Artaud, Jacques
Prévert) e do cinema (Luis Buñuel). Os temas nas obras desses artistas se
repetem: erotismo, mutilação, violência, loucura e o universo dos bonecos e das
máquinas.
A
escrita e a pintura automáticas são possibilidades de revelação do
inconsciente, seja esfregando o lápis ou o pincel sobre alguma superfície áspera
até “provocar” alguma imagem, seja escrevendo uma palavra depois da outra sem
que a seguinte esteja conectada com a anterior. Ou, ainda, exercitando a
escrita coletiva quando alguém escreve algumas palavras num papel, outra pessoa
completa a frase, passa adiante e assim o texto é completado sem
necessariamente objetivar-se uma lógica consciente. Mais ou menos como hoje,
quando partidos políticos sustentam baderneiros e governos exploram médicos
cubanos. Surrealismo é isso.
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