27
de março de 2014 | N° 17745
PAULO SANT’ANA
Falando com os animais
Esses
dias, imaginei numa coluna como seria bom que os animais falassem e nós pudéssemos
entender suas palavras.
Quando
nos acercássemos de um boi, certamente ele diria para nós: “Já sei, estás
olhando para mim e calculando como seria gostoso o meu filé. Na chapa? Frito?”.
E se
nos aproximássemos de um porco ele nos diria: “Certamente estás a calcular como
seria delicioso o meu pernil colocado entre duas fatias de pão”.
Da
mesma forma, imagino que o cacarejo das galinhas, quando me aproximo do
galinheiro, se refere ao fato de que em breve nós destroncaremos seus pescoços
e as serviremos em nossas mesas com diversos nomes nos seus pratos.
O
galo, quando nos aproximamos dele, deveria dizer: “Pelo amor de Deus, não vai
torcer o meu pescoço e depois dizer na mesa que está saboreando uma galinha: pelo
menos tenho o direito de no jantar ser chamado de galo, um ‘galo à milanesa’ por
certo será um cardápio honroso para mim”.
Será
que os bois calculam que um dia virarão churrasco? E os pintinhos criados têm a
certeza de que não viverão mais do que o tempo dos galetos?
Se
um pinto pudesse decidir, ele preferiria ser comido como galeto ou ter tido o
direito de viver mais uns dois anos e ser comido como frango à caçarola?
Os
gatos e os cachorros são animais felizes, só agora vejo. Os homens os criam não
para devorá-los, mas para que mantenham com eles um convívio fraterno que só terminará
pela morte natural.
Já com
o peru, o homem não convive assim. O homem passa meses convivendo com o peru e
tentando imaginar o melhor modo de assá-lo no forno.
Não
tem explicação que eu ame o cachorro e devore uma galinha. Ambos são animais e
filhos de Deus, por que os trato de maneira radicalmente diferente? O certo é que
eu os respeitasse como filhos de Deus e não os comesse, eu deveria ser só um vegetariano.
Se
os gatos têm alma e são capazes de cultivar grande afeição conosco, quem me diz
que a galinha não tem alma e, se não for criada para ser alimento do homem,
passaria só aí a ter amizade conosco também? As galinhas me parecem também que
têm alma, assim como os cães.
Os
passarinhos, por exemplo, compõem a paisagem humana. Só os canalhas podem matar
passarinhos e fazer sopa deles.
Eu,
por exemplo, no que se refere ao papagaio, jamais teria capacidade para comê-lo,
assando-o antes num espeto: estás louco, eu comer um papagaio, um ser que
falava comigo no seu poleiro?
Comer
um papagaio é igual a comer na panela um cachorro que teve cenas de agradável e
longa convivência conosco.
Eu não
teria coragem de ser tão cruel assim.
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