16 de março de 2014 | N°
17734
O CÓDIGO DAVID | DAVID
COIMBRA
O melhor de todos os nomes de
mulher
Gosto de nomes de mulheres com
vogais explosivas. Débora. Bárbara. Mulheres proparoxítonas. São nomes bons
para personagens.
“Naquela noite, Débora espetou um
olhar oblíquo e acastanhado no fundo dos meus olhos assustados, e ronronou:
– Hoje é o seu dia de sorte,
garoto.”
Ainda escrevo uma história assim.
A Rainha do IAPI chamava-se
Débora. Era um pouco mais velha do que nós, era linda, era soberana como toda
rainha deve ser e nunca, jamais, em tempo algum nos deu a menor bola murcha, no
que estava absolutamente certa – Débora, para qualquer um de nós, seria como o
INSS: inadministrável.
Imagino que Débora, hoje, deva
estar vivendo em Montecarlo, casada com algum empresário alemão riquíssimo. Ou
com algum Prêmio Nobel de qualquer coisa. Não, não, Débora não aceitaria menos
do que um Prêmio Nobel. Se hoje Débora for uma funcionária, se assinar
livro-ponto, se for casada com um socialista, se receber salário, se não
estiver pelo menos a palmo e meio dos píncaros da glória, por favor, não me
contem. Não azedem o meu doce passado.
Isso de nomes. Os romanos em
geral tinham três: o prenome, o nome e o cognome. Marco Túlio Cícero. Durante a
República havia só 18 prenomes, por isso eles usavam o cognome para se diferenciar.
Podiam acoplar quantos cognomes quisessem, uns sobre os outros, inclusive
repetindo-os.
Descobri, num livro, um cônsul
romano do II século a.C. que se denominava Quinto Pompeu Senecio Róscio Murena
Coelho Sexto Júlio Frontino Sílio Deciano Caio Júlio Êuricles Herculano Lúcio
Vibúlio Pio Augustano Alpino Bélico Solers Júlio Aper Ducênio Próculo Rutiliano
Rufino Sílio Valens Valério Níger Cláudio Fusco Saxa Amintiano Sósio Prisco,
mas todo mundo o chamava de Zé.
O nome original de Roma era Sete
Montes. Em cerimônias religiosas herméticas, mas muito herméticas, os
sacerdotes se referiam à cidade pelo seu palíndromo: Amor.
Uma vez um tribuno revelou esse
segredo e foi crucificado. Os homens do WikiLeaks se dariam mal, se fossem
romanos.
Nomes de mulheres são mais
bonitos do que os de homens. Admiro o Olívio Dutra, que teve a coragem de
colocar no filho o nome do libertador dos escravos da Roma republicana:
Espártaco. Nome forte e raro.
Aliás, o general que finalmente
derrotou Espártaco, Crasso, teve seu nome eternizado não por essa vitória, mas
por uma derrota. Ele errou ao atacar os terríveis partos, teve suas legiões
dizimadas, foi morto e, desde então, um erro grave é chamado de “erro crasso”.
Benfeito.
Gosto do libertador Espártaco e
gosto também de outro libertador, Emiliano Zapata. Quase pus no meu filho o
nome de Emiliano. Se tiver outro, quem sabe?
Mas preferia dar nome a uma
menina. Tão lindos os nomes de meninas, tão sonoros.
Bruna é morena; Yasmin é uma
flor; Vanessa, uma borboleta; e Melissa, abelhinha. Bianca, simplesmente, é
branca, Sofia é o nome da sabedoria, Beatriz faz feliz, enquanto Márcia faz a
guerra e Laura, por fim, é a vitoriosa.
Catarina. Sempre quis chamar
minha filha de Catarina, hoje não tenho mais tanta certeza. Catarina é casta.
Catarinas foram grandes rainhas. Catarina de Médici era florentina e ensinou a
sofisticação a Paris. Catarina, a Grande, era alemã, reinou sobre todas as
Rússias e, de casta, nada tinha – precisava repoltrear-se, espadanar-se e
refocilar-se no pecado carnal pelo menos seis vezes ao dia, ou seu corpo
imperial não se saciava.
Virgínia, obviamente, é virgem,
mas me parece cínico, nos dias de hoje. Valéria é cheia de saúde, mas era o
nome de Valéria Messalina, que, além de saúde, tinha muita disposição, a ponto
de se tornar sinônimo de luxúria.
Cleópatra é a glória do pai, mas
estaria depositando muita responsabilidade nos ombrinhos da menina. Meu amigo
Zé Pedro Goulart deu à filha o nome da cidade luz, Paris. Bonito. Bonito. E,
agora, pensando no Zé Pedro e em sua bela filhinha, concluo que o nome da maior
cidade da civilização talvez seja o mais perfeito nome de mulher: Roma, a
cidade eterna, pode bem ser uma mulher, qualquer mulher, que, em segredo,
chama-se Amor.
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