16 de março de 2014 | N°
17734
PAULO SANT’ANA
Os corvos crocitam
Não lhes parece estranho que os
sapos coaxem? Ou lhes parece então muito mais estranho que os carneiros balem?
É que a língua portuguesa
classificou tim-tim por tim-tim todos os sons emitidos pelas gargantas dos
animais.
O termo mais excêntrico entre
todos os animais é sem dúvida o dos urubus: eles crocitam? Ora bolas, crocitam.
Como diz o poeta Augusto dos
Anjos, “um urubu pousou na minha sorte”.
E eu respondo que é verdade e que
todas as noites ouço o urubu, pousado no meu ombro e crocitando.
Sendo assim, a cobra sibila e a
galinha cacareja. O porco grunhe e o pássaro chilreia.
O lobo uiva na encosta da
montanha enquanto o leão ruge. O ganso e o pato grasnam.
Já a nossa divina e bíblica pomba
nada mais faz do que arrulhar, mais adiante o cabrito berra e o macaco guincha.
O inseto zumbe e gato mia, o cão
late.
Já a hiena, esse bicho horrível e
maldito, ulula.
O tigre, pensei que igual ao leão
rugia, mas não, o tigre ronca. E eu que pensei que só quem roncava era o homem.
A abelha zumbe. O grilo
simplesmente canta. Já o burro zurra. Que bonito, durmo em minha casa enquanto
lá fora os burros zurram.
Eu não sabia que um burro que
fala todos os dias num programa de debates radiofônicos zurrava, vejam só.
O papagaio palra. Deve ser por
isso que se criou, para os homens que gostam de conversar, que eles palram.
Mas o mais pitoresco e esdrúxulo
de todos os cantares animais é o do peru: ele gruguleja. Ficou
onomatopaicamente impecável o título do som do peru, é bem como ele faz.
E uma mulher que vive xingando
muito o marido dá direito a ele de dizer que nunca viu uma mulher grasnar
tanto, que mulher que crocita, essa, o diabo dessa mulher não para de guinchar.
Já a mulher pode se queixar de
seu marido dizendo que ele vive rugindo, não cessa de mugir e de uivar.
Já o Pavarotti, o nosso grande
tenor (barítono é que ele não era), ficou sublime ao simplesmente cantar. Era
famosíssimo o agudo do Pavarotti, era daqueles agudos que quando pronunciados
chegavam a quebrar os copos de cristal.
Interessante que tanto os homens
quanto os animais usam a fonética para exprimirem-se.
Nós é que não conseguimos
decifrar a linguagem dos animais. É uma pena, se soubéssemos o que querem dizer
quando emitem seus sons, os compreenderíamos muito melhor.
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