29
de março de 2014 | N° 1774
EDITORIAIS
ZH
Visão
preocupante
São
chocantes as conclusões de estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(Ipea) revelando que os brasileiros ainda mantêm uma visão retrógrada e
machista em relação ao papel da mulher na sociedade. Nada menos do que 65% das
3.810 pessoas de ambos os sexos entrevistadas em 212 municípios disseram
concordar com a afirmação de que mulheres que usam roupas que mostram o corpo
merecem ser atacadas.
A
conclusão, somada a outras igualmente inconcebíveis como a de que 58,5%
justificam estupros pelo comportamento das mulheres , demonstra o quanto o país
ainda precisa evoluir na área social, para assegurar mais igualdade de gênero,
com efetivo respeito mútuo. Os avanços dependem de campanhas institucionais
eficientes e de caráter permanente, além de uma aposta firme na área
educacional.
Um
dos aspectos promissores do levantamento é o de revelar que, embora a visão dos
brasileiros seja marcada, de maneira geral, pela ambiguidade, é nas faixas de
menor nível educacional que a intolerância costuma ser maior. Ainda assim, e
embora essa realidade seja reproduzida de forma massificada e até mesmo
celebrada em manifestações culturais como músicas e danças, são perturbadoras
as conclusões do estudo, agora respaldadas em números.
O
que fica evidente é uma cultura marcada pela superioridade masculina, reforçada
pela tendência à desqualificação do sexo feminino. Enquanto se mantiver preso a
preconceitos e a concepções socioculturais deturpadas, o país não conseguirá
resolver algumas de suas mazelas mais perturbadoras, a começar pela violência.
Conscientes
do problema escancarado pelo levantamento, a sociedade e o poder público já vêm
promovendo avanços de ordem legal que hoje estão na vanguarda da assistência a
pessoas mais vulneráveis, como crianças, adolescentes, idosos e mulheres. Ainda
assim, essa rede de proteção se choca com concepções pessoais largamente
majoritárias, apesar de equivocadas.
Uma
delas é a de que, embora a violência física contra a mulher seja rechaçada e
punida, uma imensa maioria ainda acredita que “em briga de marido e mulher, não
se mete a colher”. E mais: que “roupa suja se lava em casa”. Esse olhar
deformado para o problema ajuda a explicar tantos casos de violência doméstica
e sexual, entre os quais o estupro, em grande parte cometidos, tolerados e
acobertados no âmbito familiar.
Diante
dos resultados, a presidente Dilma Rousseff advertiu ontem que “governo e
sociedade devem trabalhar juntos para atacar a violência, dentro e fora dos
lares”. O Brasil só será um país mais justo quando seus cidadãos conseguirem
encarar-se uns aos outros com mais respeito, acima de quaisquer diferenças, o
que depende sobretudo de um consistente avanço educacional e cultural.
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