sexta-feira, 10 de julho de 2020



10 DE JULHO DE 2020
DAVID COIMBRA

Lula revela um fato que mudaria a história do Brasil

Lula, quando fala, só diz o que quer. Sempre foi assim, sempre será, não seria diferente na entrevista que concedeu ao Timeline ontem. Mas, depois de quase uma hora de conversa, já no fim do programa, ele contou uma novidade, algo que eu nunca tinha ouvido antes.

Deu-se em 1989, depois do primeiro turno. Lula foi ao apartamento de Brizola, em Copacabana, a fim de pedir-lhe o apoio para a disputa do segundo turno. Durante duas horas de reunião, Brizola tentou convencê-lo de que houvera um empate técnico entre eles e fez uma proposta inesperada e inusual: que Lula renunciasse à sua candidatura e que ambos, Lula e Brizola, lançassem o nome de Mário Covas para enfrentar Collor.

Lula, é claro, não aceitou, foi para o segundo turno e Collor acabou eleito. A partir daí, todos sabemos o que aconteceu.

Terminado o programa, continuamos conversando por vídeo. Disse para Lula, e repito agora, que a ideia de Brizola foi ótima. Porque a chance de Covas bater Collor era muito maior do que a de Lula e a do próprio Brizola. Covas era mais palatável à direita resignada que votou em Collor, mesmo achando-o um tipo esquisito, e era naturalmente aceito pela esquerda, que votou em Lula.

A ideia de Brizola era evitar Collor a qualquer custo. Uma espécie de "Elle não". Tudo seria diferente, se Lula tivesse aceitado. Mas não aceitou e, bem, foi o que foi.

Já entrevistamos outros ex-presidentes, a ideia é ouvir todos, e todos que têm falado estendem-se um pouco mais conosco fora do ar. Com Lula ocorreu o mesmo. Nessa conversa, ele fez outra revelação interessante: vai dedicar o que lhe resta da vida para, nas suas palavras, "desmascarar" Moro e Dallagnol.

Ficou notório que não há nada mais importante para Lula neste momento. Ele está focado, decidido, quase que obcecado. Traçou uma estratégia e não se desviará dela. Contratou advogados e ataca em duas frentes: uma interna, nacional, e outra internacional.

Sendo Lula quem é, conhecido em toda parte e em toda parte bem relacionado, prevejo que Moro e Dallagnol não terão descanso. Lula foi à ONU, falou com intelectuais de todo o mundo, falou até com o Papa! O que vai render de resultados práticos toda essa movimentação, isso não sei, mas sei que Moro e Dallagnol vão se incomodar.

Durante a entrevista, lembrei da primeira vez que falei com Lula. Foi no salão paroquial da Igreja São José, na Praça Nereu Ramos, centro de Criciúma. Estávamos nos anos 1980, acho que em 1986. Eu trabalhava no Diário Catarinense. Lula não era candidato a presidente, era "só" o mais famoso líder sindical do Brasil. Éramos poucos repórteres, uns dois ou três. Puxamos cadeiras e sentamos numa pequena roda. Nossas vozes ecoavam no salão vazio.

Não lembro das ideias que Lula expressou na entrevista, não lembro de muita coisa, mas lembro de sua vivacidade. Os olhos de Lula faiscavam quando ele falava. E, como ainda hoje, ele falava apenas o que queria.

Depois de quase 40 anos, Lula cumpriu uma trajetória que, tenho certeza, nem imaginava que poderia cumprir. Acertou muito e errou muito também, embora isso ele tenha certa dificuldade em admitir. Transformou-se em outro homem. Hoje, é amado e odiado por muitos - uma coisa ou outra. A ele ninguém é indiferente. Mas a vivacidade ainda está lá. Mesmo por vídeo, pude perceber aquela velha luz em seu olhar. O que me faz concluir: não sei o que Lula ainda é capaz de fazer. Mas ele vai fazer.

DAVID COIMBRA

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