31 DE JULHO DE 2020
ARTIGOS
Novos espartanos
É cediço que os direitos sociais previstos na Constituição Federal são alegóricos. Escola, lar, família são artigos de luxo. No Brasil, algumas crianças com idade entre sete e 12 anos possuem armamento de dar inveja em muitos policiais. Tais crianças são fruto de seu meio, como todos nós.
Assim como em Esparta, a alfabetização não é o essencial, tornando a estagnação intelectual inevitável. Assim como em Esparta, a criança cresce aceitando que tirar a vida de outra pessoa é permitido pelas regras do jogo. É uma falsa sensação de empoderamento manusear armas. Os jovens buscam ascensão social em seu mundo apartado. Muitos morrem precocemente, sem jamais ter o que sonharam.
Entretanto, definir o fracasso dessas crianças como falta de força de vontade é reforçar a crueldade sobre elas. Mas deixá-las cometer atos equiparados a infrações penais é reforçar a crueldade sobre todos os outros. As crianças entram para o tráfico visando à inserção numa sociedade de consumo, para comprar bens materiais e até para conquistar as moças mais bonitas de sua comunidade. Contudo, não é razoável que esse problema transcenda o universo das primeiras vítimas para fazer mais vítimas.
Enquanto o problema não é tratado na gênese, certas categorias são instadas a contornar o problema. Falo das polícias. Isto porque qualquer passado, por pior que seja, não retira a tipificação penal da ação. O direito penal não é do indivíduo, é sobre a análise dos fatos. Há poucos anos, o Datafolha realizou uma pesquisa em que 87% dos entrevistados afirmaram ser a favor da redução da maioridade penal. Entretanto, a vontade do povo, que compõe o significado de democracia, não é observada.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é talvez o instrumento legislativo mais falho na seara penal. Prevê punição máxima de três anos de internação para os infratores, não importando a hediondez do crime. Seriam tais infratores dotados de incapacidade de compreender seus atos? São jovens com esse perfil que o código penal visou proteger? Para onde essa superproteção nos trouxe ou, ainda, para onde nos levará?
ANA LUIZA CARUSO, DELEGADA, 2ª VICE-PRESIDENTE ADMINISTRATIVA DA ASSOCIAÇÃO DOS DELEGADOS DE POLÍCIA DO RS (ASDEP/RS)
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