terça-feira, 14 de julho de 2020


14 DE JULHO DE 2020
NÍLSON SOUZA

O diálogo e a vara de marmelo


O quarto ministro da Educação do atual governo estreou com um discurso promissor de diálogo, que é um pressuposto da democracia e da própria atividade educacional. Logo em seguida, a Polícia do Pensamento da era digital descobriu um vídeo de 2016 em que o teólogo defende castigo físico para crianças. Na gravação intitulada A Vara da Disciplina, o pastor diz claramente às famílias presentes no templo que a dor física é indispensável para manter os pequenos no bom caminho.

É um tema incandescente, que certamente vai dividir mais um pouco este país sofrido e magoado. Então, já vou assumindo o meu lado. Sou do tempo da vara de marmelo. As crianças da minha geração, com raras exceções, levavam palmadas, chineladas, cintadas e até, em casos mais violentos, rebencadas. Era assim, e ninguém questionava muito se era certo ou errado.

Pois eu, que às vezes escondia o chinelo de minha mãe na ingênua suposição de que escaparia do castigo, achava e continuo achando que era muito errado. Bater não educa. Bater prejudica a autoestima. Bater - hoje a ciência e a legislação reconhecem isso - afeta o desenvolvimento do cérebro infantil, perpetua o comportamento que deveria ser corrigido e, o pior de tudo, ensina aos pequenos que conflitos podem ser resolvidos com violência.

Imagino que os defensores do tapinha logo me perguntarão se fiquei com todas essas sequelas. Acredito que não. Minha nonagenária mãe, felizmente, sempre soube compensar com carinho aqueles momentos de altercação com os filhos. Outro dia, inclusive, presenteei-a com um par de chinelos e brinquei:

- Nunca pensei que ainda lhe daria um presente desses!

É evidente que existe diferença entre tapinha e espancamento, mas qualquer castigo físico, independentemente da dosagem, é sempre o contrário de diálogo. Todos sabemos o quanto exige de paciência um comportamento infantil inadequado. Quando se observa uma criança teimando ou tomando alguma atitude inconveniente, fica difícil de condenar a palmada ou o puxão de orelha.

Mas, quando um adulto nos contraria, o que fazemos? Fico com o segundo discurso do ministro e torço muito para que ele o coloque em prática.

NÍLSON SOUZA

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