15 DE JULHO DE 2020
DAVID COIMBRA
Você conhece alguém desta foto?
Fiz a descoberta logo depois da minha live com o professor Sergius Gonzaga. Fiquei encantado, parecia coisa de literatura, não de vida real. Essa live aconteceu na segunda-feira. O professor me convocou a responder à seguinte questão:
"Quais são os livros da sua vida?".
Nos dias anteriores, me pus a ruminar sobre a pergunta. Precisava dizer que livros haviam influenciado decisivamente a minha vida. Isso me afligiu, isso do "decisivamente". Porque, puxa, queria poder afirmar que houve uma obra que me transformou, que tive uma epifania ao ler Dostoievski ou Proust, era um antes e me tornei outro depois, mas não passei por essa experiência mágica. Uma frustração. Talvez haja algo errado comigo.
Mas fizemos a live, está lá, imortalizada no Facebook do professor. Reuni um punhado de livros de autores de que gosto muito, falei deles, tudo bem. E, se você tiver a paciência de assistir, verá que, em certo momento, levanto da cadeira para buscar um volume ao qual me referia. Não é um livro importante, é uma curiosidade: As Raças Humanas, de Louis Figuier, publicado em 1871. Até pelo título, tal livro seria inviável hoje em dia. Guardo-o mais como uma relíquia, uma peça de museu. Essa minha edição, de 150 anos de idade, está encadernada em couro. Por isso, confundi o livro de Figuier com outro, também antigo e também encadernado. Foi esse outro que trouxe e mostrei para o professor. Era uma edição de 1956 de A Borboleta Amarela, clássico do grande, do insuperável Rubem Braga.
Tenho vários livros do velho Braga, talvez todos, e é possível que não haja uma só crônica dele que eu não tenha lido. Mas essa edição, especificamente, não sei como me caiu nas mãos. Não sei se comprei ou se ganhei, mas sei que ainda não tinha aberto até a página 101, onde começa a crônica do sino de ouro.
Como sei que não havia aberto até a página 101? Ah! É porque foi exatamente ali que achei uma foto antiga, desbotada e em preto e branco. Foi a descoberta que me encantou, porque parece algo que Rubem Braga contaria em uma crônica.
A foto é pequena, do tamanho de uma caixa de fósforos. A imagem mostra cinco amigos à beira de um lago ou de um rio, sentados na grama em meio círculo. São duas moças e três homens. A moça do meio usa coque e óculos escuros e sorri para a câmera. À sua esquerda, com camisa volta ao mundo e um ar enfarado, um rapaz também fita o fotógrafo. Mas, à sua direita, outro homem envia, detrás de óculos escuros, um olhar grave para a segunda moça, uma morena de vestido branco e tranças, que está atirando um sorriso meigo para o terceiro homem. Este, igualmente de camisa volta ao mundo, sorri de volta para ela. Nota-se que estão enlevados. É o amor, diriam Zezé Di Camargo e Luciano.
O que destoa na foto é o homem do meio, aquele que encara seriamente a menina de tranças. Fiquei imaginando que ele também a ama, e que está enciumado pela troca de olhares cálidos que está havendo entre ela e o outro rapaz. Há uma tensão na postura dele. Há sentimento envolvido na cena. O que terá acontecido com eles? Quem casou com quem? O amor se realizou? Ou cada um foi para um lado diferente?
Há uma assinatura nas primeiras páginas do livro, mas é ilegível. Só consigo identificar "P. A. agôsto 960". Ou seja: Porto Alegre, agosto de 1960. Uma foto de 60 anos de idade. Seus personagens terão 80, talvez mais. Preciso descobrir o que houve com eles. Será que você conhece alguém dessa foto?
DAVID COIMBRA
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