13 DE JULHO DE 2020
DAVID COIMBRA
Governador enfrenta o dilema da evolução
Até agora, já recebi de quatro pessoas diferentes o mesmo vídeo da lojista Carmen Flores fazendo um compassivo pedido de socorro a Jair Bolsonaro. É um depoimento de três minutos de duração em que ela fala com a voz embargada, passando a impressão de que está prestes a se desmanchar em lágrimas.
Carmen conta que tinha 22 lojas e que 21 delas foram fechadas em definitivo, por causa das restrições ao funcionamento do comércio impostas pelo combate ao coronavírus. Reclama que ela e 99% dos pequenos e médios empresários não conseguirão acesso aos financiamentos do governo federal, porque estão endividados. Implora para que o presidente faça alguma coisa.
O presidente pode, de fato, fazer alguma coisa. Essas linhas de crédito deveriam ser facilitadas, como o foram em países da Europa e nos Estados Unidos. É nesses episódios que o Estado se faz mais necessário.
Mas nada substitui a possibilidade de a empresa se virar por conta própria, liberada para funcionar, vender e fazer a economia girar. É assim que serão resolvidos os problemas dos empresários, dos 20 milhões de desempregados do país e de outros tantos que estão na iminência de perder seus empregos.
Só que essa saída aparentemente óbvia é cheia de nuances e complexidades. Eu não queria ser o governador do Estado neste momento. Porque ele tem diante de si um impasse quase que sem solução.
Olhe para o mapa da peste: a doença, como uma nuvem de gafanhotos, está migrando para o Sul. Tem sido assim nos Estados Unidos, onde Nova York e a Nova Inglaterra já retornam a certa normalidade da vida e os Estados vizinhos ao México se surpreendem com o recrudescimento do ataque do vírus.
No Brasil, a situação é semelhante, como se o corona não fosse um microrganismo sem vontade, e sim um exército coordenado por uma instância superior. Porque também no Brasil a doença como que deixa apenas patrulhas onde já empreendeu conquista, a fim de se estender para novos territórios. Assim, os golpeados, hoje, são os Estados do Sul, justo no período mais sensível do inverno.
Em tese, deveria ser agora, e não antes, que os maiores cuidados tinham de ser tomados. Só que já faz quatro meses que a sociedade se sacrifica. Não há mais força, paciência e recursos para suportar novas imposições.
As pessoas não aguentam mais. O governador se verá obrigado a instituir formas mais flexíveis de contenção. Mas, ao mesmo tempo, nem isso adiantará. Porque não basta reabrir o comércio; as pessoas precisam ir às compras, e as pessoas estão com medo da doença e com medo de gastar. Elas pouco sairão às ruas e, quando saírem, o consumo se dará com moderação.
Darwin ensinou que, na natureza, os seres que sobrevivem e vencem não são os mais fortes; são os que têm maior poder de adaptação. É disso que dependerá o governador, nos próximos dias. Ele terá de criar regras que ajudem a sociedade a se adaptar à convivência com o vírus. Ele próprio terá de se adaptar às exigências do sistema de saúde e da economia. Não será fácil nem simples. Não são fáceis nem simples as tarefas da evolução.
DAVID COIMBRA
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