06
de novembro de 2012 | N° 17245
LUÍS
AUGUSTO FISCHER
Modernistas vencedores
Se o
prezado leitor me acompanha de outras jornadas, deve já estar aborrecido de
tanto me ouvir reclamar do que me parece ser uma supervalorização do modernismo
paulista. E de fato acho isso, há muito tempo: por motivos perfeitamente
conhecidos e narráveis, mas extensos demais para um texto como este aqui, a
ideologia modernista expressa na famosa Semana de Arte Moderna de 1922, em São
Paulo, veio a ganhar ares de verdade absoluta, com o tempo.
O
tempo que se chama criação da USP e a subsequente revisão da história da
literatura e da cultura brasileiras, que fez o serviço de colocar no relato
desse processo, como centro absoluto, como revelação de sentido, a ação dos
ditos modernistas, em particular Mário de Andrade (Oswald continua a ser visto
como desviante).
Já escrevi
muito sobre isso, e continuo nessa bronca, sempre dizendo que liminarmente não
tenho nada contra paulistas ou a favor de cariocas, gente tão boa ou tão ruim
quanto qualquer outra. Meu tema é uma discussão sobre como vemos, sentimos,
vivemos nosso passado e, por isso mesmo, como lidamos com nosso presente e
nosso futuro. Nosso de quem, o senhor quer saber? Nosso de brasileiros, ou de
usuários do português falado no Brasil.
Esses
dias fui finalmente ler um pensador francês que, nada tendo a ver com os
paulistas, me ajudou a entender um pouco mais a coisa. O livro é Jamais Fomos
Modernos, e seu autor é Bruno Latour (editora 34), saído pela primeira vez no
distante ano de 1991, que eu desconhecia.
Diz
ele que sempre que usamos palavras como moderno, modernização, modernidade e, acrescento
eu, modernismo, duas coisas acontecem no espírito: primeiro, fica definido, por
contraste com o moderno, um passado arcaico e estável; segundo, tais termos
implicam a noção de haver vencedores (naturalmente os modernos) e perdedores (os
demais).
É bem
isso, caro Latour! E é bem contra isso que me insurjo (exclamo de novo)! A
entronização do modernismo como verdade, como critério supremo de avaliação,
criou um passado arcaico e estável, um passado que parece não comportar
movimento, portanto não merecer reavaliação; e criou vencedores, os
modernistas, erguidos sobre os cadáveres dos perdedores, os demais. Quando eu
penso que desse passado estável, desse grupo de perdedores, está Machado de
Assis, nem sei bem o que fazer.
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