sábado, 3 de novembro de 2012



04 de novembro de 2012 | N° 17243QUASE PERFEITO |
Fabrício Carpinejar

Viuvez por alguém vivo

“Tive um relacionamento que começou em 2004 e terminou em 2011. Foram muitas idas e vindas, quase enlouqueci. Terapias, remédios, emagrecimento e distúrbio hormonal fizeram parte da minha vida. No último término, decidi ficar bem, deixar a vida me levar, mas não está sendo fácil. Engordei dez quilos, me sinto cada dia mais infeliz.

No próximo mês, faz um ano que estou solteira. Conheci pessoas que me fizeram balançar e se uma delas quisesse me levar a sério eu não estaria tão mal. Mas o amor esta banalizado, o carinho e o respeito com o próximo não existem mais. Abraços! Jane”

Querida Jane,

Você é fiel ao relacionamento mesmo separada.

Não se permite trair o seu marido. Incorporou a personalidade dele a ponto de não saber mais qual é a própria.

É como viuvez de alguém que está vivo por aí. Não arranja ninguém porque não tolera a ideia de que o outro possa ser melhor e ocupar a majestade da ausência. Não aceita ter sofrido em vão por um sujeito que não merecia, então perdura o sofrimento para glorificar a perda (uma dívida feita somente de juros).

Quando um homem se aproxima, já arruma uma série de desculpas para evitar intimidade.

Ou porque é indiferente ou porque é grosseiro ou porque é apressado ou porque não tem bom hálito ou porque palita os dentes.

Nossa, é exigência em demasia. Não há como ser aprovado no concurso público de seu coração.

Permanece sabotando interessados sem perceber. É um boicote involuntário. Sempre encontra algum defeito no próximo pretendente, sempre acha alguma falha imperdoável que impede a relação, sempre cria restrições para não se apaixonar.

Não sai para valer, cria júris. É capaz de perdoar todos os problemas de personalidade do ex, mas jamais admitir qualquer escorregão de quem se aproxima.

A questão é que não pretende superar o luto. Transforma a ruptura na pior fase de sua vida (nem terapia, remédio, lugares diferentes, nada aplacou a vontade de reatar). Há um exagero emocional em seu depoimento: “quase enlouqueci, engordei dez quilos, quero sumir”.

É como se quisesse provar que tentou tudo e fracassou, que o amor antigo é mais forte do que sua força de vontade.

Mentira! Sequer batalhou um pouco, não começou a se arriscar, não abandonou o altar fúnebre, não largou a data do término. Vem contando os dias do divórcio tal viciado enumerando a abstinência. Desde o princípio, não enxerga a solteirice de forma positiva.

Censura sua felicidade. Prefere sofrer o conhecido a experimentar uma alegria inesperada.

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