03
de novembro de 2012 | N° 17242
PAULO
SANT’ANA
A roda de chope
Qual
o objetivo nosso, o de cinco amigos, ao nos reunirmos em torno de uma mesa de
chope?
O
nosso objetivo visivelmente é o de driblar o destino, o de tergiversar com a
vida.
Entre
alguns de nós, pelo menos para uns dois, o suicídio seria um dever. Mas não
deixa de ser estranho que estejamos os cinco empenhados somente em sobreviver.
O
nosso objetivo ao tomar aqueles chopes, enfim, é desanuviar.
Um
dos cinco grita: “A vida é uma porcaria”. Um outro diz ao contrário, que a vida
é linda.
Os
dois têm razão.
Como
pode ser linda a vida se lemos e ouvimos nesta semana que um canalha aqui em
nosso entorno torturava a filha de apenas três meses de idade; que o bebê foi
internado num hospital às pressas com fraturas nas duas pernas e lesões no
resto do corpo?
Mais
um chope, por favor, é preciso ser de aço para suportar as notícias que a gente
lê.
Os
cinco amigos em torno da mesa de chope por um instante meditam que não é nada
bom o que os espera na vida. Na marcha que vai, está de mal a pior.
Mas
existe o emprego, existe a família, existe o inarredável compromisso com a
sobrevivência.
Suaviza
esse calvário uma boa música que se ouve de quando em quando, o Ney Matogrosso
por exemplo.
Consola
a vida que se possa a qualquer momento saborear outra feijoada feita pelo
dentista Emir Selaimen da Costa. Uma feijoada dos deuses, simples feijoada, que
no entanto só o Emir sabe fazer.
Consola
a vida que o nosso time possa vir a ser campeão no ano que vem.
Consola
a vida que gente nova esteja sendo eleita para prefeito em Pelotas, o Haddad em
São Paulo, pode ser que esse sangue novo redima a vergonheira do mensalão.
Até que
a roda de chope chega a um consenso. Nenhum de nós cinco quer ver os condenados
do mensalão no fundo da cadeia, expiando em 20 anos de prisão.
Já nos
bastou que eles tivessem sido condenados, que enfim a Justiça tenha baixado seu
cutelo sobre aquela quadrilha que queria subverter a democracia comprando a
consciência de deputados corruptos.
A
nossa roda decidiu que não queremos, como tanta gente quer, que as penas de
prisão sejam rigorosamente cumpridas.
Já nos
bastou que tenham caído as máscaras da face do bando que usou do dinheiro público
para mudar as votações e assim permanecer no poder perpetuamente.
Já nos
bastou a lição que receberam e a vergonha em que devem estar mergulhados.
O
julgamento do mensalão serviu para isso e estamos satisfeitos: significou,
enfim, o fim da impunidade.
E a
gente achava que a impunidade nunca teria fim!
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