segunda-feira, 31 de março de 2008



A crise financeira - reflexões

Fernão Bracher artigo -Fernão Bracher - Valor Econômico - 31/3/2008

A presente crise financeira localizada no Hemisfério Norte (por enquanto só financeira) tem as suas linhas gerais já bem estabelecidas: a grande liquidez, a pouca regulamentação, a baixa eficiência das análises de crédito e das agências classificadoras de risco, o grande desenvolvimento das operações com derivativos, ocasionaram grande concentração de riscos imobiliários de menor qualidade nos Estados Unidos que, pela securitização dos créditos, espalharam-se pelos grandes centros do Hemisfério Norte.

Aqui e ali, no segundo semestre, uma gota d´agua (um fundo que deixa de operar, um banco que sofre uma corrida) e o copo transborda.

O rei fica nu e todos se assustam com a magnitude do problema. A reação comum é a do medo, da desconfiança. A falta de regulamentação ou normas que são contornadas, tiram a transparência.

Nenhuma instituição financeira sabe exatamente a situação do seu vizinho, sem falar na sua própria situação. Balanços são refeitos, resultados corrigidos e sempre para pior. Qual o valor correto dos meus ativos? E dos ativos dos meus concorrentes?

Há liquidez, mas ela está "empoçada". Todos se fecham. Não há uma autoridade monetária mundial. Também o problema é interno de cada país, mas no regime de conversibilidade total do mundo desenvolvido, o que se passa em um país flui sem dificuldade para os outros.

Os bancos centrais das grandes moedas, dólar, euro, libra, colocam liquidez à disposição dos seus respectivos sistemas, num esforço de contornar o empoçamento.

As autoridades monetárias ao tratarem desse assunto estão, em primeiro lugar, envoltas na situação do "comportamento de manada" e, em segundo, têm como pano de fundo duas regras não escritas, subjetivas e por isso pouco explícitas que se enunciam normalmente em inglês: "too big to fail" e "moral hazard". A proposta deste artigo é comentar brevemente esses três aspectos.

"Comportamento de manada" é exatamente o que estamos vivendo. Dado um fundamento negativo concreto, como no presente caso, instala-se o medo e, coletivamente, nas instituições financeiras, dos operadores aos departamentos de crédito, passando pelo controle de risco, até a mais alta direção cria-se em todos uma aversão ao risco.

Pelo fato de ser generalizado e ser desmesurado, esse comportamento dificulta a normalização do mercado e a atuação das autoridades.

Para remediar a situação há inúmeras providências e a todo momento estamos vendo a atividade dos governos e bancos centrais nesse sentido.

A ruptura de um banco tem repercussões danosas em toda a atividade econômica e pode causar prejuízos sérios a inúmeros agentes

As duas regras não escritas às quais nos referimos mais acima são, como dissemos, "too big to fail" e "moral hazard". Por "too big to fail" entende-se que uma instituição financeira muito grande não pode quebrar. Isso não está escrito em nenhum lugar mas é de aceitação pacífica. E não está escrito exatamente porque sua aplicação depende totalmente do julgamento da autoridade.

O que é muito grande? Numa situação de absoluta calma, o mercado poderá, talvez (a juízo da autoridade), suportar uma grande quebra. Já numa situação em que se instalou um "movimento de manada", um banco médio já pode tornar-se "muito grande".

Assim foi que o Bank of England, depois de hesitar, interveio no Northern Rock, honrando seus depósitos e, nos nossos dias, as autoridades americanas, usando do seu poder de mando e do dinheiro público, tornaram possível a solução do problema do Bear Stearns.

É o que em outras circunstâncias nós já fizemos com o Proer, o que o governo francês fez com o Credit Lyonnais e o governo sueco fez com todo o seu sistema bancário há alguns anos, para não falar no japonês, no chileno, no mexicano...

A segunda regra é o conceito do "moral hazard". É uma idéia muito difundida e de difícil tradução, literalmente, risco moral. O que se entende por isso é "o risco que há de se deixar uma malfeitoria sem punição".

O mercado se comporta mal, é imprudente, ganha dinheiro e na hora em que vem a borrasca, vem também o Banco Central, ajuda, e todos vão para casa muito sossegados e ricos. Isso é que deixa as pessoas indignadas e as fazem criticar certas ações de acomodação das autoridades monetárias.

Também aqui temos o problema do mandamento não escrito e a necessidade de um julgamento subjetivo para seu entendimento. É certo que não se deve tirar o risco do negócio. Ao arrojado o seu prêmio ou o seu prejuízo.

Ocorre, porém, que a atividade financeira, diferentemente de outras, estabelece vasos comunicantes com todas as atividades sociais. A ruptura de um banco tem repercussões danosas em toda a atividade econômica e pode causar prejuízos sérios a inúmeros agentes.

Para evitar essa ocorrência é que o negócio bancário, como nenhum outro, é inteiramente regulamentado: exigência de capital mínimo, regras para riscos, normas para transparência etc. Tudo para tornar o risco que as empresas devem correr, suportável com recursos próprios.

Se, porém, isso não acontece, a autoridade tem responsabilidade pelo mercado. A regra básica aí é que, qualquer auxílio dado será excepcional, com o objetivo de evitar prejuízos maiores a terceiros, e não deve servir nem aos acionistas, nem aos executivos da instituição auxiliada.

O apoio é dado com dinheiro público e tem que servir a propósitos públicos, do bem comum.

Dentro dessa linha, que - como se vê é carregada de julgamento subjetivo - é que se deve entender o "grande demais para quebrar" e as intervenções abaixando a taxa de juros, que beneficiam as instituições e facilitam a solução da crise.

Essas as reflexões que nos ocorrem. Elas dizem respeito às dificuldades práticas de implementação das políticas escolhidas dentro do contexto de medidas macroeconômicas eleitas. Esperamos que o texto ajude a entender um pouco mais a situação.

Belluzzo sugere medidas para controlar demanda

Sergio Lamucci e Cibelle Bouças - Folha de S. Paulo - 31/3/2008

Preocupado com a rápida deterioração do saldo em conta corrente, o professor Luiz Gonzaga Belluzzo, da Unicamp, diz que chegou o momento de o governo tomar medidas para administrar o ritmo de crescimento da demanda. Além da valorização do câmbio, o forte encolhimento do superávit comercial se deve também à firme expansão da atividade econômica, que tem levado à explosão das importações.

Belluzzo sugere que o governo contenha seus gastos de custeio e adote medidas para controlar o ritmo de expansão do crédito. "Como aqui não é a China, o melhor é ter cuidado", afirma ele, deixando claro, porém, que um aumento dos juros não faz parte do seu receituário. "Seria a medida mais dolorosa e talvez a mais fácil, a mais óbvia."

No começo do mês, Belluzzo participou de uma reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, da qual também tomaram parte o ex-ministro Antonio Delfim Netto, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles. Ele e Delfim manifestaram a preocupação com a piora acelerada do balanço de pagamentos no começo do ano.

Belluzzo diz que percebeu um Lula muito preocupado com os rumos da conta corrente, que inclui, além da balança comercial, a de serviços e as transferências unilaterais. Em 2007, o país teve superávit em conta corrente de US$ 1,5 bilhão, o equivalente a 0,1% do PIB. Para este ano, há quem preveja um rombo de US$ 20 bilhões, ou 1,5% do PIB.

"Lula tem medo da inflação, e quem teme a inflação tem medo de uma inversão na conta corrente." O risco para a inflação é o de que, em algum momento, uma deterioração acentuada do balanço de pagamentos leve a uma desvalorização abrupta do câmbio, o que teria efeitos sobre os índices de preços e certamente levaria o BC a puxar os juros com mais força.

"Quando ocorre com muita violência, a volta do câmbio é muito desagradável." Belluzzo, porém, não vê riscos inflacionários imediatos. O alvo de suas preocupações atuais é a saúde das contas externas.

Poucos dias depois da reunião, o governo anunciou algumas medidas para tentar impedir a valorização do câmbio, como a adoção de uma alíquota de 1,5% do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para o capital estrangeiro que comprar títulos de renda fixa e a permissão para que os exportadores deixem toda a receita de suas vendas no exterior.

Para Belluzzo, as medidas estão na direção certa: "Elas deram o sinal de que o governo está disposto a enfrentar essa questão". Não seriam muito tímidas? "Acho que não. O ideal é atuar de modo progressivo. Depois da experiência que eu tive com o Plano Cruzado, eu sou contra medidas radicais. Eu me tornei um incrementalista."

Belluzzo diz que era esperada alguma valorização do câmbio nos últimos anos, num cenário em que os preços das exportações brasileiras foram muito beneficiados. A questão é que, com a liquidez global abundante, havia espaço para uma queda mais rápida dos juros, o que estreitaria o diferencial entre as taxas internas e externas.

"Essa não é uma crítica ideológica ao BC, mas uma crítica técnica. O Brasil perdeu o timing da administração da política monetária." A adoção do IOF pelo governo visa justamente limitar a entrada de capital especulativo e conter a apreciação do câmbio.

O dólar barato, porém, não é o único fator a explicar a forte deterioração da conta corrente, destaca ele. A robusta expansão da demanda doméstica, que cresce na casa de 7%, é fundamental para explicar a alta de 48,5% das importações ocorrida entre janeiro e a terceira semana de março.

"Há um crescimento muito grande da importação de bens de capital, o que é saudável, mas também há uma entrada violentíssima de bens de consumo importados."

Mesmo distante da ortodoxia econômica, Belluzzo diz que, num momento como o atual, cabe ao governo tomar medidas de administração de demanda. "O governo ingressou na fase das decisões difíceis. Todas elas têm inconvenientes", adverte, prescrevendo um receituário inesperado para um economista não ortodoxo.

"Eu vou dar uma opinião keynesiana bastante heterodoxa para os heterodoxos: o governo deveria de fato separar o orçamento de capital [onde ficam os investimentos] do orçamento de consumo, e ser muito rigoroso e cuidadoso com os seus gastos de custeio", diz ele, ressaltando, porém, que não se devem fazer cortes lineares de despesas. "Se não, você monta o projeto matemática zero e o projeto dengue."

Segundo o keynesiano Belluzzo, medidas de contenção de gastos como as que ele sugere não contrariam o pensamento de John Maynard Keynes.

"Keynes falava numa gestão racional da demanda. Isso implica que, quando há uma demanda muito acelerada, você não pode colocar mais fogo, fazendo com que o gasto de consumo cresça. O gasto do governo tem que ser anticíclico, não pró-cíclico."

Belluzzo também acha que é necessário tomar providências para reduzir o ritmo de expansão do crédito, uma das principais molas do consumo das famílias, que cresceu 6,5% em 2007.

O volume total de empréstimos e financiamentos aumentou 27,9% nos 12 meses terminados em fevereiro. "É necessário administrar isso aí. Nós não podemos fazer gracinhas, porque há bens que produzem o mal", diz, sugerindo que o governo use medidas como aumentar os requerimentos de capital dos bancos ou elevar o IOF sobre operações de crédito.

Um dos maiores problemas, segundo Belluzzo, é que pode haver uma deterioração muito rápida das contas externas, dependendo da diferença de velocidade de crescimento das exportações e das importações.

Para este ano, muitos analistas já prevêem um saldo comercial de US$ 20 bilhões, metade do registrado em 2007. O Brasil, lembra ele, está reagindo bem à crise americana, porque tem quase US$ 200 bilhões em reservas e uma situação ainda tranqüila no balanço de pagamentos.

"Muita gente diz que um déficit em conta corrente de 2%, 3% do PIB não tem importância, mas tem importância, sim, porque podem surgir problemas de financiamento. Quando você tem um déficit, a dificuldade de financiamento aumenta."

No governo Fernando Henrique Cardoso, o país chegou a ter um rombo de 4,3% do PIB, em 1999. Por conta desses temores, ele considera fundamental agir para evitar a valorização do câmbio e adotar medidas de administração da demanda.

Belluzzo não acha, porém, que seja o caso de o BC aumentar os juros. Ele não vê um quadro inflacionário complicado, e diz que as importações têm amortecido as pressões sobre os preços.

"Há uma certa pressão sobre os custos, mas por enquanto nada que preocupe muito. Eu não creio que haverá um choque inflacionário relevante. Se o balanço de pagamentos piorar lá na frente, aí sim."

Elevar a Selic também poderia acentuar a valorização do câmbio, ao incentivar a entrada de capitais interessados em aproveitar a diferença entre as taxas internas e externas.

E Belluzzo cita outro motivo para não elevar os juros: esperar os desdobramentos da crise externa. Se os preços das commodities caírem com força, por exemplo, pode haver uma tendência deflacionária global. "E você vai aumentar os juros num cenário em que há um risco como esse?"

A estratégia de Belluzzo tem como um dos pontos fundamentais a preservação do investimento, tanto que, ao recomendar medidas para administrar a demanda, defende a contenção dos gastos de custeio do governo e o controle do ritmo de expansão do crédito - além de rechaçar a elevação dos juros.

"O que eu quero é que o governo faça um exercício para deixar o investimento avançar e ser o carro-chefe do crescimento. Mas isso não se pode fazer com uma queda do consumo, para não desestimular o investimento", diz ele, reconhecendo que se trata de algo "fácil de falar, e difícil de fazer".

Belluzzo destaca ainda outra de suas grandes preocupações: a mudança na composição das exportações, "cada vez mais apoiadas em commodities e em bens de baixo valor agregado e baixa intensidade tecnológica".

"Isso já vem de algum tempo, e não é desejável para um país com o Brasil", opina ele, insistindo na importância de uma pauta exportadora que não se resuma à produção de commodities.

Belluzzo aproveita para elogiar as linhas gerais da política industrial, que deve ser anunciada em breve, e aponta na direção do fortalecimento de uma indústria diversificada. "As medidas são muito bem concebidas, e são compatíveis com o conjunto da obra."


31 de março de 2008
N° 15557 - Kledir Ramil


Canhotos

Você já tentou segurar uma tesoura com a mão esquerda e cortar uma folha de papel? Faça isso. Depois, vá até a cozinha, pegue um abridor de latas e, com a mesma mão esquerda, tente abrir uma lata de leite condensado.

Essas pequenas experiências com utensílios domésticos podem dar uma noção da dificuldade que é para um canhoto viver num mundo feito para os destros.

Há alguns anos, quando o homem era ainda mais ignorante do que hoje, muitos julgavam que ser canhoto era uma doença. Professores batiam de régua nas mãos das crianças para fazê-las escrever com a mão "certa". Algumas desenvolveram uma capacidade incrível de manusear as coisas com as duas mãos, mas a maioria cresceu com traumas.

Ainda bem que certos pais não forçaram seus filhos a abandonar o uso da canhota, senão poderíamos ter sido privados da genialidade de Leonardo Da Vinci, Albert Einstein, Isaac Newton, Charles Chaplin, Machado de Assis, Mahatma Gandhi e Ayrton Senna. Isso, sem falar das deusas: Greta Garbo, Marilyn Monroe, Julia Roberts, Nicole Kidman, Angelina Jolie. O mundo seria outro.

Não sei por que razão as pessoas funcionam melhor de um lado do que do outro. E se formos comparar os dois grupos, o resultado é desproporcional: 90% usa o lado direito. Canhoto é minoria.

Em Nova York, há uma loja só para eles. Além de tesouras e abridores de lata, existem coisas que eu nem imaginava que faziam falta.

Teclado e mouse para computador, saca-rolhas, caderno espiral, régua, apontador, canivete. Há até relógios que giram no sentido anti-horário, que é o mais natural para quem não é destro.

Deve ser usado no pulso direito e o botão de acertar ponteiros é do outro lado. Tudo faz sentido. E é bom que faça. Se não tivessem inventado a guitarra para canhotos, não haveria Jimi Hendrix nem Paul McCartney, e a história do nosso tempo não seria a mesma.

Dizem que a mão inglesa - o trânsito no Reino Unido onde os carros se cruzam pelo lado "errado" - vem do tempo das batalhas medievais a cavalo, em que os cavaleiros se enfrentavam dessa forma, pois seguravam a lança com o braço direito.

Mas se alguém tivesse me contado que o cara que criou a mão inglesa era canhoto, eu teria acreditado. Até porque, para nós os destros, é muito complicado passar as marchas do carro com a mão esquerda.

Meu filho é canhoto da barriga pra baixo. Escreve com a mão direita e chuta com a perna esquerda. É um fenômeno que não tem explicação.

Talvez eu seja o responsável. No entusiasmo do processo de fabricação, posso ter enroscado além do normal a espiral de DNA do guri. Vai saber.

Ótima segunda-feira, aproveite o último dia de março de 2008 e uma excelente semana.


31 de março de 2008
N° 15557 - Paulo Sant'ana


Fazer falta

Estava me dizendo ontem no fumódromo, onde se dizem e se sentem todas as coisas, a minha amiga Grazielle Badke, que chorou no dia em que ouviu no rádio a notícia da morte de George Harrison, o guitarrista dos Beatles, tão penetrante era em sua pele e em seus aurículos a melodia e a letra da sua célebre Something.

O que minha amiga queria me dizer é que, quando ouviu aquela notícia da morte de Harrison, teve a certeza de que sentiria para sempre falta dele em sua vida.

Uma vez escrevi aqui que o único dever que temos na vida é fazermos com que os outros sintam falta de nós.

Quando corro para tomar o café da manhã com um amigo, isto quer dizer que sinto falta dele. E se corro várias vezes para tomar o café da manhã com esse amigo, então mais do que necessário, esse amigo é-me imprescindível.

Quando morrem as pessoas que nos são imprescindíveis, sentimos ainda mais falta delas.

Mas o lindo é quando temos ao nosso redor, em contato todos os dias conosco, uma pessoa que amamos - e temos nítida noção de que sentimos profunda falta dela sempre que ela se afasta de nós, por dias, quando ela viaja ou nós viajamos, por minutos, quando ela sai da sala por qualquer motivo e já nos deixa repletos de saudade.

Noção da falta que eventualmente nos causa em vida.

Isto é que é ser útil! E, mais que útil, transcendental: é incutir nos outros a nossa falta.

Se me quiserem fazer um elogio inesquecível - e se dele eu for merecedor - , quereria que me dissessem que faço falta para os que o dizem.

E se quiserem me fazer um elogio para além da minha vida, um elogio póstero de valor incalculável, escrevam na minha lápide: "Aqui jaz alguém que está nos fazendo falta".

Um simples, mas colossal elogio.

Eu só peço a Deus que nunca me dê susto ou pesadelo que consista em afastamento, distanciamento ou perda de pessoas que me fazem falta. Nunca. Nunca mais, tanto já me fez sofrer por isso.

Pelo contrário, peço a Deus que sempre me dote de mais e mais pessoas a meu redor que me façam falta. Os tais imprescindíveis.

Eu sei que os imprescindíveis são raros, mas por assim o serem é que quero encontrá-los em minha bateia, os que ainda não achei - e mantê-los em meu relicário, os que já possuo.

Nunca me afaste Deus de todos os que me dão ainda força para continuar vivendo. Nunca me afaste Deus dos que me entendem, dos que me toleram, dos que me perdoam, dos que me dizem coisas incentivadoras, dos que juram com sinceridade que me querem sempre a seu lado, dos que me garantem que para mim não falta pouco e a nossa vida em comum será, como por vezes tem sido, cheia de felicidade.

Esses são os que me fazem falta e o meu sonho e a minha utopia é que eu lhes faça falta.

Enquanto houver os que me fazem falta e enquanto porventura eu fizer falta a alguém, esta é a garantia de que fiz e estou fazendo jus à vida.

E que Deus me torne cada vez mais forte e talvez inquebrantável para continuar talvez fazendo falta a alguém, tomando para isso a providência permanente e perpétua de não afastar de mim os que me fazem falta.


31 de março de 2008
N° 15557 - Luis Fernando Verissimo


O Risadinha

Para saber com certeza a idade de alguém, faça um teste. Pergunte "Quem era o Risadinha?" Cantor e compositor paulista das décadas de 40 e 50, certo.

Mas havia outro. Quem era? Num filme de 1947 chamado Kiss of Death (em português, me informa o Google, O Denunciante), dirigido por Henry Hathaway, estreou no cinema o ator Richard Widmark.

Ele fazia um psicopata que divertia-se com suas maldades - como a de amarrar uma velhinha na sua cadeira de rodas e jogá-la escada abaixo - e dava uma risadinha para o lado.

O personagem foi um grande sucesso, tanto que até o fim da sua carreira, que incluiu papéis de herói, cientista, velho sábio e acho que até padre, Widmark nunca deixou de ser lembrado como o psicopata da risadinha para o lado.

Aqui, a gente o chamava de "Risadinha", não importava o tipo de personagem que interpretasse. Mesmo nos filmes em que seu papel era claramente de mocinho não conseguíamos nos livrar da impressão de que alguma o Risadinha iria aprontar, cedo ou tarde.

Widmark morreu há dias, com 93 anos, e todos os necrológios destacaram o estereótipo de psicopata que ele, por mais bonzinho que quisesse parecer, nunca conseguiu superar. A risadinha para o lado o perseguiu até a morte. A velhinha da cadeira de rodas se vingou.

Um paradoxo

Já se disse que é um equivoco, os ingleses não inventaram o futebol. Inventaram a bola levantada na área, e esperaram que outros inventassem o resto.

Mas há dias a televisão mostrou dois jogos do campeonato inglês, um depois do outro, Manchester United contra Liverpool e Chelsea contra Arsenal, que eu gravaria para mostrar a quem ainda não se convenceu que o futebol é o esporte mais bonito do mundo.

E que destruíam todas as críticas ao supostamente tosco futebol inglês. Mas dias depois viu-se um jogo da seleção inglesa contra a seleção francesa que parecia confirmar o pior que se diz dos ingleses.

Um paradoxo, até você se dar conta da quantidade de jogadores estrangeiros que deram o espetáculo nos dois jogos da "Premier League". E concluir - com a ressalva que Rooney e alguns outros brilhariam em qualquer lugar - que o melhor futebol do mundo, hoje, se joga na Inglaterra, mas não por ingleses.

Grande esperança

Pato é muito bom e tem não uma estrela guiando a sua sorte, mas uma constelação. Mas não sei se não está acontecendo o mesmo que houve nos Estados Unidos quando torciam tanto pelo aparecimento de um bom boxeador branco para desafiar os campeões negros que qualquer medíocre mais forte era saudado como grande esperança branca.

Não há nada de racista no entusiasmo por Pato, que é tudo menos medíocre, mas a vontade de que apareça um jovem fenômeno com a sua cara parece estar inflando os comentários.

O endeusamento será merecido, se ele continuar assim. No momento, só parece um pouco precoce.

domingo, 30 de março de 2008


JOSÉ SIMÃO

Tibete muda de nome para Tibate!

E o blog Comentando revela o novo slogan da Olimpíada: "Beijing, Beijing! Pau, Pau!"

BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta!

E a Carla Perez tá com traumatismo craniano. De tanto bater a cabeça no computador pra entrar na internet.

Pra votar na final do "BBB"! Eu quero entrar na internet! BUM! Eu quero entrar na internet! BUM! Rarará!

E a Ana Maria Braga fez uma descoberta inseto-mosquitológica: "O mosquito da dengue morde mais de dez vezes". O mosquito tem dente, ele morde. Morde e abana o rabo.

Pendura uma plaquinha no mosquito: "Cuidado, mosquito anti-social". Até o Luciano Huck pegou dengue. Já sei, tinha água parada no caldeirão. E sabe o que o mosquito falou pro Luciano? "Perdeu, playboy!" Rarará!

E sabe por que o Lula deu carta branca pro ministro Jobim? Porque ele não conseguiu escrever. Rarará! E o Cesar Maia insiste que não tem epidemia. Concordo, são 30.547 casos isolados. Cesar EPIDEMAIA!

Só falta o Brasil ter epidemia de amarelão, bicho do pé e barriga d'água. Tudo doença de antigamente. Precisa consultar médico com mais de 80 anos!

Rumo a Pequim! A China já tá fazendo esquentamento pra Olimpíada: tiro ao monge, corrida ao dalai-lama e levantamento de galo em careca de monge.

E Tibete mudou de nome pra Tabefe. Ou Tibate. E Nepal agora é Nepau! E o blog Comentando revela o novo slogan da Olimpíada: "Beijing, Beijing! Pau, Pau!".

Eu já tenho a minha equipe olímpica. Fafá de Belém: natação de 50 metros de peito. Clodovil: frescobol e salto com vara.

Alexandre Frota: pênis de mesa. E Hebe, Marta, dona Marisa e Yoná Magalhães: revezamento de bisturi. É pra deixar a China no chinelo!

Mas a Olimpíada na China será um marco histórico: todos os chaveirinhos, todas as bugigangas serão ORIGINAIS! E será que eles vão ficar gritando: "Batelia lecalegável? É cheque do Bladesco?". Rarará!

E um amigo meu foi comprar um microsystem e perguntou pra chinesa: "As caixas surround vêm inclusas?". "Caxinha sulaundi paga sepalado". "Então enfia na peleleca!". Rarará!

É mole? É mole, mas sobe! OU como diz o outro: "É mole, mas trisca pra ver o que acontece!".

E atenção! Cartilha do Lula. Mais um verbete pro óbvio lulante. "Incerto": mosquito da dengue que avoa e pica nóis. Rarará!

O lulês é mais fácil que o inglês. Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje só amanhã! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno! Acorda Brasil! Que eu vou dormir!

simao@uol.com.br

DANUZA LEÃO

Difícil felicidade

É uma aflição, um medo de que nada dê certo, que você está sonhando, vai acordar e ver que não é nada daquilo

EXISTEM momentos -raros, é verdade- em que tudo está bem. Bem, não: ótimo. A casa finalmente ficou pronta, os gatos estão com saúde, os filhos bem e felizes, faltam só 15 dias para a viagem marcada há seis meses -e a passagem parcelada já está paga-, a saúde em forma total e, como se não bastasse, uma proposta de trabalho nova e sedutora -e sem ter que deixar o atual trabalho.

A vida está tão boa que chega a dar uma agonia. E isso é normal? Não, diria a maioria das pessoas. Sim, afirmam os mais habituados a conviver com as profundezas da alma.

É bem verdade que esses tempos são raros, e normalmente, até bobagens como a máquina de lavar roupa que está com defeito é um estresse. Mas quando eles acontecem são difíceis de suportar. A palavra é essa mesma: suportar.

É uma aflição, um medo de que nada dê certo, que você está sonhando, vai acordar e ver que não é nada daquilo, que a realidade não é assim, que existem problemas de todos os tipos o tempo todo e que nem o direito ao silêncio de sua casa você tem.

Quando chega tem que ver os recados da secretária eletrônica, abrir o computador para ver os e-mails, e o mais normal é receber uma notícia que pode não ser péssima, mas será suficiente para perturbar sua santa paz. Que o ar-condicionado do quarto não está funcionando, por exemplo.

Mas tudo isso é normal, tão normal que não chega a causar nenhum abalo maior. Faz parte do dia-a-dia, faz parte de todos os dias, isso sem falar de uma dor de coluna, do brinco que sumiu, do lençol que manchou com água sanitária.

Mas tem aqueles dias maravilhosos em que tudo dá certo, e que o futuro, tudo indica, vai ser melhor ainda do que o presente. É curioso que esses dias nunca têm a ver com um homem maravilhoso que você conheceu na véspera.

Esse tipo de encontro não costuma trazer paz, e sim angústia, ansiedade, insegurança, taquicardia, aflição. Não, esses grandes momentos acontecem apenas com nós mesmos, na nossa mais profunda -solidão? Não, solidão não é a palavra certa.

É um sentimento de você com você mesmo, que não é compartilhado com nenhum ser humano e que prova que, apesar do que dizem, ninguém precisa de ninguém para ser feliz de verdade.

Para ir a um cinema, comer uma pizza, trocar uma idéia sobre as infidelidades públicas dos políticos americanos, até aí se vai. Mas para ser feliz mesmo, para se ser profundamente feliz, não se precisa de ninguém, e o que pode parecer uma tragédia para alguns, é uma liberação para outros.

Não que só você seja feliz o tempo todo, mas existem aqueles momentos em que se é totalmente feliz, e é aí que as coisas se complicam. Como nada é fácil, você começa com a culpa, claro.

Como ser feliz com tanta gente sofrendo? E aí começa o medo, o grande medo, aquele de perder a felicidade que está sentindo.

Para isso se apela para tudo: fazer uma aula de ginástica, tomar um tranqüilizante ou não fazer rigorosamente nada e ficar deitado na cama olhando para o teto, só sendo feliz e mais nada.

Mas isso não dá porque os pensamentos não deixam, e a vontade é que aconteça alguma coisa que traga você de volta para o mundo imperfeito em que vive; a televisão quebrar já seria o suficiente. Ser infeliz é muito ruim, mas ser feliz é muito difícil.

danuza.leao@uol.com.br
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CARLOS HEITOR CONY

A moça triste

RIO DE JANEIRO - Encontrei-a por acaso. Era alta, mais para bonita, com dois olhos imensos e negros, a pele muito branca e suave.

Com esforço de memória e imaginação, poderia parecer uma estátua grega, mas para isso seria necessário cegá-la, estátuas gregas têm olhos vazados.

Ela pediu meu e-mail para mandar um trabalho que fizera sobre a violência nas grandes cidades, tema que a preocupava. Tivera uma amiga currada e assassinada numa rua da Tijuca, os jornais nem deram a notícia, os assassinos eram classe média, um deles era filho de um cara importante.

Perguntei-lhe o nome e ela disse que se chamava Eloína. Mas não gostava dele, era uma mistura do nome do pai, que se chama Elói, e de sua mãe, que é Regina.

Estranhei aquilo. Afinal, Eloína não é um nome tão feio assim, muitas moças têm esse nome. E há nomes piores, que já saíram de moda, poderia citar um milhão deles.

Mas ela insistiu. Disse que o "Eloína" era o que sobrara do casamento dos pais dela. Os dois se separaram, nada mais tinham em comum, coubera-lhe a herança idiota de prolongar um amor que acabara num nome que ela não amava.

Achei a moça triste, dizendo uma coisa triste. E eu caí na asneira de comentar que ela talvez tivesse razão. O ideal teria sido que o nome fosse mágico o suficiente para conservar juntos o Elói e a Regina. Mas seria egoísmo exigir que, por causa de um nome, os dois continuassem infelizes.

A moça olhou com raiva para mim. Respondeu com uma voz irritada. Ela não era um nome. Era uma jovem feita de carne e sangue, tinha direito também de ser feliz. De amar e ser amada.

Dei-lhe razão. Onde quer que estejam, tanto o Elói como a Regina, que deram vida e nome a Eloína, devem pensar no tão pouco que custaria fazer a moça feliz.

sábado, 29 de março de 2008



30 de março de 2008
N° 15556 - Martha Medeiros


Aventureiros

Ter uma família não é nada ruim para quem tem espírito de aventura.

Mas, para quem não lida bem com o imponderável, o melhor é deixar pra lá

Você está na dúvida se quer ter filhos, então resolve visitar um casal de amigos que tem duas crianças. É a oportunidade de observar a rotina de uma família bem constituída e descobrir se é um modelo de vida que você e seu marido gostariam de reproduzir. A grande noite chega. O menino tem 6 anos, e a menina, 3.

A casa está um circo, há um pano amarelado aparecendo por baixo do sofá e na televisão está passando o DVD do Shrek. "Ninguém mais ouve música aqui em casa, só trilha sonora infantil", comenta sua amiga com um sorriso perturbado. Aliás, sua amiga não senta, está sempre em pé, de um lado para o outro.

A menina não quer comer nada. O menino diz que está sem sono, apesar de tropeçar nas próprias pernas. A menina abre sua bolsa (não a dela: a sua!), tira de dentro o celular e aperta em todas as teclas.

O menino chora porque não quer ir pra cama: não quer, não quer, não quer. A menina dança no meio da sala e não deixa ninguém conversar, exige a atenção todinha pra ela. O garoto passa voando por um copo e o quebra.

A menina pede para você emprestar a pulseira que você está usando, aquela feita de delicadíssimos cristais que podem arrebentar por qualquer coisinha. Ao sair do jantar, você e seu marido olham um para o outro, se beijam no elevador e, sorrindo, decidem: claro que vamos ter os nossos! Vai ser totalmente diferente!

Não adianta. Quem nunca teve filho projeta um futuro mirabolante: "Os meus serão calmos, estudiosos, comerão só alimentos saudáveis, dormirão cedo, não fumarão, serão sociáveis, esportistas, gostarão de livros, viverão junto à natureza, terão muitos amigos e irão à missa".

Amém. Você pode evitar de ter uns pestinhas, educação funciona. Mas é bom estar preparado para imprevistos. Filho é uma incógnita.

Pode odiar tudo o que você adora, pode ter um humor diferente do seu, pode querer morar numa comunidade no meio do mato, pode não ser chegado aos estudos, pode ser um gênio: nosso controle é relativo. Muitíssimo relativo. Quem acha que ser mãe e pai é criar alguém à sua imagem e semelhança, começa mal.

Ter filhos é um ótimo projeto pra quem não é egoísta e entende o significado das palavras responsabilidade, respeito, adoração e liberdade. Filhos são outras pessoas, não são nós.

Não querê-los é um desejo tão legítimo quanto querê-los, encontra-se felicidade em qualquer situação, não obrigatoriamente nas convenções.

Mas creiam-me: vale a pena. Uma filha quer ser médica, a outra quer trabalhar com moda. Uma anda com saias curtíssimas e pinta as unhas de rosa-choque, a outra não tira o jeans e o All Star.

Uma sonha em conhecer o mundo todo, a outra reclama de almoçar fora. Uma toca guitarra, a outra é um projeto de patricinha. E ambas odeiam o verão!! Fazer o quê, internar?

Me divirto com as minhas duas. Ter uma família não é nada ruim, mas sempre vai ser muito diferente do que se imaginou.

Portanto, pra quem tem espírito de aventura, bem-vindo a bordo, mas quem não lida bem com o imponderável, melhor mesmo deixar pra lá. Ou é um prazer, ou melhor não ter.

Um excelente domingo especialmente para você. Vá na Redenção ou ao Moinhos de Vento, ou ao Marinha, não importa. Respire ar puro, caminhe e divirta-se neta Semana de Porto Alegre.


30 de março de 2008
N° 15556 - Paulo Sant'ana


S h e

Em homenagem a Charles Aznavour, que nos visita nos próximos dias em Porto Alegre, fiz esta coluna com o título de "She", uma das suas mais célebres músicas.

Ele é um cantor extraordinário, em quem eu sempre baseei minha atuação como jornalista, isto é, na emoção.

É impossível deixar de sentir vibrar as cordas emocionais do corpo, do coração e do espírito assistindo ao Charles Aznavour.

Esta é a coluna que eu fiz em sua homenagem:

Ela. Sabe secretamente o que eu sei também em segredo: nós fomos feitos um para o outro e construiríamos juntos o único sentido para a vida.

Ela passa e confessa no olhar a nossa conspiração de felicidade.

Ela sabe como eu sei que esses instantes vazios da vida estariam sempre repletos de ventura, mesmo os que se constituíssem apenas em silêncio, se tivéssemos coragem.

Ela. Passa e deixa que eu adivinhe seu perfume, o mesmo dos caminhos floridos que percorreríamos sempre que desconfiássemos que íamos ficar tristes.

Ela passa e diz no olhar que seu pensamento é fixo em mim durante todas as horas do dia, até o instante do adormecer, porque tem certeza que durante toda a minha vigília o meu pensamento não se afasta nunca dela e sonha com a possibilidade remota e quase impossível do nosso encontro.

Ela. Tem consciência do imenso desperdício da nossa distância inexplicável e cultiva como eu o passatempo de enumerar todos os obstáculos intransponíveis que nos separam, sabendo-os até úteis para que esse amor se perenize pela impossibilidade. Uma forma de amar, talvez a mais bela forma de amar, é o amor impossível.

Ela. Sempre se mostrou sensível às minhas dores e nunca deixou que transparecessem as dores dela, sabemos que todas desapareceriam se simplesmente decidíssemos virar a mesa e apostar em nós dois, até mesmo porque nada mais importa que não seja nós.

Ela. Passam os dias e resistem em passar as noites e ela permanece inquebrantável, com um pensamento e um destino só, atados ao meu pelo mistério do pressentimento.

Ela sabe como eu que a única forma de tornar digna e gloriosa a vida é sonhar com esta hipótese animada de esperança.

Ela. Sabe como eu que o mundo só teve até agora uma utilidade: a de que nós dois percebêssemos que todos os valores que cercam a vida só se tornariam reais e prósperos se fossem afirmados pela permanência da nossa proximidade.

Ali vai ela, impossível mas verdadeira. Aqui fico eu, irresolvido mas cônscio da radical solução. Ela.


30 de março de 2008
N° 15556 - David Coimbra


A pintura da Última Ceia

Leonardo Da Vinci era um homem estranho. Tinha o hábito de escrever da direita para a esquerda. Seus escritos só podiam ser lidos se colocados diante de um espelho, um trabalhão. Fazia isso talvez por ser canhoto, talvez por ter medo de que suas idéias fossem consideradas heréticas.

E eram - entre seus textos foi encontrada a frase "o sol não se move", que, anos depois, rendeu a Galileu Galilei alguns contratempos, como a possibilidade de ser queimado vivo numa fogueira da inquisição.

Leonardo recebia inúmeras encomendas de trabalho de príncipes, governantes e nababos do século 16. Os príncipes e governantes pediam que desenvolvesse máquinas bélicas, no que ele era muito bom; os nababos apreciavam seus dotes musicais, suas pinturas e esculturas, no que era melhor ainda.

Geralmente, Leonardo empolgava-se com um novo projeto, começava-o, mas não o terminava. A maior parte da sua obra ficou inconclusa.

Felizmente, a célebre "Última Ceia" não foi um desses casos. A Última Ceia é o mural que sustenta toda a tese de Dan Brown em "O Código Da Vinci", mas nem isso depõe contra a obra.

Foi pintada na parede do refeitório de um mosteiro de Milão. Enquanto almoçavam, os monges fruíam a obra de Leonardo, o que me faz lembrar da foto de uma couve que havia no refeitório de um jornal no qual fui repórter.

Suponho que os administradores do jornal pretendiam nos estimular gastronomicamente com aquela couve, uma couve bem grande e verde, cheia de folhas. Eu olhava para aquela couve e pensava: uma couve...

Enfim.

Houve testemunhas oculares desse trabalho de Leonardo. Elas contaram que, muitas vezes, o artista subia no andaime e passava o dia inteiro muito ereto, de braços cruzados, examinando a pintura, pensativo. Às vezes, só depois de dias nessa contemplação, é que Leonardo estendia o braço e dava mais uma pincelada.

Leonardo refletia a respeito do que fazia, eis o importante. O gênio tem a vocação, tem a inspiração, tem o dom, mas não é o suficiente. É preciso reflexão, trabalho, prática, transpiração. Agora alguém aí me diga: como é que alguns pernas-de-pau querem jogar futebol sem se esforçar no treinamento???

O gol minhoca

Certa feita um gaiato apresentou-se a Foguinho, no Olímpico, pedindo para fazer um teste a fim de jogar no Grêmio.

- Em que posição o senhorrr joga? - quis saber Foguinho, com seus erres triplos.

- Brinco em todas - respondeu o outro, decerto mascando chiclete, imagino-o mascando chiclete.

- Em todas? Hmm... Então faz o seguinte: cabeceia essa bola - mandou o técnico, e rolou a bola rasteirinha.

O sujeito mergulhou no chão, raspou o nariz na grama e meteu a testa na bola.

Foguinho suspirou e apontou o portão da rua:

- Pode irrr embora, meu rapaz. Para jogadorrr o senhorrr não serve.

Isso porque Foguinho não tinha um Jonas no time. Jonas não apenas cabeceou a bola rente à grama, ágil como uma minhoca de chuteiras, na quarta-feira passada. Jonas fez mais do que isso: fez gol! Faz-se gol de tudo que é jeito nesse mundo do futebol, disso nem Foguinho sabia.

Pobre Porto Alegre

Nasci chorando, Cristo Redentor. Porto-alegrense, portanto, descendente de gerações de porto-alegrenses. Mas não me regozijei com essa semana de aniversário da minha cidade. Até, confesso, me entristeci um pouco ao pensar em Porto Alegre e constatar o estado em que se encontra.

Não porque os prédios e os monumentos sejam pichados diariamente. Não porque as ruas estejam sujas. Não porque o Arroio Dilúvio tenha de ser constantemente limpo pela prefeitura, que de seu curso pesca pneus, latas, garrafas e até sofás. Não porque os telefones públicos sejam depredados.

Nada disso.

Fiquei triste porque há pessoas que picham prédios, sujam as ruas, atiram até sofás no Arroio Dilúvio, depredam monumentos e telefones públicos.

Fiquei triste porque o Mal de Porto Alegre é muito menos a qualidade das suas autoridades e muito mais o comportamento da sua população, cada vez mais grosseira e ignorante, uma população de pedintes que ficam de campana nas sinaleiras para achacar motoristas, de motoristas que atiram lixo pelas janelas dos carros, de alunos que agridem professores nas escolas, de pais de alunos que não admitem que seus filhos sejam punidos, uma população que emporcalha a cidade e se xinga mutuamente nos balcões das lojas, nas repartições públicas, no trânsito.

Essa doença da alma porto-alegrense, o sintoma dela se manifesta com toda clareza quando a massa que se reúne semanalmente a fim de assistir ao futebol.

Há 10 anos, quando víamos cenas de violência patrocinadas por torcedores paulistas, nós aqui na redação do jornal nos congratulávamos: em Porto Alegre não havia daquilo. Hoje, a ignorância do torcedor, nem que seja ignorância verbal, virou tema recorrente entre os jornalistas.

O torcedor, ainda que seja um torcedor leitor, pretensamente de melhor nível cultural, quando se manifesta, em geral o faz com agressividade e intolerância.

As mesmas agressividade e intolerância que ele transporta para a arquibancada, que o leva a danificar os aparelhos públicos da cidade e a fazer das ruas em que transita uma imundície.

Por isso, saúdo a proibição de bebidas alcoólicas nos estádios. Quanto menos instrumentos se der para que aflorem os sentimentos animalescos da súcia, melhor.


30 de março de 2008
N° 15556 - Moacyr Scliar


Filhos, melhor não tê-los?

Administradores modernos bolariam um cálculo de custo-benefício para responder se vale ou não a pena ter filhos. Mas é algo que só pode ser respondido com a maternidade e a paternidade. Ou seja: correndo o risco

Vinicius de Moraes era conhecido entre amigos e fãs como "o poetinha". Diminutivo carinhoso, que nada tem a ver com a qualidade de sua obra literária: Vinicius era, e é, um grande poeta, autor de versos antológicos, como aqueles que se constituem num surpreendente e desafiador paradoxo:

Filhos, melhor não tê-los.

Mas, se não os temos, como sabê-lo?

Observem o contraste entre os dois versos. No primeiro, Vinicius faz uma afirmativa categórica: "Filhos, melhor não tê-los." É algo que pode ter resultado, em primeiro lugar, de uma experiência pessoal. Casado várias vezes, Vinicius teve muitos filhos. E teve também uma vida atribulada, cheia de conflitos de várias ordens.

Diplomata, era mal visto por seus superiores em função da vida boêmia que levava e que parecia incompatível com a dignidade do ofício. Acabou perdendo o cargo, o que deve ter resultado em muitas dificuldades financeiras. Não é a melhor situação para um pai de família e provavelmente não foram poucos os conflitos que daí resultaram.

Mas quando afirma que "Filhos, melhor não tê-los", Vinicius certamente não se restringe a seu próprio caso: está verbalizando, e de uma maneira que nem é tão poética, aquilo que muitos pais sentem quando se sentem assoberbados pelas obrigações resultantes da paternidade.

Quando o filho chora de noite, quando o filho vai mal no colégio, quando o filho cria confusão, "Filhos, melhor não tê-los".

Mas esta não é uma afirmação definitiva. A paternidade dá incontáveis alegrias. Mais: a paternidade e a maternidade conferem às pessoas um sentimento de realização pessoal que corresponde a uma necessidade embutida na própria condição humana, a um verdadeiro e poderoso instinto. Paternidade e maternidade significam continuidade. Afinal, é bom ou é ruim ter filhos?

Notem que o primeiro verso é uma afirmação que se pretende definitiva: filhos, nem pensar, filhos só dão trabalho - há muitos provérbios que o traduzem, como aquele que diz: "Filhos pequenos, pequenas preocupações; filhos grandes, grandes preocupações."

Administradores modernos bolariam algum cálculo do tipo custo-benefício para responder à questão do vale ou não a pena. Mas o comum das pessoas não chega a esses extremos.

O resultado é a dúvida. Que só pode ser esclarecida com a própria paternidade e com a própria maternidade. Ou seja: correndo o risco. Porque a vida é isso, correr riscos. Quem não se arrisca não apenas não petisca: não vive.

Paternidade e maternidade correspondem a um instinto, a algo inato, biológico. Só que o ser humano não é apenas biologia, não é apenas instinto. O ser humano tem a capacidade de transformar seus instintos, de sublimá-los, para usar a expressão freudiana.

E assim podemos compreender os casais que decidem não ter filhos. Eles sufocaram os instintos paterno e materno?

Em alguns casos, talvez sim. Em outros, e esses são cada vez mais freqüentes, trata-se de aplicar essa energia emocional de maneira distinta.

Conheci médicos que não apenas não tiveram filhos como não casaram; mas a dedicação que eles mostravam a seus pacientes sem dúvida representava uma canalização dos sentimentos habitualmente envolvidos na vida familiar.

A interrogação formulada por Vinicius continua atual. E cada pessoa, cada casal, responde à sua maneira. O que devemos aceitar. Somos humanos, e nada do que é humano pode nos parecer estranho.

Diogo Mainardi

Entendeu, Tabatha?

O blog de Paulo Henrique Amorim está em nome da Nexxy Capital Brasil Ltda., de Luiz Roberto Demarco. A internet é assim. Os blogueiros jornalistas podem criar uma nova identidade por dia. Mas sempre dá para descobrir quem manda neles

Quando um internauta faz uma piada, ele acrescenta: "Hahahahahaha". Pode ser também: "Kkkkkkkkkkk". Ou simplesmente: "Rsrsrs". A internet representa o retorno da risada enlatada. É como se fosse um episódio de A Feiticeira. Agora, Tabatha tem um blog.

Além da risada enlatada, a internet também reintroduziu a claque. Blogueiros enchem de comentários elogiosos os blogs de outros blogueiros. E blogueiros enchem de comentários elogiosos seus próprios blogs, usando identidades falsas.

Os jornalistas que foram afastados da grande imprensa procuraram se reciclar na internet. Eles cancelaram o passado e se apresentaram como promotores de um jornalismo independente e transparente, trombeteando a internet como o caminho para o futuro.

Na realidade, o que ocorreu foi o contrário: eles retomaram algumas das práticas mais antigas e mais imundas do jornalismo, como a chantagem, a mentira, a propaganda do poder e a matéria paga.

O internauta bocó, da risada enlatada e da claque, certamente é mais propenso a ser ludibriado pela imprensa marrom instalada na internet.

Por sorte, os instrumentos para policiar esse tipo de jornalismo encontram-se na própria internet. Posso mostrar como isso acontece, citando um caso menor, muito menor.

Recentemente, Paulo Henrique Amorim foi demitido do iG. No dia seguinte, ele abriu um blog com seu nome. Um leitor sugeriu que eu desse uma espiada no registro do blog. Descobri que seu servidor era a Nexxia.

A Nexxia pertence a Luiz Roberto Demarco, aquele da Lojinha do PT, o comércio on-line dos produtos licenciados pelo partido para arrecadar fundos eleitorais: bonés, camisetas, broches, relógios.

Fiz um podcast sobre o assunto. Paulo Henrique Amorim me chamou de mentiroso, mas imediatamente tratou de mudar o servidor.

Fui escarafunchar o novo registro do blog de Paulo Henrique Amorim. A Nexxia sumiu. Na parte inferior da página, porém, aparece um número: # 4330799.

Clicando nesse número, a gente é direcionado para outra página. Nela, revela-se que o blog de Paulo Henrique Amorim estava em nome da Nexxy Capital Brasil Ltda., de Luiz Roberto Demarco.

O negócio fica ainda mais esquisito do que isso. Sabe como está registrado o domínio nexxy.com.br? Ele está registrado em nome da PHA Comunicação e Serviços S/C Ltda.

Nesse jogo de propriedades cruzadas, Paulo Henrique Amorim tem o domínio da Nexxy e a Nexxy tem o domínio de Paulo Henrique Amorim.

Tanto o blog de Paulo Henrique Amorim quanto o domínio da Nexxy foram registrados com o mesmo documento:
003.534.337/0001-77.

Uma rápida consulta no site da Receita Federal permite dizer que esse é o número de CNPJ da Nexxy. Paulo Henrique Amorim escondeu o homem da Lojinha do PT, mas ele continua lá, dando as cartas. Pelo menos até o momento em que redijo este artigo.

A internet é assim: basta uma clicada para alterar o próprio perfil, basta uma clicada para apagar a própria folha corrida.

Os blogueiros jornalistas podem criar uma nova identidade por dia. Mas sempre dá para descobrir quem manda neles. Entendeu, Tabatha?


Ela vai resistir?

Como a crise provocada pelo vazamento de informações sigilosas de gastos pessoais do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afeta o futuro de Dilma Rousseff, a candidata preferida de Lula para 2010

Ricardo Amaral

O fim do verão de 2008 deveria ser a temporada de maturação da candidatura da ministra Dilma Rousseff à Presidência da República.

Faltando pouco mais de dois anos para a eleição de 2010, Dilma ainda está longe de ser a candidata oficial à sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas ela é a “primeira da fila”, na definição de um colega do Planalto.

A poderosa chefe da Casa Civil passou as últimas semanas de março em favelas do Rio de Janeiro e em cidades do Nordeste, visitando obras e projetos ligados ao Plano de Aceleração do Crescimento (PAC).

À sombra da popularidade do presidente, que a chamou de “mãe do PAC”, Dilma deveria faturar politicamente o projeto de investimentos de R$ 500 milhões. Mas sua agenda política andou para trás, por problemas na retaguarda da Casa Civil.

A “mãe do PAC” terminou a semana sob a suspeita de ter sido a madrinha de uma engrenagem que pôs na rua informações sigilosas sobre despesas pessoais do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e da mulher dele, a professora Ruth Cardoso.

Trata-se de um maço de 13 folhas de papel, relacionando os nomes de Fernando Henrique e dona Ruth a gastos com aluguel de veículos, material de higiene pessoal, alimentação, bebidas e até lixas para unhas.

Não há na lista nenhuma despesa que possa ser considerada exorbitante para um ex-presidente da República e sua família, mas a legislação proíbe que esses gastos, feitos com dinheiro público, sejam divulgados.

A chefe da Casa Civil deveria ser a guardiã dos segredos que vazaram, e por isso está no primeiro lugar de uma outra fila – da linha de tiro.

Os papéis foram parar nas páginas da revista Veja – que acusou o governo de tê-los produzido para chantagear a oposição – e do jornal Folha de S.Paulo, que acusou a subchefe da Casa Civil, Erenice Guerra, de ter mandado reunir os dados sobre despesas de FHC e dona Ruth nos arquivos da Presidência.

A ministra nega que tenha feito qualquer coisa que possa ser chamada de um dossiê contra os adversários políticos (Clique aqui e leia a entrevista), mas admite que os papéis reproduzem dados que estavam sob sua responsabilidade.

“Temos uma base de dados sobre gastos da Presidência deste governo e do anterior”, diz a ministra. “Fantasiar isso como dossiê para chantagem é rebaixar o processo político.”

Ela abriu uma sindicância para apurar o vazamento e, numa conversa com o presidente Lula na noite da terça-feira, prometeu entregar a cabeça do responsável. “Não transforme esse caso num problema maior do que ele já é”, disse Lula a Dilma, de acordo com três outros auxiliares diretos do presidente.

A coleção de cabeças cortadas do governo Lula tem exemplares vistosos. Os ex-ministros José Dirceu, antecessor de Dilma na Casa Civil, e Antônio Palocci, ex-ministro da Fazenda, foram tão poderosos quanto Dilma ou até mais.

Ambos caíram debaixo de acusações pesadas e depois de ter recebido de Lula apoio e conselhos. Dilma será a próxima? A pergunta que se faz em Brasília é se ela conseguirá resistir, estando sob suspeita e sob o bombardeio da oposição.

Sobre as suspeitas, o Planalto argumenta que tinha a obrigação de organizar a relação de despesas deste governo e do anterior, mas não conseguiu ainda explicar por que foram à luz apenas as do período FHC.

A simples suspeita de que o governo teria usado a máquina pública para levantar informações contra adversários políticos é um problema enorme. “Isso é gravíssimo, é o Estado policial sendo instaurado pelo PT”, diz o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), de oposição ao Planalto.

“A acusação de montar dossiês não tem como colar na imagem da ministra, porque não combina com o perfil de pessoa séria que ela tem”, diz o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), aliado do Planalto. “O lugar que ela ocupa no governo, sua importância, é que explica o que está ocorrendo.”

A CPI Mista dos Cartões Corporativos, que caminhava para um tedioso zero a zero entre Planalto e oposição – ambos trabalhando para não revelar os gastos secretos do atual governo e do anterior – ganhou novo fôlego com o vazamento.

Na semana passada, numa tumultuada reunião que durou cinco horas, o Planalto fez valer sua maioria e derrotou, por 14 votos a 7, um requerimento convocando a ministra para esclarecer o episódio.

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso mandou carta ao Senado, abrindo mão do sigilo sobre suas despesas pessoais. A iniciativa é inócua, porque o sigilo protege a Presidência da República, não seus eventuais titulares, mas serviu para acossar politicamente o governo.

Ponto de vista: Lya Luft

"Minha mulher é uma santa"

"Mulheres que ‘perdoaram’ o marido e continuaram com ele – a não ser quando há um recíproco e real desejo de refazer a relação – têm no olhar uma tristeza como de viuvez que não se apaga"

Ilustração Atomica Studio

Nada país tem seus espantalhos. Aqui, figurões se esbaldam contratando bailarinas com cartões pagos por nós, os trouxas. Simples assim.

Nos Estados Unidos, flagrados em algo imoral (para eles), batem no peito em público, com a "santa esposa" ao lado. Por que essas mulheres reprimem a dor e a vergonha, apoiando o malandro diante de todos?

Pressões políticas das quais não sabem se esquivar? Medo da solidão? Melhor infeliz, mas casada? Aí a gente fecha um olho e fica desgraçada para sempre? Casamento pode ser uma doença a dois.

"Minha mulher é uma santa", dizem os puladores de cerca desde o tempo das cavernas. Essa figura da "santa" em casa é um mito a ser removido do nosso imaginário: quase sempre elas são acumuladoras de ressentimento e mágoa, que um dia, ou no dia-a-dia, se vingam até sem perceber.

Com cobranças, com acusações, ridicularizando o maridão diante de outros, jogando os filhos contra ele. E, se um dia houver uma separação, pobre do moço: sobre ele serão lançadas todas as fúrias possíveis.

A mim essa figura constrange tanto quanto a "santa" mulher exposta à violação do privado pelo público diante do seu país, o que aparece especialmente nos Estados Unidos.

Diante das câmeras sôfregas ou no segredo da casa, a mulher naturalmente perdoa, deve perdoar? Ainda é o que se espera dela? Consegue eventualmente perdoar e seguir a vida com esse parceiro, sem ressentimentos, corroendo a vida por baixo do tapete? E por que razões permanece com ele?

Há quem, sabendo-se traída, argumente curto e grosso: "Agora tenho sossego na cama". "Eu me vingo gastando os tubos", ou ainda: "É pelo bem dos filhos" (eles exigem o martírio materno).

Mulheres que "perdoaram" o marido e continuaram com ele – a não ser quando há um recíproco e real desejo de refazer a relação – têm no olhar uma tristeza como de viuvez que não se apaga.

E o parceiro, confiante na impunidade, já ocupado em novas aventuras, nem se dá conta disso, enquanto a mulher segue em frente, remoendo sabe-se lá que dúvidas, passando sabe-se lá que valores aos filhos, e que modelo às filhas. A mãe vítima é um peso do qual dificilmente hão de se livrar.

E quando esse drama vem a público, com mulheres firmes ao lado de quem enxovalhou amor, confiança e família, mas por apego a cargo ou poder bate no peito, assistimos talvez ao último degrau na descida ao inferno pessoal feminino.

Todo o esforço para que em nossa cultura a mulher se valorize anulava-se no rosto devastado junto ao atrapalhado dom-juan americano, campeão de hipocrisia, que ganhou a imprensa semanas atrás: ele fazia do combate à prostituição sua bandeira, mas era freguês de caderno de um caríssimo clube de alegres moças. Nem o nome ele precisava dar: era o Cliente Número Nove.

Flagrado, pediu desculpas e prometeu se comportar, como o moleque que roubou maçãs do quintal da vizinha. "Minha mulher é uma santa", há de dizer na roda de amigos. Mais um ser humano ferido de morte. Simples assim.

Lya Luft é escritora


29 de março de 2008
N° 15555 - Paulo Sant'ana


Retratação indevida

O pior é a gente estar certo e por imperativo de consciência, tendo sido convencido por outrem de que estava errado, retratar-se publicamente e pedir desculpas a quem se criticou.

Ainda bem pior é no dia seguinte ficar definitivamente comprovado que se estava certo e que a retratação que a gente fez, por isso, foi improcedente, e a pessoa criticada, amassada pela prova de que foi justamente criticada, não reconhecer publicamente que estava errada, depois de incrivelmente ter aceito a retratação da gente.

Aceitou a retratação como se não estivesse errada, sabendo que estava errada.

E, tendo sido provado que estava errada, faltou-lhe a grandeza de desculpar-se pelo agravo que sofreu quem foi obrigado pelas circunstâncias conhecidas a retratar-se.

No Livro dos Imortais, uma sub-bíblia judaica, está escrito que ser forte não é dominar os outros, ser forte é dominar-se a si próprio. Está também escrito nesse livro que ser sábio não é mergulhar nos livros e abeberar-se de todo o conhecimento.

Ainda está escrito no memorável livro que ser rico não é acumular cada vez mais riquezas. Ser rico é contentar-se com o que se tem.

E finalmente o que interessa: respeitável não é aquele que é respeitado pelos outros, mas sim o que respeita os outros.

Sendo assim, quem me ultrajou, permitindo que eu me retratasse - e eu só me retratei para não cometer uma injustiça a quem eu critiquei justamente - , embora eu tenha depois da crítica me convencido erradamente de que minha crítica era injusta, quem fez isso comigo não é respeitável.

Eu tenho uma sugestão à governadora Yeda Crusius para quando ela voltar da viagem.

A minha sugestão é que ela designe o vice-governador Paulo Feijó para arranjar a casa no Detran. Não estou absolutamente fazendo qualquer acusação à atual cúpula do Detran, acho que ninguém tem nada contra ela.

Mas é preciso resolver um monte de impasses no Detran, principalmente os motivos que levam ao preço extorsivo e inaceitável de uma carteira de motorista no Estado.

É preciso no Detran um estudo e uma ampla providência de alguém de fora do Detran para que se estudem os meios de baratear até a raspa do fundo da panela o preço absurdo que estão cobrando por uma carteira aos 3,5 milhões de motoristas gaúchos.

Exemplo de que tudo está errado: li esses dias que em vários Estados a carteira de habilitação custa mais barato que no RS porque é o próprio Detran que faz os exames práticos e teóricos junto aos motoristas, enquanto aqui no RS quem faz esses exames são intermediários postos na função sem licitação, alguns deles envolvidos no último escândalo.

O atual governador interino do RS é o homem ideal para fazer esse enxugamento administrativo e fiscal no Detran.

Peço ao secretário de Governo que mostre à governadora, quando ela voltar da viagem, essa minha sugestão.

Conversei esses dias com Paulo Feijó e ele me disse que está pronto para desempenhar qualquer missão necessária ou imprescindível no governo.

Então que seja onde a bola está picando para um chute forte: no Detran.

Ou a governadora engole e faz desaparecerem os defeitos estruturais do Detran ou o Detran engole a governadora.

Se a governadora enxugar o Detran, esta é a melhor e única forma que ela tem para declarar ao Rio Grande que, como é óbvio, condena tudo o que aconteceu naquele órgão.


29 de março de 2008
N° 15555 - José Pedro Goulart


O homem que não era bicho e o cavalo que não era homem

De modo que eu vinha guiando meu carro na rua, quando vi esse homem só de bermudas conduzindo uma carroça velha. Você não vê (ou se vê, é raro) pessoas dirigindo automóveis sem camisa, entretanto é comum homens conduzirem carroças assim - é um caso aceito. Como é aceito que índios andem despidos, ou padres usem saias.

O que não é aceito é que se maltratem animais nas ruas - especialmente nessa nossa época em que os bichos são protegidos por entidades constituídas para isso - e o homem chicoteava com vigor o cavalo que puxava a carroça.

Era um trabalhador na luta pelo pão de cada dia, o que poderia amenizar a situação. Mas aquilo dava pena, o animal estava judiado, quase pele e osso. Andava cabisbaixo, encilhado, amarrado, chicoteado.

Parei do lado da carroça, abri o vidro elétrico e com isso perdi um tanto do ar condicionado do auto. O calor que veio da rua incendiou minha alma que já queimava de indignação. Como não sou índio, eu estava completamente vestido; e como não sou padre também, não estava com uma saia arejada.

Mesmo assim, repleto de bons sentimentos, protestei. "É necessário bater nele desse jeito?". E lembrando algum aprendizado remoto na vida, conciliei: "Não dá para "mostrar" o chicote apenas?" O carroceiro me olhou e sorriu: "Ah, essa égua só anda a pau."

A situação piorou: o cavalo era uma guria. Uma moça. Ou ainda, uma senhora. Quem sabe não terá tido filhos, outros cavalos que andam por aí a puxar carroças e serem chicoteados.

Me deu vontade de brigar com o sujeito, mas o sorriso dele, compreensivo com meu arroubo, me desconcertou. Ele que não tinha vidro elétrico nem ar condicionado.

Talvez num ato alucinado, desmedido, eu pudesse fazer-lhe uma proposta pela égua: passar a cuidar dela, dar banho, comida e, mais do que tudo, carinho.

Era uma idéia maluca mas corajosa, aquela. Um movimento contrário à onda implacável e cruel do nosso destino de dor e morte. Afinal: "Há sempre uma loucura no amor.

Mas há sempre um pouco de razão na loucura", como disse Nietzsche. Aliás, reza a lenda que ele terminou de enlouquecer (terminou porque ele já vinha derretendo os fusíveis há tempos) quando viu um homem açoitando um cavalo na rua.

Mas eu, sem sequer me dar o direito de endoidar, desisti. Chicoteei o pedal do acelerador e com isso acionei os mais de cem cavalos do motor do meu carro e me mandei dali. Deixando a égua, o sujeito, e aquela fatia de vida miserável para trás.

"Até os mais corajosos (e nem é o meu caso) raramente têm a coragem para aquilo que realmente sabem".

Essa também é do bigodudo.


29 de março de 2008
N° 15555 - O Prazer das Palavras
Cláudio Moreno


Quantas palavras?

Em meio aos balões e docinhos de um aniversário de criança, fui apresentado a uma risonha senhora que, muito faceira, declarou ser leitora fidelíssima desta coluna e, ato contínuo, sem tir-te nem guar-te, desferiu a pergunta que trazia engatilhada: quantas palavras, a meu ver, uma pessoa deve saber para se considerar razoavelmente culta?

Eu, que estava em animado diálogo com um incomparável cachorrinho-quente de festa, com seu molhinho cheio de reminiscências proustianas, prometi, encabulado, que dedicaria ao tema o próximo O Prazer das Palavras, que vem a ser o de hoje.

Confesso que eu próprio, há alguns anos, andei tentando determinar, com um mínimo de precisão, o que poderia se considerar um vocabulário satisfatório para alguém que conclui um curso superior.

Quantas palavras ele deveria conhecer? E um professor como eu, que leciona e escreve há tanto tempo, quantas palavras guarda em seu depósito?

Pois quanto mais perguntava, quanto mais pesquisava, mais me convencia de que é impossível chegar a uma cifra aceitável; basta dizer que lingüistas famosos, ao fazerem estimativas sobre o léxico que um profissional recém-formado deve dominar, sugerem números que vão de escassos 12.000 a espetaculares 70.000 vocábulos.

Essa discrepância impressionante de opiniões tem justificativas bem concretas. Em primeiro lugar, não sabemos se aqueles cientistas levaram em conta, para seus cálculos, o vocabulário ativo ou o vocabulário passivo.

O primeiro, sempre menor, é composto daquelas palavras que me vêm à mente quando escrevo ou quando falo; o segundo é formado pelas palavras que reconheço no texto ou na fala das outras pessoas.

Quem estudou uma língua estrangeira sabe muito bem que o segundo, o passivo, chega a ser duas ou três vezes maior do que o ativo.

Em segundo lugar, o meu léxico não se resume a uma lista, maior ou menor, de palavras, mas inclui também - e é esse o fator que acaba com qualquer precisão nas estimativas - um estoque de elementos mórficos do nosso idioma (sufixos, prefixos, radicais gregos e latinos), bem como as regras que me permitem combiná-los.

É esse "saber" que me possibilita decompor, facilmente, o significado de palavras que eu jamais tinha visto antes (e que não faziam parte, portanto, nem do meu vocabulário passivo).

Como já estou acostumado ao radical grego filo ("amigo, apreciador"), que enxergo em pedófilo e cinéfilo, meu olho nem pisca quando leio, no jornal, que "bochófilos argentinos, chilenos e uruguaios vêm participar de um torneio em Venâncio Aires".

Depois que o cacerolazo argentino foi editado aqui com o nome de panelaço, o sufixo "-aço" ganhou também esse significado de "manifestação de protesto", produzindo-se, em seguida, bandeiraços, apitaços, tratoraços e sinetaços -

o que me permite entender também o que sejam os beijaços, sessões de beijocação indiscriminada que o movimento gay vem patrocinando, em vários pontos do país, como forma de repúdio ao não-reconhecimento da união legal entre homossexuais.

A rigor, essas palavra não estavam registradas em meu vocabulário, mas assim mesmo eu decifrei instantaneamente seu significado.

E aí? Elas entram no nosso cálculo? Certamente meu leitor deverá ter percebido que temos aqui um saco sem fundo, já que o número dessas palavras potenciais é praticamente infinito.

Quem possui um estoque básico de elementos gregos e latinos, por exemplo, vai decifrar muitas combinações no momento em que as vir pela primeira vez.

Para que meus alunos do curso de Direito se dessem conta disso, eu costumava resolver pequenas equações morfológicas: se hipopótamo significa, literalmente, "cavalo do rio", e meso significa "no meio", fica claro por que se chamava de Mesopotâmia a região entre os rios Tigre e Eufrates- e por que a região de Entre Rios, entre o rio Uruguai e o Paraná, é conhecida como a "Mesopotâmia argentina".

Era um desafio ao raciocínio e à dedução, mas, é claro, nem sempre produzia o resultado esperado. Uma questão de prova tinha o seguinte enunciado: "Se misógino é o que tem aversão às mulheres, e bígamo o que casa duas vezes, o que seria um misógamo?".

Dois ou três iluminados acertaram: "aquele que tem aversão ao casamento" - mas os demais demonstraram um esforço comovente e uma criatividade delirante:

"o que casa duas vezes com a mesma pessoa"; "quem não consegue casar"; "o casamento entre duas pessoas do mesmo sexo"; "alguém que detesta ter uma só esposa";

"quem casa com parente"; "uma pessoa com duas personalidades"; "quem casa com pessoa de raça diferente"; e, por fim, mas não menos estarrecedor, "quem contrai meio casamento". Bem, não digam que eu não tentei... Mas o tema continua.


29 de março de 2008
N° 15555 - Cláudia Laitano


Você não está sozinho

No início dos anos 90, uma pequena grande banda chamada R.E.M. gravou a música Everybody Hurts - algo como "todo mundo sofre".

A letra, simples e eficiente, lembra que as dores vão e vêm - e que por mais solitária que pareça uma experiência de infelicidade, ela é inevitavelmente compartilhada por boa parte da espécie: "Segure a onda/ Todo mundo sofre/ Você não está sozinho".

Essa canção doce e triste, que desde então tem servido de conforto em momentos difíceis para fãs de todas as idades, foi originalmente composta mirando o público adolescente.

Não os garotos de propaganda de refrigerante, sempre sorridentes e com a chapinha em dia, mas aqueles de carne, osso e espinhas, que enfrentam com dificuldade as mudanças e os novos desafios que vêm com o fim da infância.

Quem já teve 15 anos sabe como nessa etapa da vida é difícil colocar idéias e sentimentos sob perspectiva, entender que tudo que parece definitivo e absoluto, e às vezes doloroso, tende a não ser tão grave assim.

O clipe da música, outro pequeno clássico pop, mostra pessoas trancadas em um congestionamento, absorvidas por seus dramas cotidianos, cercadas de gente e ao mesmo tempo isoladas. O alvo eram os jovens, mas adultos de qualquer grande cidade identificam a cena. A solidão urbana é quase tão universal quanto as crises da adolescência.

"Você não está sozinho" parece voltar a dizer Michael Stipe, vocalista e compositor do R.E.M, ao falar publicamente de sua homossexualidade em uma reportagem publicada na semana passada na revista americana Spin.

Para quem acompanha a carreira da banda, a revelação não é exatamente surpreendente - muito pelo contrário. Mesmo assim, durante anos Michael Stipe foi cobrado por não fazer uma declaração pública explícita como essa que foi publicada agora pela revista.

Em parte, pela curiosidade maliciosa que cerca a vida de todas as celebridades - especulações sobre a vida sexual dos famosos fazem sucesso desde os tempos de Cleópatra - , mas também pelo significado simbólico de uma declaração desse tipo.

Aos 48 anos, o cantor admitiu que apenas agora chegou à conclusão de que falar de um assunto privado poderia ser importante para outras pessoas: "Hoje eu reconheço que ter figuras públicas que falem abertamente sobre sua sexualidade pode ajudar algum garoto, em algum lugar".

Em uma época em que anônimos e celebridades fazem da exposição da vida privada quase um gênero paralelo de ficção, a entrevista de Michael Stipe poderia soar banal - assim como a da atriz Jodie Foster, também assumindo a homossexualidade em público pela primeira vez, em dezembro do ano passado.

Mas para aqueles artistas que preferem se impor pelo trabalho e não pelas peripécias da vida particular, revelações desse tipo nunca são banais. E se justificam apenas quando servem a um propósito que ultrapassa suas trajetórias individuais.

Com suas declarações, Michael Stipe e Jodie Foster ajudam a desmistificar uma condição que pode trazer sofrimento para adolescentes e suas famílias quando faltam esclarecimento e empenho para lidar com a questão de forma honesta e natural.

Às vezes, um simples "você não está sozinho" pode fazer toda a diferença.

sexta-feira, 28 de março de 2008


JOSÉ SIMÃO

Buemba! Buemba! O Tibete vira Tabefe!

E eu já tenho a minha equipe olímpica! Fafá de Belém: natação 50 metros de peito

BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!

Direto do País da Piada Pronta! Breaking News! Ana Maria Braga faz descoberta inseto-mosquitológica: "O mosquito da dengue MORDE umas dez vezes".

O mosquito tem dente. Ele morde! Só falta pendurar uma plaquinha no mosquito: "Cuidado, mosquito anti-social".

E sabe por que o Lula deu carta branca pro Jobim? Porque ele não conseguiu escrever! Vai em branco mesmo. Carta branca, dava muito trabalho escrever!

E como disse o chargista Luscar: o Tibete vai mudar de nome pra Tabefe! Não é mais Free Tibete, agora é Tabefe Free! E eu já tenho a minha equipe olímpica! Pra deixar a China no chinelo!

Fafá de Belém: natação 50 metros de peito. Clodovil: frescobol e salto com vara. Maluf e Renan: assalto ornamental. Alexandre Frota: pênis de mesa!

E um leitor me disse que o Brasil vai ser campeão olímpico de boxe: um assalto a cada três minutos. Rarará! DEIXA A CHINA NO CHINELO!

E no Rio, que estão vendendo 30 raquetes elétricas por dia nos faróis. Pra matar mosquito!

Vão ter que chamar o Guga pra dar aula de tênis. É o personal dengue player! "Manhê, dei um ace e matei dez mosquitos".

Não teve o advento do iPod? Agora tem o advento da raquete elétrica! É ótima pra dar em marido que enche o saco. POW!

E a manchete que eu queria ler: "Mosquito da dengue pega febre amarela". É tudo doença de antigamente! Precisa consultar médico com mais de 80 anos!

Só falta o Brasil ter epidemia de amarelão e barriga d'água. Já se imaginou de barrigona d'água e todo amarelo?

É mole? É mole, mas sobe! Ou como disse aquele outro: é mole, mas trisca pra ver o que acontece! Antitucanês Reloaded, a Missão.

Continuo com a minha heróica e mesopotâmica campanha "Morte ao Tucanês". Acabo de receber mais um exemplo irado de antitucanês.

É que Porto Alegre tem o Centro Espiritualista da Santa Umbanda Cristã! Isso que é ecumênico! Mais direto impossível. Viva o antitucanês! Viva o Brasil!

E atenção! Cartilha do Lula. Mais um verbete pro óbvio lulante. "Amarelão": companheiro que vê um mosquito e amarela. Rarará!
O lulês é mais fácil que o inglês.

Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje, só amanhã. Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno! E vai indo que eu não vou!

simao@uol.com.br

NELSON MOTTA

Amigo é para essas coisas

VITÓRIA - A tolerância, a lealdade e a compaixão estão entre as mais nobres virtudes humanas.

Aceitar e perdoar os erros dos amigos, ser solidário com os que caem, compreender as fraquezas alheias, são atitudes que engrandecem a existência e contribuem para tornar a vida menos dura, pela aceitação das diferenças e da precariedade da condição humana.

Um amigo pode ser solidário com quem cometeu um crime. Pode e deve ajudá-lo a se levantar. Um presidente da República jamais.

Com a autoridade e a credibilidade do cargo, não pode aceitar, justificar ou apoiar nenhuma forma de crime e de desrespeito à lei e ao Estado de Direito.

Esbravejando num palanque, o presidente parecia um líder sindical se solidarizando com o companheiro demitido pelos patrões gananciosos e cruéis. Mas falava de Severino Cavalcanti.

Foi o próprio Lula quem disse há uma semana: "o presidente não pode mentir". Mas disse várias mentiras sobre Severino.

O rei do baixo clero não foi eleito pela oposição, mas, principalmente, pela base aliada, que, dividida entre dois candidatos inviáveis, abriu caminho para sua improvável vitória.

Severino também não foi derrubado pela oposição, nem pelas elites. Caiu sozinho, de podre, ao ser provado publicamente que recebia um mensalinho do dono do restaurante da Câmara.

As elites de São Paulo, que convidavam Severino a dar palestras ( pagas?) toda semana, agora nem o cumprimentavam, acusou Lula, indignado. Pobre Severino, usado e abusado pelas elites paulistas, certamente porque era nordestino.

Lula poderia ser mais amigo ainda e nomear um deputado do PR de Pernambuco para uma bocada federal ou estatal, abrindo vaga para o suplente Severino voltar triunfalmente à Câmara que tanto aviltou.


Alma porto-alegrense

No dia do teu aniversário penso na tua alma, Porto Alegre. Levito até o topo do Morro Santa Teresa e converso com o busto do Carlos Nobre, que deveria ter cópias na Praça Garibaldi e em outros locais.

Carlos Nobre é uma das melhores caras de Porto Alegre. Nossa cidade tem mais de milhão e quinhentas mil almas, de muitas cores e origens.

Alma polaca no quarto distrito, campeira no Parque Marinha (nossa estância urbana), israelita no Bom Fim, italiana na Vila Nova e lá por tudo, alemã no Centro, Moinhos, Floresta e outros bairros, açoriana e espanhola no Centro e espraiada por todos os lados, negra no Rio Branco, japonesa e chinesa por aí e alma gaúcha interiorana pairando sobre tudo, costurando todas e dando uma espécie de unidade ou liga à nossa rica diversidade anímica.

Porto Alegre é uma açoriana tímida? Uma pequena cidade grande que já foi uma grande cidade pequena?

É, ainda, uma carroça provinciana? Uma metrópole com jeito de interior, especialmente na Zona Sul? Para muitos, nossa cidade já é o mundo. Ou, pelo menos, a melhor parte do mundo, modéstia à pqp.

Na Padre Chagas e adjacências, português, espanhol, inglês, francês, alemão e outros idiomas tocam nossos ouvidos globalizados enquanto nossos olhos sortudos se arregalam para curtir a beleza, a inteligência e a elegância das gaúchas, as mulheres mais lindas do mundo.

Nessa época, elas ainda vestem poucas roupas leves e desfilam peles de tom caramelo, dourado, chocolate ou mel, provando que Deus e outras transcendências existem, sim, no paralelo trinta.

Enfim, Porto Alegre é tipo uma gauchinha jovem, plasmada com sangue índio, negro e europeu, ainda meio recatada, de apenas duzentos e trinta e seis anos, ligeira da cabeça e das pernas, que anda de carroça ou de conversível pelo velho Centro e por todos os bairros, com seu note, seu GPS, seu MP4 e outros trique-triques modernos, falando várias línguas, fazendo negócios internacionais enquanto canta o Hino do Rio Grande e Querência Amada, nosso hino extra-oficial, e outras canções do mundo.

Porto Alegre foi, é e será muito. Muito demais. Isso não somos só nós a dizer isso. Deixamos, com muito orgulho, pessoas anônimas e célebres, espertas, ilustradas e seletivas, grandes almas e cabeças, falarem bem da gente, enquanto saboreiam o melhor churrasco do planeta.

De nosso clima (tirando abril e outubro), do trânsito, da segurança, dos buracos das ruas, de nossas múltiplas divergências e peleias tipo Grenal e de uns outros lances e assuntos chatos não falo hoje, não insiste!

Capaz que vou me prestar para ficar aí melando, empatando e estragando a festa. Bah, mas é bem capaz!!!! Mas amanhã, te prepara, que aí a gente conversa forte!!

Jaime Cimenti

Feliz Sexta-feira e um excelente fim de semana.


Jaime Cimenti
28/3/2008


Canto de amor à Espanha

O romance La bodega é, acima de tudo, um grande canto de amor à Espanha e um tributo às qualidades do país de Picasso, Dali, Dom Quixote, Goya e de vinhos imortais. Noah Gordon, o autor, nasceu em 1926, em Worcester, Massachussets, e suas obras já foram lidas por mais de nove milhões de pessoas em todo o mundo.

Depois de curta permanência no exército norte-americano, do qual saiu quando a II Guerra Mundial chegou ao fim, pensou em estudar medicina, mas acabou dedicando-se ao jornalismo. Aos trinta e nove anos de idade, lançou seu primeiro livro, o romance O Rabino, que se tornou best-seller do New York Times.

A trilogia composta por O físico, Xamã e A escolha da Dra. Cole, publicados entre 1988 e 1995, mereceu prêmios internacionais e consagrou Gordon como um mestre nas narrativas sobre a condição humana e temas históricos.

La bodega, lançado há poucos dias entre nós, relata o caminho iniciático percorrido por um jovem viticultor durante as guerras carlistas.

Ambientado na turbulenta Catalunha do século XIX, mostra o protagonista, Josep Alvarez, ainda muito jovem e às voltas com o amor, as intrigas políticas e o trabalho duro, fazendo-o amadurecer precocemente.

Depois de participar, a contragosto, de um complô que fará com que o agitado cenário político catalão se convulsione ainda mais, Josep foge para a França, onde trabalha como camponês para um viticultor.

O tempo passa e ele fica sabendo da morte do pai. Mesmo temendo cair nas mãos da justiça espanhola, decide voltar à terra natal.

Toma posse da propriedade paterna, luta contra muitos fatores, entre eles a praga da filoxera, que arrasa os vinhedos. Nesse ambiente o personagem central vai empreender seu grande projeto: a elaboração de um bom vinho. Os conhecimentos adquiridos na França vão ajudar.

Os habitantes do povoado de Santa Eulália, às margens do rio Pedregós, vão lhe acompanhar: a jovem viúva Mar del Mar e seu filho Francesc; Nivaldo, o merceeiro de origem cubana; e Donat, o irmão operário, entre outros.

Para escrever o romance, Gordon visitou vinhedos, conversou com moradores da região rural catalã e fez ampla pesquisa sobre a guerra que sacudiu o nordeste espanhol no fim do século XIX.

O romance traz os ingredientes que fizeram de Noah Gordon um escritor de renome mundial: personagens fortes, bem-construídos, ampla pesquisa histórica, cenários deslumbrantes ricamente descritos e retratos fidedignos de época.

La bodega foi lançado na Espanha com tiragem de 200 mil exemplares em outubro de 2007 e, não por acaso, desde então encantou os leitores espanhóis e aparece nas listas dos mais vendidos do país. Tradução de Pinheiro de Lemos, 328 páginas, R$ 39,50. Editora Rocco, telefone 21-3525-2000.


28 de março de 2008
N° 15554 - Paulo Sant'ana


A força do elogio

Está em Porto Alegre uma equipe da TV Globo, em intercâmbio com a RBS TV, constituída de diretores e jornalistas.

Entre eles, o diretor coordenador de jornalismo entre a Globo e suas afiliadas, Marco Antônio Rodrigues.

Diante de jornalistas da Globo e da RBS, no prédio da nossa televisão, ontem, Marco Antônio fez o seguinte pronunciamento: "A televisão brasileira é muitas vezes dominada por uma mesmice. Todos ou quase todos fazem tudo igual.

É muito saudável que se tenha encontrado aqui em Porto Alegre um comentarista, de televisão, Paulo SantAna, que se distancia da mesmice e apresenta no Jornal do Almoço um comentário original e criativo".

Este parecer me calou profundamente. Não só porque seu autor é uma pessoa conhecedora do metiê, um diretor prestigiado da TV Globo, mas também porque foi um elogio nascido no meio de televisão, onde são raros os elogios.

Cheguei a dizer ontem no meu quadro do Jornal do Almoço que nunca se deve sonegar um elogio, que o elogio é o maior de todos os salários. Salário é dinheiro, dinheiro na mão é vendaval, enquanto que elogio é tesouro precioso na arca das minas do Rei Salomão.

Eu disse ainda mais: por falar em salário, deve-se reajustar o elogio, deve-se pagar 13º de elogio, deve-se descontar Fundo de Garantia em elogio, todos os direitos trabalhistas devem ser pagos em elogios.

E disse eu mais ainda: nós devemos sempre tributar elogios às pessoas que nos cercam, claro que quando considerarmos que elas os merecem.

Temos de elogiar os nossos filhos, os nossos pais, os nossos parentes, os nossos amigos, os nossos superiores, os nossos subalternos.

Temos de elogiar sempre quem tenha de ser elogiado, para incutir-lhes entusiasmo de viver, coragem, para estimulá-los. Não há forma de mais atirar as pessoas ao progresso pessoal, ao desenvolvimento profissional, à solidariedade, à afetividade, que com o elogio.

E disse que nunca temos de ter pudor de elogiar alguém, nunca pode o elogio ficar trancado na nossa laringe ou esbarrar "no molambo da nossa língua paralítica", tem de jorrar pelos nossos lábios e iluminar os corações, as mentes, os espíritos das pessoas que merecem nossos elogios.

O elogio é a moeda corrente da vida.

Esse menino de 16 anos, de Novo Hamburgo, que matou 12 pessoas, matou-as por rusgas, por desentendimentos, por motivos banais.

O último homem que ele matou foi com 20 tiros. Ou seja, era banal para ele matar.

Eu nunca entendi só uma coisa na vida, além dos desígnios das mulheres, a fúria assassina.

E cada vez mais me brutalizo porque me atiro à tese de que uma fera dessas não pode continuar viva.

Uma fera dessas não tem recuperação. É preciso exterminá-la do meio social. É certo que este menino vai matar outro tanto ou um triplo mais de pessoas.

Há que matá-lo. Há que modificar a lei para poder matá-lo. Matá-lo sem dor, mas matá-lo.

Quase me envergonho por ter recuado nos últimos anos da minha convicção contra a pena de morte.

Mas tem de eliminar um lobo enlouquecido desses.

Com uma injeção, ou pela forca. Mas urge modificar a lei.

E, quando for assim grave a imputação, tem de se chegar ao pescoço da fera.


28 de março de 2008
N° 15554 - David Coimbra


Medo de raio

Estava instalado atrás da minha mesa na redação do Jornal da Manhã, em Criciúma, pensando nas sutilezas do ponto-e-vírgula, quando aquele casal de gordos entrou pela porta. Antes que alguma ONG protetora dos gordos se ourice, esclareço que estou apenas descrevendo os dois. Podia ser um casal de baixinhos, ou de alemães muito brancos, ou de magricelas.

Não era. Era de gordos. Não lembro da roupa do gordo, faz tempo isso, mas a gorda usava um vestido floreado. Tinha muitas flores no vestido da gorda, flores amarelas e tudo mais. Pararam defronte à mesa.

O gordo me estendeu uma mão gorda, apresentou-se como jornalista e disse que queria trabalhar. Coincidentemente, havia uma vaga de repórter, então combinei com o gordo de fazer um teste com ele durante alguns dias. A primeira pauta que lhe dei foi sobre raios.

Por algum motivo, caía um monte de raios em Criciúma, atingindo algumas pessoas, inclusive. O gordo saiu para fazer a matéria e, no fim da tarde, voltou chateado.

- Gostaria que essa matéria não saísse - miou.

Perguntei qual o motivo daquela estranha reivindicação, e ele respondeu que a mulher dele, a gorda, tinha muito medo de raio e, pelo que havia apurado, o bairro no qual moravam era justamente o mais atingido pelas descargas.

- Se ela ler essa matéria, vai querer sair de lá - alegou.

Olhei para ele por um momento e depois disse:

- Cara, faz a @%$¨&¨% da matéria.

Na manhã seguinte, cheguei ao jornal e a gorda estava lá, braba dentro do vestido floreado.

- Essa matéria dos raios! - ralhou.

Não dei bola. Fui trabalhar. Mais tarde, passei pela sala onde o gordo devia estar e vi a gorda sentada diante da máquina, escrevendinho. Chamei o gordo:

- Que que a tua mulher está fazendo?

- Está escrevendo a matéria.

Mal acreditei:

- Tu é quem tem que fazer a matéria!

Ele acedeu. Mas, no outro dia, entrei na redação e quem encontro sentada à máquina, batendo furiosamente nas teclas com seus dedos roliços? A gorda de vestido floreado. Levei o gordo para um canto:

- Meu, não pode isso de a tua mulher trabalhar por ti!

Ele concordou. Só que, um dia depois, lá estava a gorda com aquele vestido, escrevendo a matéria do gordo. Irritei-me. Peguei o gordo e:

- Por que é que tu não manda a tua mulher pra casa???

Ele torceu as mãos e ciciou:

- Porque lá cai raio...

Tive que dispensar o gordo. Nunca mais o vi, mas sempre lembro dele, quando saem os índices de desemprego no país. Porque hoje o problema do Brasil não é o desemprego. É a falta de qualificação dos candidatos a emprego.

Existem vagas, para quem está preparado, mas grande parte da população brasileira é composta por analfabetos funcionais, por gente que lê, mas não entende, por ignorantes de todos os quilates, que não sabem em que mundo vivem.

O velho problema: a Educação. Ou a falta de. Foi difícil preencher aquela vaguinha no Jornal da Manhã, não aparecia ninguém muito melhor do que o gordo. Deveria mesmo era ter contratado aquela mulher dele.

quinta-feira, 27 de março de 2008



Outras Cores de Porto Alegre

Fotografia Gilberto Simon e Ricardo Zanella

A mostra marca as comemorações dos 236 anos de Porto Alegre. Composta por 40 fotografias produzidas por Gilberto Simon e Ricardo Zanella a mostra exibem detalhes de prédios históricos e monumentos, em cores, preto e branco e sépia.

Revelar ângulos inusitados para a maoria das pessoas é a proposta dos fotógrafos na mostra Outras Cores de Porto Alegre.

Outras Cores de Porto Alegre estréia no Mercado Público, 28 de março até 05 de abril.

ELIANE CANTANHÊDE

O olho da cara

BRASÍLIA - Deveras interessante a posição do PMDB de recomendar aos governadores e dirigentes estaduais e municipais do partido alianças prioritárias com o PT e os partidos aliados ao Planalto nas eleições das prefeituras.

Excelente aposta para um partido que é o mais enraizado no país, tem sete governadores, as maiores bancadas parlamentares, uma marca ainda hoje identificada com as velhas boas causas e... nenhuma perspectiva de subir a rampa do Planalto.

Antes, pendurava-se no PSDB. Agora, pendura-se no PT. Ou melhor, em Lula, na sua enorme popularidade e nas suas boas perspectivas -reais, apesar de ainda não registrada pelas pesquisas- de fazer o sucessor em 2010.

É assim que o PMDB se eterniza no poder, pegando carona não nas vitórias de um outro partido, mas sim na gangorra entre PSDB e PT. E com destaque.

Vide o Pará, onde quem se elegeu foi a petista Ana Júlia, mas as informações que vêm de lá dizem que quem manda é o peemedebista Jader Barbalho. Vide São Paulo, onde a candidata será a petista Marta Suplicy, à beira de ceder à conveniência pragmática de uma aliança com Orestes Quércia.

E na Bahia? O PT fez bonito. Venceu as eleições para o governo do Estado nos últimos minutos e chegou ao Palácio de Ondina com o baiano-carioca Jaques Wagner.

Mas tudo indica que o grande beneficiário do ocaso do carlismo não será exatamente o PT, e, sim, o PMDB de Geddel Vieira Lima -o mais tucano dos peemedebistas no governo FHC, o mais petista dos peemedebistas no governo Lula. E ministro da Integração Nacional.

Atenção Ricardo Berzoini, contrário à aliança PT-PSDB em Minas: o poder tem custado caro a tucanos e petistas, mas o que custa o olho da cara é a disputa cruenta entre ambos. PT, PMDB e DEM (que tem lado) perdem. O PMDB, que vai para onde o vento sopra, se dá bem. E como!

elianec@uol.com.br

CLÓVIS ROSSI

Desigualdade secular

SÃO PAULO - Peço licença ao bom ministro Fernando Haddad para discordar de sua avaliação de que o grande nó da educação no Brasil é o ensino médio. É um nó, sim.

Mas o grande problema está na desigualdade social e seu reflexo na educação. Pior: a desigualdade, ao contrário do que diz a propaganda oficial, não diminuiu no governo Lula.

Em alguns pontos, aliás, até aumentou. Exemplo: a taxa de analfabetismo na população de 15 anos ou mais era, em 2005, de 19,4% entre os 20% mais pobres e de 1,5% entre os 20% mais ricos. No ano seguinte, aumentou o analfabetismo entre os 20% mais pobres (para 20,8%) e aumentou também, mas menos, entre os 20% mais ricos (para 1,8%).

Consequência: a desigualdade em pontos percentuais subiu, de um ano para outro, de 17,9 para 19. São dados que surgem do estudo "As Desigualdades na Escolarização no Brasil", preparado pelo Comitê Técnico do Observatório da Equidade, criado pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência (não é, portanto, da "mídia golpista").

O número de fevereiro de "Desafios do Desenvolvimento" (editada pelo Ipea, Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas) antecipa números, como sempre chocantes.

O espaço não permite resgatar a maioria deles, mas vale citar o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, elaborado pelo MEC de Haddad, que estabelece a meta de os alunos alcançarem pelo menos 6 pontos (numa escala de 0 a 10) em 2021.

Resultado: os alunos de escolas públicas alcançam 3,6 pontos, ao passo que, na escola privada, a média é 5,9, quase na meta.

Conclui a revista: "Quem tem condições de pagar uma escola privada já está em 2021". Quem não está, fica no século passado. Como educação é talvez a mais vital alavanca para reduzir desigualdades, tem-se que elas só podem eternizar-se.