sábado, 15 de março de 2008



16 de março de 2008
N° 15542 - Paulo Sant'ana


Nós, os medíocres

Nós, os medíocres, somos a alavanca do mundo. Não porque sejamos destacados, mas porque somos numerosos, somos a maioria esmagadora.

Medíocre não quer dizer burro nem nulidade. Medíocre se refere a médio.

Eu, por exemplo, não me ofendo quando me chamam de medíocre. Porque tenho bem consciente que com relação a Freud, a Einstein e a Shakespeare eu sou medíocre.

Eu me ofenderia se me chamassem especificamente de medíocre com relação a Hugo Chávez.

Bem, mas os medíocres são o sal da terra. Há entre os medíocres uma espécie nojenta: a dos invejosos. Não os ciumentos, que estes não são repelentes, pelo contrário, os ciumentos são amoráveis, são seres repletos de sensibilidade. Porque o ciúme só pode existir num coração que tem amor. Ou pelo menos admiração cativa.

Mas os invejosos são erva daninha. Eles se unem para atacar os que são superiores sob qualquer aspecto a eles. Se unem estrategicamente, porque sozinhos não metem medo a ninguém.

Os invejosos, unidos, metem medo porque atacam como atacam os formigueiros, em massa, levando tudo de roldão.

Saindo um pouco da subespécie dos invejosos, voltemos ao tronco principal dos medíocres.

Os medíocres se dividem entre os medíocres humildes e os medíocres petulantes. Os medíocres humildes têm consciência da sua mediocridade e se aquietam. Ficam na sua. Não se metem em briga de cachorro grande.

Já os medíocres petulantes se revelam teimosos com as pessoas brilhantes e as enfrentam com estóica coragem, vão para cima dos brilhantes envergando a couraça da estupidez ou da incapacidade inalterável que têm para raciocinar.

Aí um parêntese: há pessoas que pensam somente. E há pessoas singulares que, além de pensarem, raciocinam.

Chega a ser lamentável a incapacidade de muitos medíocres de raciocinar.

Há casos de medíocres que escrevem todos os dias em jornais há 30, 40 anos, ou falam em microfones, ou dão aulas nas universidades, ou se destacam em seus meios de atividades quaisquer, de quem as pessoas que as cercaram ou as ouviram nesses anos todos não guardaram nunca uma só frase, um só raciocínio.

São os medíocres lineares: eles nunca tiveram um rasgo, um lampejo, um fulgor.

São os medíocres que só vieram à Terra para cumprir o carnê.

São os medíocres que não marcaram, que não se distinguiram. Mas não marcaram nem se distinguiram uma só única vez.

Mas são pessoas que vivem, que criam seus filhos, que são justas, são retas, são cumpridoras de seus deveres, recebem medalhas de reconhecimento.

Mas são tristemente medíocres.

Porque a face do planeta foi talhada para receber os medíocres.

Eu também sou medíocre. Não posso me comparar a um Michelângelo, a um Gandhi, a um Machado de Assis, a um Pelé, uma Madre Teresa de Calcutá. A um Leonardo da Vinci. Sou medíocre comparado a esses.

Mas a diferença é que sou um medíocre, modéstia à parte, com sazonalidades de gênio.

Algumas frases minhas são recitadas diariamente por passantes e sentantes da Rua Padre Chagas.

Eu estou no rebanho dos medíocres, mas sou uma rês que por vezes se destaca na disparada da boiada.

E é por isso que não raro me atinge o laço firme do boiadeiro. E é por isso que certamente vou para o matadouro antes do grosso da tropa.

Só imploro que não me abatam a marteladas.

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