segunda-feira, 25 de agosto de 2008


MOACYR SCLIAR

A vingança do homem invisível

A invisibilidade, sobretudo para os baixinhos humildes, é uma promessa de excitantes aventuras

Grupo cria material para invisibilidade. Quando a personagem Mulher Maravilha apareceu em gibis pela primeira vez, pilotando um avião invisível, em 1942, a tecnologia para anular a imagem de um objeto ainda era algo impensável.

Um estudo agora publicado, porém, mostra que a tarefa já é possível. Construir aquela aeronave, que saiu dos quadrinhos para se tornar o sonho dos militares, pode ser agora só uma questão de tempo.

Projetando um material especial que é capaz de desviar raios de luz de uma maneira inusitada, um grupo de pesquisadores da Universidade da Califórnia obtiveram, pela primeira vez, um objeto capaz de dobrar a luminosidade "para trás", criando a invisibilidade. Folha Ciência

A VISADO de que muitas empresas estavam interessadas na nova tecnologia da invisibilidade, o pessoal do laboratório resolveu apressar o ritmo das pesquisas.

Trabalharam dia e noite e por fim conseguiram o seu objetivo: uma espécie de vestimenta que cobriria uma pessoa da cabeça aos pés e que, desviando qualquer luminosidade, tornaria essa pessoa invisível.

Tarefa terminada, era preciso experimentar o invento. Por causa do alto preço do material, a vestimenta era relativamente pequena. Nenhum dos cientistas que ali estavam poderia vesti-la. Foi então que eles se lembraram do servente do laboratório.

Era um homem já de certa idade, muito simples, muito humilde -e baixinho. Tão baixinho e tão humilde, que a equipe o chamava de Anãozinho. Ele não dizia nada; aliás, nunca falava.

Fazia o seu trabalho em silêncio e ia para casa. Mas agora, disse o chefe do laboratório, o Anãozinho teria o seu momento de glória, na qualidade de primeiro ser humano a se tornar invisível.

Para surpresa de todos, o servente recusou. Ele, ficar invisível? De maneira nenhuma; era uma idéia que lhe causava imenso pavor.

Foram inúteis as explicações dos cientistas, segundo as quais a invisibilidade era apenas transitória; ele ficaria visível tão logo tirasse a roupa.

O Anãozinho simplesmente não acreditava nisso. Já ouvira falar de muitas experiências com resultados inesperados e catastróficos; não queria ser mais uma vítima da ciência.

Finalmente o chefe, impaciente, deu-lhe um ultimato: ou vestia a roupa ou estava despedido. O pobre homem precisava do emprego. Em lágrimas, concordou.

Vestiu a roupa e, de fato, sumiu. Coisa que o pessoal da equipe celebrou com entusiasmo: a invisibilidade funcionava!

O Nobel de Física agora estava à espera deles, sem falar na grana que ganhariam. Terminadas as comemorações, o chefe voltou-se para o lugar onde, supostamente, estaria o servente invisível e pediu-lhe que tirasse a roupa. Não houve resposta. Invisível, o homenzinho tinha sumido.

E eles não conseguiam achá-lo. Aparentemente, ele tinha saído do laboratório, mas por qual motivo? Qual a razão dessa estranha atitude?

De repente, deram-se conta: uma pasta que estava em cima da mesa, com todos os documentos relacionados ao projeto, todas as fórmulas secretas, havia sumido. E não era difícil imaginar quem a tinha levado. O servente tinha, sim, se vingado.

Mais que isso, vendendo o projeto para grupos rivais, ficaria riquíssimo e, invisível, poderia sumir para sempre. Poderia comer de graça nos melhores restaurantes, viajar em navios de cruzeiro, dormir em excelentes hotéis.

A invisibilidade, sobretudo para os baixinhos humildes, é uma promessa de excitantes aventuras.

MOACYR SCLIAR escreve, às segundas-feiras, um texto de ficção baseado em notícias publicadas na Folha

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