quinta-feira, 28 de agosto de 2008



PISO É PISO

Adoramos frases circulares. A redundância faz parte da vida. Jogo é jogo, treino é treino. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Não é mesmo? Pois é, piso é piso.

Depois que a governadora do Rio Grande do Sul me enviou gentilmente uma carta afirmando que é a favor do piso de R$ 950,00 fixado por lei federal para o magistério público, mas não é favorável à transformação do piso em vencimento-base, eu fui me aprofundar no assunto.

Reunimos na UNITV (canal 15 da Net) a secretária estadual da Educação e a presidente do Cpers para um debate.

A conversa foi boa e, sem dúvida, esclarecedora. Podemos considerar consistentes os argumentos das duas partes. A educação precisa de mais recursos. O governo tem pouco dinheiro. Tudo isso faz parte da realidade.

O governo gaúcho aceita que todo mundo ganhe no mínimo R$ 950,00 por mês. Mas não aceita que esse seja o salário inicial sobre o qual se acrescentarão vantagens obtidas ao longo da carreira. Só que piso é piso.

A lei diz exatamente isso no seu artigo 2º: 'O piso salarial profissional é o valor abaixo do qual a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios não poderão fixar o vencimento inicial das carreiras do magistério público da educação básica, para a jornada de, no máximo, 40 (quarenta) horas semanais'.

Mais claro impossível. Piso, como sugere o bom uso da língua portuguesa, é o salário inicial. É possível que o Rio Grande do Sul não possa pagar.

É inaceitável que não queira fazê-lo alegando que a lei diz outra coisa ou que a lei aprovada traiu o que estava previsto no projeto. Lei é lei. Cada cidadão é obrigado a cumprir as leis em vigor. Será que o Estado tem privilégios para se colocar fora da lei?

O artigo 3º da lei dá uma colher para os estados ao permitir que, até 31 de dezembro de 2009, 'o piso salarial profissional nacional compreenda vantagens pecuniárias, pagas a qualquer título, nos casos em que a aplicação do disposto neste artigo resulte em valor inferior' ao fixado como inicial.

Em português comum, até 2010 os R$ 950,00 podem incluir as vantagens obtidas pelo tempo de serviço ou ser completados a partir do patamar salarial e do tempo de casa de cada professor.

Trocando em miúdos, por mais um ano e meio o piso não será piso. O governo gaúcho quer que ele nunca venha a ser piso. É seu direito discordar da lei e mobilizar as suas tropas para que outra lei seja aprovada.

Enquanto isso não acontecer, cabe-lhe cumprir. Por que os outros estados não estão em pé de guerra contra a lei 11.738/2008? Talvez o Rio Grande Sul tenha uma situação financeira mais precária do que outros ou um quadro de professores mais amplo.

Tudo é possível. A lei, porém, é clara. Piso é piso. Quem entra começa com o piso. Elementar! Ao longo da carreira, acrescenta vantagens sobre essa base. Vai quebrar o Estado? Não existe dinheiro em caixa para isso? Dificulta o saneamento das finanças?

O Estado tem outras prioridades? A discutir. O realismo deve ser considerado. A interpretação serena de um texto também. Por enquanto, o governo do Rio Grande do Sul está defendendo a prática da desobediência oficial: não gostamos da lei, não vamos cumpri-la.

Não deixa de ser cômodo e, ao mesmo tempo, ousado. À moda antiga, o governo deve escrever mil vezes no seu caderno escolar: piso é piso. Está na lei.

juremir@correiodopovo.com.br

Ainda que com previsão de chuvas e temporais, que tenhamos todos, uma excelente quinta-feira.

Nenhum comentário: