terça-feira, 26 de agosto de 2008



26 de agosto de 2008
N° 15707 - MOACYR SCLIAR


Poesia e camisinha

A Bienal do Livro de São Paulo, encerrada, como a Olimpíada, no último fim de semana, e da qual participei, foi quase uma olimpíada do livro; mais de 300 editoras montaram seus estandes no gigantesco centro de exposições do Anhembi.

Uma multidão lá comparecia diariamente, para comprar livros e para assistir aos incontáveis eventos paralelos, palestras, debates, shows. Sucesso, portanto, o que é muito animador, sobretudo quando se considera a realidade cultural do Brasil.

O recente estudo realizado com apoio da Unesco mostrou que cerca de 77 milhões de brasileiros, a maioria adultos, não lêem. O índice geral é de 4,7 livros por habitante/ano, mas, destes, 3,4 são textos didáticos. Na Europa, lê-se o dobro disso (no RS, chegamos a honrosos 5,8 livros por habitante/ano).

Por causa disso, e contribuindo para isso, temos o fato de que não há livrarias em 90% dos 5.564 municípios do país. A Bienal, portanto, preenche uma lacuna, ao propiciar um encontro entre leitores e o livro num ambiente informal, descontraído, alegre. A Bienal, como nossas feiras do livro, é uma festa.

Motivação para a leitura é algo que exige criatividade, e, neste sentido, dois grandes exemplos apareceram na Bienal. A Câmara Brasileira do Livro lançou um projeto original:

o Livro de Todos, obra coletiva que reuniu, via Internet, 175 jovens escritores em sua maioria estreantes, selecionados por uma comissão editorial da Imprensa Oficial de SP. A mim coube escrever o primeiro capítulo do livro, que fala do misterioso roubo do computador de um garoto, e que funcionou como desafio para os participantes.

O outro projeto é igualmente inovador e baseia-se num arrojado pressuposto: literatura chama a atenção quando aparece num lugar inusitado. Os cordéis do Nordeste, os poemas no ônibus, os blogs, são exemplos disto. E agora surge a “Camisinha Poética”. É isto mesmo: poesia numa embalagem de preservativo.

A idéia é do escritor de Itajaí, SC, João da Cruz Ramos (jc.ramos@terra.com.br), que com isto está, de acordo com suas palavras, “preservando a poesia”. O projeto tem o apoio da prefeitura de Itajaí e do Ministério da Saúde. Como escritor e médico de saúde pública só posso aplaudi-lo: reúne uma ação de saúde a uma ação cultural.

Poesia é arte, mas é saúde também; uma coisa completa a outra. Imaginem só esta cena: o cara lê para a parceira o poema que está na embalagem, com isto despertando a paixão dela;

rapidamente coloca a camisinha e, pronto, temos sexo ardente e seguro. É um sonho de saúde pública transformado em realidade.

Como vocês sabem a função desta coluna de terça é unicamente servir de elo de ligação entre as segundas e as quartas – nas quais escrevem, respectivamente Luis Fernando Verissimo e Martha Medeiros. Pois agora ambos acabam de lançar livros com suas crônicas.

O Mundo É Bárbaro, do Verissimo, Editora Objetiva, e Doidas e Santas, da Martha, pela lépida, intrépida e jamais decrépita L&PM. Não percam.

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