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domingo, 31 de agosto de 2008
Marianne Piemonte
Personagem da semana - F.P., 11 anos - O menino que roubava carros
Jovem demais até para ser levado para a antiga Febem, ele é o terror de um bairro da periferia de São Paulo
À SOLTA
Nas ruas do Jardim Ubirajara, zona sul de São Paulo, o menino de 11 anos mete medo nos vizinhos e não respeita a famíliaEsta criança tem 11 anos.
Há um ano e meio não vai à escola, foi expulsa duas vezes por provocar brigas. Nesse mesmo período, somou sete ocorrências registradas nas delegacias de polícia de São Paulo. Furto de três carros, assalto a uma farmácia e atentado ao pudor fazem parte de sua precoce folha corrida. No dia 5 de setembro, completará 12 anos.
Como presente, deverá ser levada para a Fundação Casa, a ex-Febem. Porque antes dos 12 anos completos, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, não pode ter sua liberdade tolhida.
Porém, o pré-adolescente de 1,40 metro, cabelo raspado e topete descolorido mete medo nos vizinhos do Jardim Ubirajara, onde mora, na extrema zona sul da cidade, e na família.
Na última semana, voltou para casa de carona em carros da polícia duas vezes. Seus feitos: o roubo de um Chevette e um Gol, com mais dois adolescentes. O menino foi pego dirigindo em alta velocidade. No entanto, ele está à solta.
O promotor de Justiça da Vara da Infância e Juventude Thales Oliveira disse na quarta-feira à tarde que o menino havia sido levado para um “abrigamento”, casas onde são colocados menores em situação de risco.
“Ali eles recebem apoio psicológico, mas podem sair e receber visitas”, afirma. Naquele momento, nem o promotor sabia que F.P. havia fugido do abrigamento à noite, ameaçando os funcionários com uma caneta Bic.
No fim da tarde da quarta-feira, no quintal de cimento da casa de reboco no Jardim Ubirajara, dois cachorros vira-latas dormiam ao lado de um carrinho de plástico, uma Ferrari vermelha, e de duas bonecas de plástico duro, sem braços nem cabelos. Elizabete Antônio, de 35 anos, a mãe de F., ainda não tinha voltado para casa.
A irmã mais velha do menino infrator tentava que o padrasto dela e pai de F., o aposentado Lourenço Pinheiro, de 62, não falasse mais com os repórteres. “Se ele (F.) estivesse aqui, vocês não iam ter coragem de ficar na frente da casa”, dizia a menina de 16 anos.
Pela janela, sem trincos nem vidros, era possível ver a cama ainda feita do menino que havia três dias não voltava para casa. O motivo de seus lençóis, o filme Carros, da Disney.
Rene Samus, de 33 anos, inquilino da edícula da casa da família, conta que o pai já colocou cadeado nas janelas e até bateu no menino para que ele não saísse de casa.
Mas nada o detinha. “Eu ouvia falar que ele estava metido com coisas ruins, mas para mim ele é o garoto que brinca com carrinho no quintal.”
‘‘Fiquei feliz com a prisão, assim ele ia se recuperar” FERNANDO ANTÔNIO, 65, avô de F.
A poucos metros da casa fica o bar de seu José Joaquim, de 68 anos, onde a clientela costuma parar para tomar um conhaque com menta depois do expediente. É lá que mora o pedreiro Fernando Antônio, de 65, avô de F., pai de Elizabete.
Atrás do quarto que aluga estão a Favela do Abacateiro e seus altos índices de violência. O negro franzino e entristecido torce para que o neto fique preso. “Outro dia sonhei com ele morto. Fiquei feliz com a prisão, assim ele ia se recuperar.”
Fernando deixou Santa Rita de Ibitipoca, Minas Gerais, em 1968. Veio para São Paulo casado e foi no Jardim Ubirajara que teve os três filhos.
A mulher o abandonou com as crianças ainda pequenas. A mais velha, Elizabete, mãe de F., tinha apenas 5 anos. Por isso, os filhos foram criados com a ajuda de parentes.
“Mas parente não é como mãe, né?”, diz. Fernando enche os olhos de lágrima para contar que a filha ainda sofre de bronquite, doença que ele julga ter sido causada pela friagem que ela pegava na casa onde morou. “Era muito úmida”, disse.
DESABAFO
“Elizabete está pagando o que me fez passar”, disse o avô de F. sobre a mãe do menino, que teve passagens pela polícia e pela Febem
Ele conta que criou os filhos com muito carinho, mas faz questão de dizer que foi severo e cobrou que eles trabalhassem e estudassem. Mesmo assim, a mãe de F. teve uma passagem pela Febem por furto, onde ficou por dois anos.
“Ela tirava coisas dos lugares em que começou a trabalhar como doméstica aos 12 anos”, disse. Na década de 80, também segundo o pai, Elizabete passou mais cinco anos na cadeia pelo mesmo motivo. Há cerca de um mês, ele conta, ela foi parar na cadeia novamente.
Mas desta vez a passagem teria sido causada por uns cheques e um carro encontrado pela polícia na casa dela. Os objetos teriam sido trazidos por F.
O avô desabafa: “Elizabete está pagando o que me fez passar”.
Para Fernando, ainda bem novo F. demonstrava ser ambicioso. “Tênis para ele é só acima de R$ 200. Só veste roupa de marca e adora ir à pizzaria comer e beber”, disse. Para ele, isso deveria ter sido um sinal para os pais.
“Ninguém na casa é assim.” O avô conta que o menino andou no tráfico por um tempo, mas não acredita que ele esteja metido com drogas.
Os vizinhos contam que o menino costumava tirar rachas com os carros que roubava e se exibia costurando pelas avenidas do bairro. Ninguém sabe dizer quem o ensinou a dirigir tão cedo.
O dono de um bar próximo diz que nunca viu o menino armado: “Mas nem precisa, o povo aqui morre de medo dele”. Como o Dadinho, personagem do filme Cidade de Deus, o menino impõe respeito (ou medo) pelo linguajar da periferia e pelo jeito de encarar quem lhe passa pela frente.
“Qual é, tio?”, costuma dizer, empinando o queixo, quando quer começar uma conversa, conta o avô. O dono do bar diz que já viu casos de meninos ali que depois que “deitam” – “matam”, na gíria – o primeiro não param mais.
“A molecada aqui é perdida. Vive na rua e sem o que fazer”, afirmou. Se isso acontecer com F., o avô diz temer que o menino se torne um criminoso perigoso. E com isso uma fatalidade, a morte precoce dele.
Se o receio do avô virar realidade, o Jardim Ubirajara poderá assistir longe do cinema ao Dadinho se transformar no Zé Pequeno, aquele que foi o maior bandido e traficante da favela carioca, que começou a roubar ainda menino.
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