sábado, 16 de agosto de 2008


Diego Mainardi

A gente nunca chega até as finais

Eu estou certo. Quem está errado é Pequim. Eu durmo cedo e acordo cedo. O que sobra para alguém como eu, nos Jogos Olímpicos, é a bateria preliminar dos 200 metros de nado de peito.

Eu assisto à bateria preliminar dos 200 metros de nado de peito. E, à tarde, antes de pegar no sono - eu durmo cedo e acordo cedo, mas também tiro uma pestana bem no comecinho da tarde - assisto às reprises das burlescas trapalhadas dos atletas brasileiros.

É uma farra. Como é que eles conseguem ser ruins desse jeito? Como é que eles podem perder tanto assim? Eu vaio a TV, assobio para a TV, jogo o travesseiro na TV. Depois viro para o lado e durmo feliz.

O aspecto mais gratificante de se torcer contra os brasileiros é que a gente sempre acaba ganhando. Cada medalha de bronze perdida pode ser comemorada como um triunfo.

Mas nossos atletas em Pequim merecem ser festejados por algo muito mais transcendental do que o mero sucesso esportivo. Com suas humilhantes derrotas, eles ajudam a ratificar todos os estereótipos mais grosseiros sobre o Brasil e os brasileiros. O povo dócil. A cultura conformista.

O caráter frágil. A personalidade titubiante. O espírito resignado. O pendor para ser eternamente café-com-leite. É reconfortante saber que o país nunca trairá nossas piores expectativas.

No passado, eu era mais generoso. Só torcia para atletas cujos países conseguiam superar rígidos critérios sociais e políticos. Antes de escolher um time, eu reunia o Conselho de Segurança da ONU em minha sala de estar e fazia-o debater por horas e horas, decidindo autarquicamente quem poderia contar com meu valioso apoio. Com o tempo, isso mudou.

Aceitei a idéia de que uma prova de canoagem era simplesmente uma prova de canoagem. A China oprimiu monges tibetanos? A Rússia bombardeou a Geórgia? Continue a remar. Isso mesmo. Só mais um minutinho. Falta pouco. Estou quase dormindo. Dormi.

Quando eu acordar, o Brasil terá perdido mais umas doze medalhas de bronze. O país é uma bateria preliminar dos 200 metros de nado de peito. A gente nunca chega até as finais.

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