quinta-feira, 21 de agosto de 2008



21 de agosto de 2008
N° 15702 - LETICIA WIERZCHOWSKI


Das pequenas alegrias

É verdade que, nesse mundo superlativo, minúcias agradam a poucos, e falar nisso até parece meio clichê. Ou alguém ainda fica genuinamente feliz com um simples dia de sol, com um telefonema daquele amigo querido e distante, ou estamos todos muito blasés.

Mas talvez não seja nada disso, e nem o mundo moderno, com seu eterno apelo consumista que nos promete uma felicidade comprada em cem prestações, tenha culpa alguma. Talvez apenas tenhamos crescido demais.

Porque criança ensina a gente a ser feliz. Criança é uma lição de moral para os adultos. Eu vejo meu filho de três meses abrindo aquele sorriso, me entregando aquela alegria em estado bruto, e me pergunto por que não somos assim, se já fomos.

Eu vejo meu filho de sete anos vibrando com as figurinhas do seu álbum e suspiro de delícia. Aliás, dia desses, meu filho veio me perguntar muito circunspecto: “Mamãe, é verdade que existe gente que não é feliz?”.

Fiquei com pena de trazê-lo à trouxa realidade dos adultos: não é que não somos felizes, é que a felicidade, como a queremos, é um conceito intangível. Sim, existe gente passando fome e sofrendo inomináveis violências – essa gente, meu filho, não é feliz.

Antes da felicidade é preciso ter saciadas as necessidades básicas do ser humano. Mas a maioria de nós tem isso tudo, e custa a viver, senão a compreender, os seus momentos de felicidade. A felicidade não é sempre, é enquanto. E disso sabem muito bem as crianças.

A mágica da infância é essa mesma: aceitar a felicidade como uma coisa passageira. Ela vem, ela vai, ela voltará. As pequenas felicidades que nos caem ao colo, ah, que gosto bom elas têm...

Eu, marmanja que sou, até hoje guardo em mim uma semente dessa felicidade infantil – as forminhas de areia perdidas. Toda manhã, no verão, saio cedinho de casa pra caminhar à beira-mar.

Na praia ainda deserta, que coisa boa me invade quando encontro, entre um passo e outro, escondida sob um montinho de areia ou num buraco lavado pelas ondas, uma daquelas forminhas de areia coloridas que os pequenos usam para brincar.

Pois bem, quando encontro uma dessas forminhas, não tenho idade. Sou aquela criança atemporal que vive dentro de mim.

E, se um dia, numa das minhas caminhadas matinais, eu não ficar assim alegre ao cruzar com uma forminha de areia sem dono, então me esqueçam, eu terei ficado um pouquinho mais triste do que sou hoje. E um pouquinho mais sem graça também.

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