quinta-feira, 7 de março de 2013



07 de março de 2013 | N° 17364
L. F. VERISSIMO

Elefante na sala

A única maneira de conviver com um elefante na sala é fingir que ele não está ali. Ignorá-lo. Se algum visitante desavisado perguntar o que um elefante está fazendo na sua sala, a resposta padrão deve ser “Que elefante?”. No Brasil, nos acostumamos a conviver com elefantes na sala.

Exemplo: só quase 30 anos depois do fim do período de exceção inaugurado em 1964 uma comissão começa a procurar a verdade sobre o que realmente aconteceu durante o período. Por quase 30 anos este elefante específico não mereceu atenção e viveu entre nós como um parente apenas vagamente incômodo.

A tal comissão não vai punir, antes tarde do que nunca, os desmandos da época. Os criminosos de então estão anistiados, mesmo identificados não sofrerão castigo ou sequer reprimendas da sua própria corporação. Mas pelo menos o elefante está sendo reconhecido. E citado.

Outros elefantes continuam ignorados, e continuam na sala. Hoje não há nenhuma dúvida de que o cigarro mata e o fumo é a principal causa do câncer no Brasil e no mundo. No caso do Brasil, só o volume de impostos que a indústria do fumo paga ao governo explica que não haja um combate mais aberto e decisivo ao vício assassino.

Em alguns casos, a indústria tem até vantagens fiscais. Já o volume de impostos não pagos pelas religiões organizadas explica a proliferação de igrejas e seitas no país e a presença de pastores evangélicos brasileiros nas listas dos mais ricos do mundo. Mas a isenção dada ao negócio da religião é um dos assuntos intocáveis do país, um elefante enorme cuja presença na sala nem a imprensa nem ninguém se anima a reconhecer.

Potência

Contam que o Stalin, avisado de que determinada decisão iria desagradar ao Vaticano, teria perguntado “E quantas divisões tem o papa?”. Descontando-se a Guarda Suíça, que só existe para fins decorativos, o papa, como se sabe, não tem tropas.

Mas o Stalin se espantaria com a demonstração de poder do Vaticano dada pela cobertura da renúncia do Papa e das especulações sobre o seu sucessor. Páginas e páginas de jornal, horas e horas de televisão – um triunfo de potência desarmada. A União Soviética tinha as divisões. Não tinha as relações públicas da Igreja.

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