05
de novembro de 2012 | N° 17244
J.
A. PINHEIRO MACHADO
Maquiavel em Porto
Alegre
A
Ordem dos Advogados, através da Dra. Helena Ibañez, que comanda o núcleo de
literatura da entidade, prepara, para o final deste mês, um evento excepcional
sobre a grande política. Estudiosos e convidados especiais vão debater a vida e
a obra do maior político de todos os tempos: Maquiavel – Niccolò di Bernardo
dei Machiavelli, historiador, diplomata, filósofo, escritor e político
memorável, nascido há 543 anos, que morreu de desgosto em 21 de junho de 1527.
No
poder, adorava uma boa intriga palaciana, murmurada numa mesa farta, com
toalhas de linho, talheres pesados, porcelanas assinadas, vinhos de boa data
servidos em copos de cristal. Demitido e exilado, cultivou em textos soberbos
uma ironia discreta em relação às agruras do seu tempo. Essa ironia, carregada
de desalento resignado em face da realidade, é confundida com cinismo:
“Grande
é a diferença entre a maneira em que se vive e aquela em que se deveria viver”
– constatou com simplicidade e realismo em O Príncipe, advertindo a seguir:
“Quem deixar de fazer o que é de costume, para fazer o que ‘deveria’ ser feito,
encaminha-se mais para a ruína do que para sua salvação”.
A
obstinação de Maquiavel não eram as mulheres, como Casanova, nem a boa mesa,
como Brillat Savarin, mas, sim, a política, na qual as ferramentas não deixam
de ser semelhantes: também aí é indispensável o uso competente das armas da
sedução e da conquista, além da capacidade de conciliar – ainda que seja o
sabor dos vinhos com o aroma dos pratos.
Maquiavel
sempre quis ser apenas um político e, de fato, teve intensa atividade no
governo florentino, dos 29 aos 43 anos de idade. A literatura foi uma
fatalidade. Derrubado pelas fofocas, construiu sua glória nos 15 anos de exílio
do poder.
Com
o ócio forçado pelas circunstâncias, teve os vagares necessários à sua obra.
Escreveu para não enlouquecer, até morrer, com apenas 58 anos. Numa dolorosa
ironia, é preciso reconhecer que, graças às perseguições dos Médicis – que o
levaram à solidão, ao exílio, ao último refúgio da escrita e à morte – temos
hoje O Príncipe, seu texto mais famoso, embora Discorsi sopra la Prima Deca di
Tito Livi seja a obra-prima.
Maquiavel,
na verdade, não tinha nada de amoral ou “maquiavélico”, no sentido perverso que
o termo ganhou. Era franco, sincero e inovador. Os huguenotes franceses, os
puritanos ingleses e os jesuítas, que tinham reduzido a atividade política a
intrigas palacianas sustentadas pela força das armas, foram apanhados de
surpresa pela força renovadora do pensamento de Maquiavel. A admiração
(temperada com inveja) que sua inteligência fulgurante despertou naquele tempo
deriva da coragem que teve ao escrever certas verdades muito desagradáveis:
“É
muito mais seguro sermos temidos do que amados. Os homens, com facilidade,
ofendem aqueles que amam. Mas preferem um silêncio cauteloso diante daqueles
que temem”.
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