sexta-feira, 24 de abril de 2015

Jaime Cimenti

Abril, as utopias, o choro

Poetas com suas antenas sensíveis têm razão: abril é o mais cruel dos meses, disse T.S. Eliot. Este abril terminando nos levou Eduardo Galeano, a voz doce, livre, solta, dos que não tem voz ou que não podem falar; e Günter Grass, a consciência crítica, a voz criativa e incômoda da Alemanha, que mesclou vida, arte, política e criatividade como ninguém.

Passam as comparações, algumas circunstâncias, episódios, normal. Ficam as histórias, o talento literário, os julgamentos do tempo e dos leitores, as utopias e as estrelas, É o que segue interessando mais. Faz tempo que é assim. Faz milênios que deitamos, dormimos as horas necessárias, sonhamos, acordamos e buscamos o novo nas manhãs.

Escrevo nesse vinte e um de abril. No Face, os amigos postam churrascos, risotos, saladas, corpos sarados, cachorros, gatos, galetos, sorrisos, doces, salgadinhos, cervejas, vinhos, café colonial, netos, sobrinhos, noivos, filhos, namoradas, pais, avós, irmãos, casas, piadas, viagens, soldadinhos de chumbo, crônicas, livros, poemas, utopias e distopias, notícias boas e ruins. Me alertam que leite condensado, chocolate e nutela são drogas que podem ser a porta de entrada para mais pesadas...

Sei, sei... Calma, devagar, menos... Bom, no Face, tem mais sorrisos que depressão, mais vida que morte, melhor. Facedependentes... Facemaníacos... No Face, juntos e solitários. Nem a frieza eletrônica do meio esfria a latinidade e contém as emoções e lágrimas. Graças a Deus. Beleza. Me adicionem. Estou carente. Só tenho 1565 amigos.

Nesse 21 de Tiradentes, herói enlouquecido de Liberdade, peço a Deus que essa luz dicróica pousando ilumine minhas poucas e precárias ideias e as ideias certamente em maior número e mais claras de meus compatriotas, para que a gente se dê conta de que somos todos atores neste espetáculo. O palco é de todos, o País é de todos. Sonho o País como uma grande orquestra. Pena que o Tom Jobim não está aí para ser o Maestro. Num momento difícil, precisamos conversar, nos entender, promover mudanças políticas, financeiras, fiscais etc.

Acho que, nesta hora complicadíssima para todos nós, seria interessante, mesmo virtualmente, dar um pulo na Sala das Lágrimas, ao lado da Capela Sistina, no Vaticano. Naquele pequeno espaço, sozinho, o Papa recém-eleito chora de emoção pela escolha, pela tensão e pelo peso da responsabilidade. Depois, escolhe uma entre as três vestimentas, feitas pela histórica alfaitaria Gammarelli. Depois das meias, usa um dos sete pares de sapato, algum adorno e aí reza, dá as bênçãos, vai adiante.

Lágrimas, uma das coisas mais humanas, se não a mais. Palavras de água e sal que nem se sabe bem quais são, mas que se precisa deixar rolar, mesmo no silêncio e na solidão, para não se tornar louco de pedra ou coisa assim. Choro pelos que choram e pelos que já não choram. Pelos que têm os olhos já tornados secos pelas moendas do tempo ou pelas dores que já levaram todas as lágrimas.

a propósito...

Em 1970, o Rei Pelé, pouco antes da histórica final da Copa do Mundo, que nos deu o Tri, em Guadalajara, revelou que teve uma forte crise de choro, no ônibus, indo para o estádio. Ele estava no ápice, conseguiu relaxar. Tocamos os quatro a um na Itália e levamos o caneco, numa das partidas mais bonitas de copas. Em entrevista na ZH de 19.04.2015, Paulo César Tinga, grande pessoa e jogador, agora aposentado, completamente sozinho no Japão, em 1999, disse que aprendeu muito com o choro.

Pois é, o choro é livre. Título, aliás, do lindo e primeiro LP do nosso genial flautista Plauto Cruz, que aparece na capa dele com uma grande, belíssima lágrima.


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