09
de abril de 2015 | N° 18127
IMOBILIDADE
OBRA NA ANITA
TRINCHEIRA DE
PROBLEMAS
INSPEÇÃO
REALIZADA PELO Tribunal de Contas do Estado aponta inconsistências em projeto
básico e aditivo de contrato acertado depois que rocha foi descoberta na
construção. Previsão inicial era de que obra ficasse pronta em dezembro de 2013
Projeto
básico feito às pressas para garantir financiamento, atrasos no trabalho e nas
desapropriações, aditivo possivelmente acima do permitido e uma construtora a
passos de tartaruga transformaram uma estrutura que devia estar pronta antes da
Copa do Mundo em um buraco a céu aberto que apenas causa prejuízos aos
porto-alegrenses. A trincheira da Rua Anita Garibaldi, uma passagem subterrânea
para eliminar o cruzamento com a Terceira Perimetral, teve a construção
iniciada – já com atraso – em janeiro de 2013, com previsão de conclusão em um
ano, mas ainda se arrasta.
A
população da região se posicionou contra a obra quando ela ainda estava no
papel. Moradores dos bairros Bela Vista e Mont’Serrat defendiam que a passagem
não permitiria aos condutores virar à esquerda na Carlos Gomes, exigindo um
grande contorno por ruas hoje arborizadas e pouco movimentadas. Durante
encontros com representantes da prefeitura, clamaram por conhecer projeto da
obra, mas nunca tiveram acesso – o que puderam ver era uma projeção 3D de como
ficaria quando pronto. O faro dos moradores, seria possível dizer agora, foi
certeiro: justamente na elaboração do projeto estaria o principal motivo para
os atrasos que ainda se arrastam.
Zero
Hora consultou, via Lei de Acesso à Informação, uma Inspeção Especial realizada
durante todo o andamento da obra pelo Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul
(TCE/RS). O processo ainda não foi julgado, mas apontamentos dos auditores
indicam possíveis inconsistências no andamento da obra.
O
projeto básico seria o principal causador do atraso. Evidências que constam nos
documentos do órgão mostram que o trabalho entregue por meio de um convênio
entre a prefeitura e o Centro das Indústrias do Rio Grande do Sul (Ciergs) era
falho. As únicas duas sondagens realizadas no local não encontraram uma rocha
sob a Avenida Carlos Gomes (veja o infográfico ao lado), o que resultou em um
aditivo no contrato de cerca de R$ 4 milhões.
Essa
elevação no custo poderá ser considerada ilegal de acordo com a Lei de
Licitações (8.666/93), pois ultrapassa o limite de 25% de aumento sobre o valor
inicial de R$ 10,7 milhões – altas acima de 25% só são aceitas sob algumas
justificativas, como um fato imprevisível, por exemplo.
Além
disso, Martin Alfredo Beier, engenheiro responsável pela Deltacon Engenharia,
que assina o projeto básico, teria participado posteriormente da realização do
projeto executivo contratado pela Sultepa, construtora vencedora da
concorrência, algo vetado no próprio termo de cooperação assinado entre
prefeitura e Ciergs e na Lei de Licitações. A autoria do projeto executivo
seria da Triunfo Engenheiros Associados – quem assina a Anotação de Responsabilidade
Técnica (ART) do projeto executivo é o filho de Martin, Marcos Beier.
CREA
FALA EM FALHA NA INVESTIGAÇÃO DO SOLO
No
entanto, era Martin quem fazia o acompanhamento dos projetos, de acordo com
relatório da equipe de fiscalização do TCE, que esteve com ele em reunião em
setembro de 2013.
Trecho
do texto apresentado pelos auditores diz que “certamente, em uma investigação
adequada do subsolo, o mínimo necessário seria que tivessem sido realizados
mais furos de sondagem, principalmente na cota mais elevada do terreno, que
coincide com o eixo da pista da Av. Carlos Gomes e com o ponto de maior
profundidade de escavação da trincheira”.
–
Tecnicamente, houve falha na localização dos furos. Foram poucos e mal
utilizados. Era obrigatório um furo no centro da escavação. Resumindo, não
tinha como não saber (que não havia a rocha) – afirma Melvis Barrios Junior,
presidente do Conselho Regional de Engenharia do RS (Crea).
De
acordo com o professor Rualdo Menegat, professor do Instituto de Geociências da
UFRGS e autor do Atlas Ambiental de Porto Alegre, por estar localizado no topo
da Crista da Matriz, a probabilidade de haver rochas no subsolo daquele local é
de pelo menos 90%:
– A
presença de matacões (grandes peças de granito) naquela região é tão comum que
não escapa de nenhum estudante da área.
O
coordenador técnico das obras de mobilidade da Secretaria Municipal de Gestão,
Rogério Baú, considera que, para um projeto básico, as duas perfurações eram
suficientes.
–
Foi utilizado o mesmo conceito do projeto da Cristóvão Colombo, onde não houve
problemas. É um projetista experimentado. Todos os projetos foram doados com
toda a responsabilidade técnica – explica Baú.
Com
as obras praticamente paradas desde o final de 2014, a prefeitura rescindiu na última
terça-feira o contrato com a Sultepa, construtora vencedora da licitação, e
negocia com a 2ª e 3ª colocadas na licitação. Procurado insistentemente pela
reportagem, Martin Alfredo Beier não quis dar informações sobre os projetos.
Paulo de Tarso Dutra, um dos gestores da Mecta Engenharia, que entregou os
projetos para a prefeitura pelo convênio com o Ciergs, relatou estar sofrendo
problemas de saúde e preferiu não responder aos questionamentos.
bruno.felin@zerohora.com.br
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