23
de abril de 2015 | N° 18141
CARLOS
GERBASE
DAWKINS E DEUS
No
final de maio, vem palestrar em nossa cidade um dos ateus mais famosos do
mundo, o biólogo Richard Dawkins. Ele é autor de livros de divulgação
científica de muito sucesso – e também muito polêmicos – como O Gene Egoísta,
em que defende a ideia, às vezes muito mal interpretada, de que nossos corpos
são máquinas a serviço da reprodução do DNA, e Deus, um delírio, um apanhado
dos prejuízos que as religiões já causaram ao mundo.
Já
li bastante Dawkins e asseguro que suas obras mais interessantes não são essas
duas. Recomendo fortemente A Grande História da Evolução e A Escalada do Monte
Improvável.
O
primeiro, em vez de começar do começo e ir até o fim, ou seja, da geleia que
deu origem à vida ao ser humano, vai do fim ao começo (do homem à geleia). E
isso faz muita diferença. O segundo é uma coleção de ensaios que cruzam
aspectos biológicos, estatísticos e filosóficos da evolução. Dawkins é um
sujeito culto, com ideias originais e escreve bem. O que mais se pode pedir de
um autor literário? Nada. O problema é que Dawkins também é um cientista, e o
mundo exige que ele defenda suas ideias com objetividade e rigor.
O
mais interessante na polêmica criada por O Gene Egoísta é a questão da
metáfora. Um gene não pode ser exatamente “egoísta”. Mesmo que admitamos que
ele codifica determinadas emoções, um gene não tem sentimentos. Por conta
disso, o livro foi atacado, tanto por cientistas quanto por filósofos da
ciência. E, por mais que Dawkins insista que se trata de um jogo de palavras
com finalidade didática, seus leitores continuam interpretando o egoísmo ao pé
da letra.
O
problema de Dawkins é a falta de imaginação dos seus leitores, que talvez
tenham lido Deus, um Delírio e se convencido de que todo pensamento que se
afasta um pouco da razão, que tem algum viés mitológico ou fantasioso, é um
pensamento de menor qualidade, ou até nocivo ao pensador.
O
problema de Dawkins é que ele, ao declarar inútil a ideia de Deus, está também
atacando a capacidade de interpretar uma metáfora, que pede imaginação e
pensamento menos racional. Enfim, o problema de Dawkins é que ele, como um
Deus, criou a ideia metafórica de um “gene egoísta”, e seus fiéis não podem
acreditar em Deus.
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