sábado, 11 de abril de 2015


12 de abril de 2015 | N° 18130
MOISÉS MENDES

Sobrou o Eduardo Cunha

Esgotou-se a capacidade de renovação da política, apenas uma geração e meia depois do fim da ditadura. Se ainda estivesse por aí, Décio Freitas nos ajudaria a vislumbrar o que esse vácuo significa.

O que substitui o esfacelamento da esquerda construída em torno do PT? Quem irá aglutinar o conservadorismo (agora explicitado), representado precariamente pelo PSDB, em torno de um projeto partidário? Ou o PT nunca representou as esquerdas, e o PSDB é um partido de centro, com vocação progressista, apenas transformado, na emergência, em esponja das demandas do antipetismo?

Décio nos ajudaria mais do que os cientistas políticos e suas observações invariavelmente preguiçosas sobre os protestos de rua e os panelaços, desde as passeatas do inverno de 2013.

Só o que dizem é que a classe média está inquieta. Que pede mudanças, que ninguém suporta mais a corrupção. O antipetismo (e não o tucanismo) leva às ruas. Boa parte dos manifestantes é inspirada em questões morais genéricas (antipolítica, antigoverno, anti-Congresso). Cansaram-se “dessa política” e afastaram os partidos das mobilizações. Mas a democracia não é questionada, apesar da presença de golpistas e da descrença nas instituições em geral. É o que dizem os cientistas.

Esgotou-se a sensação de representação. Perdeu-se em algum lugar a percepção da política formal como expressão de vontades coletivas. Exauriu-se o discurso da geração que a muito custo restaurou a democracia e se vê desafiada a qualificá-la.

É nesses momentos que sinto falta do Décio. Ele produzia ruídos diferentes dos usuais. Gostaria de saber dele que vigor é esse que sustenta os pregadores da “intervenção militar”, saídos ilesos da Comissão da Verdade porque não temem nada, nem a revisão da Lei da Anistia.

Queria que Décio falasse da ressaca dos frustrados com a ilusão de que haviam construído um partido social-democrata. O que teremos depois da fragilização dos partidos, da fadiga dos líderes que vieram até aqui e da perda de noção do que nos aguarda na esquina?

O Brasil já não produz referências com o lustro da resistência moral e intelectual dos presos políticos e asilados, ou saídos do sindicalismo ou da liderança estudantil (José Serra chegou aos 73 anos!). O último líder de estudantes é Lindbergh Farias, senador pelo PT do Rio, sob investigação do Supremo por suspeita de envolvimento na Lava-Jato. Lindbergh tem 45 anos. E quem o conhece fora do Rio?

Homens e mulheres maduros e adolescentes ainda podem escorar seus sonhos na longa sobrevida dos anciões da arte, dos Rolling Stones a Robert Plant, do vintage e do retrô. Mas a política não nos oferece esse benefício. Não há política sem renovação.

No Chile, nas eleições de 2013, as esquerdas elegeram uma dúzia de líderes estudantis. A esquerda se renova na Grécia e na Espanha pela força da transgressão e da juventude. No Brasil, os jovens das ruas de junho de 2013 sumiram na despersonalização das redes sociais. Nenhum dos que faziam convocações para que fossem às ruas se elegeu.


Um certo jornalismo tentou inventar líderes das ruas (à direita), mas fracassou. A perspectiva imediata ao alcance dos desencantados inclui as tentações da despolitização, do retrocesso e de Eduardo Cunha. Décio poderia nos ajudar a pelo menos rir disso tudo.

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