05
de abril de 2015 | N° 18123
MARTHA
MEDEIROS
A vida, uma experiência
A
ideia é não acionar o piloto automático, mas assumir o manche
De
uns tempos para cá, as agências de viagens mais antenadas deixaram de oferecer
pacotes turísticos incluindo apenas estada, passagens e visitas guiadas às
principais atrações. O turista exigente deseja mais do que um lugar para dormir
e uma selfie junto à Torre Eiffel.
Ele
não quer apenas viajar, ele quer viver uma experiência, e isso inclui passeios
de balão, acampamentos no deserto, uma ceia ao luar sobre a areia da praia,
mergulho nas águas secretas de uma caverna, uma excursão de bicicleta em meio a
ruínas ancestrais, uma aula de surfe num paraíso indonésio, escalar um vulcão
ativo, participar de uma cavalgada, fazer meditação no topo de uma montanha. Não
apenas ver o Big Ben, a Torre de Pisa, a Estátua da Liberdade, click, click,
click e voltar pra casa.
Às
vezes fico pensando se não deveríamos viver o dia a dia com esse mesmo espírito
de aventura. A rotina impõe suas limitações, é vero, mas não custa expandir a
mente e tentar – ao menos tentar, dentro das nossas possibilidades – fazer
diferente.
Qual
a graça de sair apenas com quem é igual a você? Que sempre frequentou os mesmos
locais, conhece as mesmas pessoas e não irá lhe contar nada palpitante, nada
que faça você morrer de rir, ou ficar admirado, ou pensar com seus botões: como
é que não imaginei isso antes? A experiência de conviver com alguém que habite
outro universo pode ser excitante e prazerosa, pois abre novos portais (porém,
se o projeto for casar na igreja e gerar meia dúzia de filhos, é mais seguro
apostar na alma gêmea para ter menos sobressaltos, combinado).
Caso
você já esteja bem casado e com a vida ganha, ainda assim, por que não se
desacomodar um pouquinho? Em vez de cumprir tarefas, viver experiências.
Não
tem passeio de balão em Porto Alegre? Podemos cruzar o Guaíba de catamarã. Não
temos deserto onde acampar? Podemos fazer um piquenique com os amigos num
parque. E assim sucessivamente, usando a criatividade, buscando alternativas.
Quando
falei lá no primeiro parágrafo em ceia ao luar sobre a areia da praia, é bem
verdade que em meus delírios imaginava uma praia de mar cristalino cercado por
falésias, com um clima romântico e música suave, mas nada impede de você levar
sua churrasqueira portátil e o isopor para a beira da praia do Cassino, com o
porta-malas do carro aberto para curtir seu pagodão. Também é uma experiência,
vou eu negar?
A
ideia é não ficar na plateia, mas entrar em cena. Não repetir os dias, mas torná-los
únicos. Não acionar o piloto automático, mas assumir o manche.
Não
toda hora, nem todos os dias, pois banalizaria as extravagâncias e, além disso,
a vida real costuma nos chamar de volta para dentro do escritório, mas, de vez
em quando, que sejam bem-vindos os sobressaltos, para lembrar que o coração não
parou.
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